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Dossiê Ivan Cardoso

Entrevista: Ivan Cardoso

Por Matheus Trunk

Esse é o resultado de uma tentativa de entrevista, que uma propriamente dita. Durante a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, fui a uma sessão. E pra minha grande surpresa, era uma sessão com “Sarcófago Macabro”, o mais recente trabalho do Ivan e a sessão ainda contava com a presença dele. Terminando o filme, falei rapidamente com ele. Me disse seu fã e que queria realizar uma entrevista com ele para a Zingu!.

Ele topou na hora. Marquei com Ivan no hotel dele na noite seguinte para começarmos a “entrevista”. Gravamos esse rápido registro no dia seguinte, que você poderá ler a seguir.

Não fiz todas as perguntas que queria ao cineasta, devido ao pouco tempo e por ele morar no Rio. Por isso, nessa edição você poderá ver a primeira parte da entrevista original que realizei com ele e somente numa de nossas próximas a segunda parte estará disponível.

Entrevistar Ivan Cardoso é muito fácil. Talvez nos meios de cinema, ele seja a pessoa mais fácil junto com Carlão Reichenbach. De personalidade forte, honesto e extremamente sincero, Ivan não tem problemas de dar opiniões polêmicas sobre o cinema, política e mesmo sobre a vida. Difícil, foi destacar aqui os melhores momentos, porque quase todos são memoráveis.

Mesmo assim dá pra se divertir um bocado com as histórias de Ivan, uma pessoa extremamente engraçada e divertida. Esse é nosso presente de natal de toda as pessoas que colaboram com a Zingu!. Uma conversa honesta, sincera e direta com um dos maiores nomes do cinema tupiniquim.

Numa das nossas próximas edições, você poderá ver a segunda parte da nossa entrevista com esse gigante do cinema nacional e aprender ainda mais com ele.

Z- Eu soube que o senhor decidiu fazer cinema depois que viu “O Bandido da Luz Vermelha”. Fala um pouco sobre como foi pro senhor conhecer o Sganzerla, que pelo que sei foi na praia...
IC- Senhor é foda (risos)...Matheus não precisa me chamar de senhor, mas em todo caso vamos lá. É difícil eu explicar pra você...Quantos anos você tem ?
Z- 18
IC- 18 ! Que beleza ! Vamos trocar ? (risos). Pois é, eu era moço como você, mais moço. Isso em 1968, 69 acho que era maio de 69 quando eu conheci o Sganzerla. Porque na entrevista ele fala dos filmes que seriam feitos em 1970. Mas devia ser, talvez início de 69 então, eu devia ter dezesseis anos. Eu nascí em primeiro de outubro de 1952. E era uma época muito politizada. Eu tenho essa forte relação com a política, por causa do meu avô que foi o último prefeito do Rio do Getúlio. Embora eu fosse carioca, quando criança eu tinha o clube do Adhemar (refere-se ao político paulista Adhemar de Barros que embora apoiasse Getúlio Vargas foi identificado como de direita, sendo apoiador do golpe de 64. É identificado como inventor do “rouba, mas faz”). Eu era adhemarista. E até hoje acalento o sonho distante de fazer um documentário sobre o Adhemar. Que é o grande protótipo de todos os políticos brasileiros: roubam, mas fazem. E depois na revolução de 64, a minha mãe era lacerdista e eu ganhei livro do Carlos Lacerda autografado. Eu colecionava placas de plástico dele, que seria candidato a presidente em 65. É gozado por causa disso, cada tempo e cada época tem as suas nuances. Já em 68, 69 eu era também esquerdofrênico embora eu não estivesse na faculdade e não participasse de movimento estudantil. Mas eu ia em passeatas, ver o Vladimir Palmeira...Falar na Cinelândia, numa época que o Zé Dirceu era apenas um mero coadjuvante. A estrela era mesmo o Vladimir. E a gente por causa do Godard, queria ser do PC do B, queria ser da linha chinesa. Isso tudo por causa do filme “A Chinesa” do Godard (risos). Então, fazia toda essas babaquices que estudante esquizofrênico faz. Eu não, porque você faz: entrevistar cineasta, fazer jornal (risos). Era gozado, porque eu tinha mais ligação com artes plásticas e queria ser artista plástico. Tendo mais ligação com artes plásticas e com poesia, do que propriamente com cinema. Eu fiquei célebre no meu colégio e era líder na minha classe. Isso aconteceu porque houve a atividade proposta de um julgamento do Kennedy e eu não sei explicar porque eu levantei o dedo, e fui o promotor. O Kennedy era uma pessoa que eu deveria ter sido simpático. Todo mundo era simpático a ele, que morreu jovem assassinado. Mas eu tinha um amigo do meu pai, que era americanófilo que era republicano. Na verdade, americano tem que ser republicano, americano democrata é americanofrênico (risos). Mas deixo claro nessa entrevista que para mim o Bill Clinton é bem melhor que o George Bush. Além do episódio da Baía dos Porcos em Cuba, que quase jogou o mundo numa Terceira Guerra Mundial. O Kennedy era muito vulnerável na política externa dele: agricultura, comércio. Então, esse americanófilo amigo do meu pai por concidência era também egiptólogo e também era o dono do castelo onde eu filmei muitos dos meus filmes. Nesse castelo, filmei “O Nosferatu do Brasil”, “Sentença de Deus e mais tarde até “As Sete Vampiras”.
Z- Qual o nome dele ?
IC- Ivan Barcellos. Era um comandante, um sujeito bastante avançado pra sua época. Porque ele era um xará meu, aviador, mas não pode continuar sendo aviador porque tinha problema no ouvido. Ele era um milionário mas ele foi a falência, porque já nos anos 50 ele investiu a fortuna dele em ração de cachorros, que hoje é um grande segmento da economia. Mas na época não devia ser, cachorro devia comer comida que sobrava. E ele era dono de uma fábrica de sabão em pó. Mas o problema é que esse sabão em pó dele não fazia espuma. Então, não podia dar certo também (risos). Então, esse cara me preparou e no julgamento eu fui condenar o Kennedy porque o advogado era um bobalhão. Aí o diretor do colégio teve de interromper o julgamento porque senão o Kennedy teria sido condenado. A partir daí, eu passei a ter grande prestígio com todos os alunos. E sempre eu fui filho único muito tempo, 13 anos. E filho único é obrigado a criar um universo próprio, tal. Então, eu era muito tímido e era voltado pra literatura, arte, essa coisa toda...E até pra política. Então, a gente fez uma decoração diferente pra minha sala, ia nas editoras e botava capas de livro nas paredes, cartazes de cinema. Ia nas produtoras de cinema brasileiro e botava cartaz, ia em teatros. Entendeu ? A gente fazia uma coisa mais avant-garde que o movimento estudantil puro e simplesmente. Tinha o jornal chamado “Estudo” e por coincidência, a parte de cineclube eu não mexia. Porque era aquela coisa: passava “Os Companheiros”, esses filmes que tinha todo esse lance de se usar a cultura para conscientizar os estudantes, quem pudesse ser conscientizado sobre os malefícios da Ditadura, sobre a luta contra a Ditadura. Existia até a luta armada no Brasil, e a repressão era muito forte mesmo. Aí a gente tinha esse grupo e o meu principal parceiro era o Ricardo Barreto que era da Blitz, parceiro do Evandro Mesquita. E também por obrigação que a gente tinha de fazer ginástica, já que nossos pais nos obrigavam a fazer ginástica. A gente fazia ginástica numa academia de homens que era muita famosa no Rio, que tinha um cara que tinha sido Mister Mundo, tirado segundo lugar. Era um francês chamado Jean Pierre e ele era professor de ioga, na verdade. E a gente tinha começado a fumar maconha e queria se interessar sobre a possibilidade do espírito deixar o corpo e no ioga você através de exercícios você consegue isso. Embora com a maconha seja mais fácil (risos). Então, na ioga eu fiquei muita amigo do cara que foi se tornar o porta voz do ex- presidente Fernando Henrique, o Jorge Lamousier. Que era estudante do colégio Santo Inácio, o meu era o colégio São Fernando: você entrava burro, saia malandro (risos). Era um colégio pra frente, onde estudava os filhos da Pink Wayner, do Samuel Wayner. O Samuca, os filhos do Vinícius de Moraes (a Juliana, Luciana), o Carlos Imperial estudou nesse colégio. O Paulinho Nyemeyer, esse grande cirurgião de cérebro.
Z- Era onde no Rio esse colégio ?
IC- Em Botafogo. E também os próprios artistas eram empenhados nisso. Então, eu tinha conhecido num programa chamado “Artes Nas Praças”, que vendia cinegrafia. Tinha uma tiragem de obras e eu com o meu dinheiro de mesada comprei diversas do Carlos Vergara. E me tornei amigo dele e o convidei pra dar uma palestra no colégio. A diretora gostou muito do trabalho dele, e aprovou a conferência. E todo mundo ficou deslumbrado, e eles falaram pra nós que eu deveria procurar o Hélio Oiticica, que era o criador da Tropicália, era um artista genial. E nós fomos: o Hélio era neto de um líder anarquista, José Oiticica. A diretora do meu colégio, uma tal de Lúcia Magalhães, também era ligada e era filha de um cara que ocupou diversos cargos no ministério da Educação no governo do Getúlio. Eu até fui estudar nesse colégio, porque meu avô foi o último prefeito do Vargas no Rio, e eu até estudava de graça no colégio, já que ela era amiga do meu avô. Então, ela deve ter visto pelo sobrenome Oiticica que o cara era parente do líder anarquista. Nessa época, todas as pessoas que tinham poder, responsabilidade e algum cargo eram de certa maneira, eram contra a Ditadura e incentivavam o tipo de movimento que a gente queria fazer ou eram agentes da Ditadura, e acabaram se tornando censores também. E o Oiticica pra frente, que no meio da entrevista, da conferência ele falou uma coisa muito pra frente. Porque na época não tinha grafite. Ele falou que se a gente visse o retrato de um militar numa capa de revista, na rua ou em qualquer lugar, você deveria pintar de preto a cara do milico e que aquilo era obra de arte. A diretora encerrou a conferência (risos) e aquilo me jogou no colo do Oiticica. Não no sentido sexual, mas no sentido que pô ! Tudo que era proibido naquela época tinha muito valor. Então, nós passamos a freqüentar a casa do Oiticica. E também, tinha o problema da maconha, porque até deixar o cabelo crescer naquela época tinha problema e a gente tinha começado a fumar maconha e não tinha lugar. Em casa, não podia. Mas na casa do Oiticica, podia. Então, a gente entrava com a maconha e ele com a casa (risos). Era uma troca genial e o primeiro conselho que ele me deu e que eu acho genial foi: “Ivan, tudo que te disserem que não pode ser feito, pode”. Isso era o que todo garoto da sua idade queria saber. Então, o Oiticica virou o pai pra frente nosso. E ele tratava eu, Barreto e outro colega nosso Sidney Garcia, que também fazia essas coisas como “the kids”. A gente não tinha banda de rock, mas tinha nome disso (risos). E deu muito papo pra gente, foi talvez o dia mais importante da minha vida (emocionado) porque nessa mesma tarde que eu conheci o Oiticica, eu conheci o Torquato Neto, que mais tarde iria trabalhar comigo. Poeta e parceiro do Caetano, das melhores canções do baiano e fez parte da Tropicália, compondo clássicos como: “Geléia Geral”, “Mamãe Coragem”, “Tropicália 2”, “Domingo”, “Copacabana Me Engana”...É do filme do Fontoura ? Não vou dizer que sejam as melhores. As músicas do Capinan também eram ótimas: “Soy Louco Por Ti América”...Que saia o nome do Torquato por engano como parceiro, mas essa música é só do Capinan. E o próprio Caetano e o Gilberto Gil eram grandes letristas. A Tropicália foi uma grande ruptura...Acho que depois da Semana de 22 e do movimento concretista a coisa mais importante que aconteceu aqui foi a Tropicália, principalmente pros jovens por causa da música pop. Porque uma das coisas, que a gente mais gostava era rock. O pai desse Barreto, era sócio de uma loja chamada “O Rei da Voz”, de discos e o pai dele comprava todos os gêneros de música: desde música clássica até ópera e pop. E tinha lá os últimos discos dos Beatles, dos Rolling Stones, do Mamas and The Pappas, Bob Dylan. E isso também era moeda de troca pra gente, tudo que era americano é brasileiro. E disco americano principalmente, então a gente levava o disco pro Oiticica ver...A gente levava o pessoal na casa do Barreto pra ver o LP. Foi o Barreto que apresentamos ao Macalé e surgiu o conjunto “A Bolha”, de onde veio o Arnaldo Brandão, o Pedro Mendonça Lima...Porque os baianos sabiam tocar violão, mas não sabiam tocar guitarra. Os Mutantes foi o clímax disso, mas nessa época eu também ficava acompanhando show de Gal Costa, Macalé...Porque nessa época o Caetano e o Gil já tinham sido presos. E o cinema brasileiro a gente via no Museu de Arte Moderna, mas eram aqueles ciclos esquerdofrênicos: “Ivã, O Terrível”, cinema polonês...Eisenstein, não sei o que...Eu gostava do Eisenstein também, mas tem hora que enche o saco. E Cinema Novo, filmes do Glauber que faziam a cabeça da gente: “Deus e o Diabo”, “Terra Em Transe”, “Barravento”...E os dois primeiros filmes do Nelson que são chanchadas neo-realistas: “Rio 40 Graus” e “Rio Zona Norte”. E o próprio “Boca de Ouro”, que introduz Nelson Rodrigues...Leon Hirzman com “A Falescida”...O “Vidas Secas” já é esquerdofrênico pra mim. E os filmes do Saraceni, acho muito chato. Acho ele o pior cineasta brasileiro (risos).
Z- E o Cacá Diegues ?
IC- Cacá Diegues nem se fala (risos). Nessa época cinema brasileiro já dava suas porradas, de público com o Cinema Novo. Ele fazia muito sucesso não na Europa, mas nos festivais da Europa e os filmes daqui como “Macunaíma”. Antes desse, um filme que fez muito sucesso foi um filme do Fontoura “Copacabana Me Engana” que foi o filme que lançou o Carlo Mossy, inclusive. Fez um grande sucesso e depois veio um filme que era tudo que a gente queria ver, que era “O Bandido da Luz Vermelha”. Um filme que misturava Godard com Orson Welles num faroeste de Terceiro Mundo que tinha até Jimi Hendrix cantando “Hey Joe” no final. Então, “O Bandido” foi o filme que fez, por ter linguagem radiofônica, poesia concreta, era tropicalista, contemporâneo...Tudo que a minha geração queria ver estava no “Bandido”...Inclusive o próprio “Bandido. Embora o original fosse um cara que merecia a cadeira elétrica, o Brasil sempre foi um país antropofágico e o barato da cultura brasileira é essa coisa da importação: o carnaval, a macumba. Então “O Bandido” foi o filme que fez a cabeça da gente. Em seguida, o Sganzerla faz “A Mulher de Todos”, que é outro que faz até mais sucesso de bilheteria. Eu não sei te dizer se foi um milhão ou dois milhões de espectadores, mas foi um grande estouro.
Z- Já dialogando com a pornochanchada...
IC- E era um filme que o Rogério dizia que fazia “filmecos”. E era totalmente godardiano, e era melhor que o Godard. O Rogério na verdade, antecipa até o Tarantino. É um cineasta pop, e não era um cineasta autoral, um cineasta de autor. Era um realizador de gênero de filme de bandido, de filme de praia, que falava muito de chanchada. Ele tinha uma grande admiração enorme pelo Zé do Caixão e detonou o Cinema Novo, detonou o “Macunaíma”. Ele falava que era impossível fazer um filme sobre antropofagia a partir de Mário de Andrade e sim de Oswald de Andrade, quer dizer um cara antenado com uma porção de coisas...E também “O Dragão da Maldade”, embora eu ache que recentemente eu fiz “Meia-Noite Com Glauber” e é lógico que o filme do “Dragão” é uma diluição do “Deus e Diabo Na Terra do Sol”. Mas também não era pro Sganzerla não ter dinamitado tanto o Glauber, embora o filho tenha sempre que matar o pai. E o Sganzerla é a ruptura dele.
Z- Mas eles foram amigos por um tempo ?
IC- Eu acho que essa coisa não me interessa, a relação do Sganzerla com ele. O Glauber não fazia mais a nossa cabeça, ele era uma espécie de Lula cercado por quarenta ladrões (risos), cineastas medíocres que se julgavam geniais. Inclusive pra conhecer o Sganzerla, eu proponho uma entrevista que nunca foi editada no jornal do meu colégio, embora o jornal tenha sido um veículo de vanguarda pra jornal de colégio. O Torquato escreveu um texto especial pra esse jornal chamado “Toquartália”. O próprio Hélio, Vergara. O Ferreira Gullar eu entrevistei, o próprio Nelson Rodrigues. Só completando: esse dia que eu conheci o Hélio, eu conheci o Torquato, o Rogério Duarte que era um mentor do Tropicalismo e tinha feito os cartazes do Cinema Novo, as capas de disco, fumava maconha sem parar, era totalmente doido (risos). Tinha sido preso o irmão dele com problemas com a Ditadura, e isso valia muito na época. E o próprio Caetano Veloso passou lá no final da tarde, então, a gente desceu de lá...No maior gamação...E a partir do momento que a gente se tornou amigo do Hélio e quando eu falei com o Sganzerla: “Sou amigo do Oiticica”, pronto. O Hélio te dava o passe livre pra você falar com esses outros artistas e por curiosidade, também o meu melhor amigo de juventude o cara que me apresentou o Kafka, foi esse grande antropólogo, sucessor de Levi-Strauss: Eduardo Viveiros de Castro. Seguinte o próprio Levi-Strauss, saiu uma matéria na “Folha” sobre isso e o Viveiros me chamou a atenção mais tarde, ele já era intelectual: lia até no café da manhã. No almoço, então...o tempo todo. Ele usava o cinema como válvula de escape. Como os meus filmes eram muito eróticos, muita mulher nua, muita sacanagem ele se distraia e fotografava vários filmes meus. Eu inclusive, ensinei ele a fotografar...E ele como sempre foi estudioso, se tornou um ótimo fotógrafo. Viveiros me chamou a atenção que eu deveria fazer um filme de múmia, porque eu já tinha feito “Nosferato”, “Sentença de Deus” em super-8.
Z- O “Sentença de Deus” é baseado no Mojica ?
IC- Não, esse título é apenas uma homenagem. Esse rapaz, era colega de colégio meu e fazia parte desse movimento que a gente fazia. Aí eu fiz o clássico, porque nele não tinha matemática. Mas eu acho que botaram matemática no clássico, alguma porra lá e mudou o currículo e eu fui pra segunda época de matemática...Acabei saindo desse colégio, que na verdade tinha esse problema. Mas era um colégio bom e eu fui prum colégio que era uma boate total (risos), você nem precisava ir a aula. Todo mundo colava, nego só faltava dar porrada no professor (risos). Então, eu me desinteressei dos estudos, na época tinha Woodstock, ácido, sexo, drogas e rock and roll.. Eu faço vestibular, mas sou aprovado pro segundo semestre...
Z- Do que ?
IC- Psicologia (gargalhadas). E esses seis meses foram fatais: eu conheci o Sganzerla, fiz essa entrevista na praia, em que ele inclusive compara o Glauber ao Jango e diz que as coisas não estão desligadas uma da outra, que o Cinema Novo fracassou como o Teatro de Arena, o CPC, o governo do Jango e a esquerda. E que eram duas lideranças irresponsáveis, que tinham feito fracassar a política e o cinema. E ele meio que me chamou pra ser assistente dele no “Sem Essa, Aranha” que era um filme com o Zé Bonitinho. Eu devido, a essa coisa...E quem indicou o Luiz Gonzaga e o Moreira pra atuar no filme fui eu...E o Zé Bonitinho vim a descobrir pela Helena Ignez que o Glauber chamava o Sganzerla de Zé Bonitinho. Ele era muito bonito na época, e veio a casar com a Helena Ignez que foi mulher do Glauber anteriormente. Então, parece que o Glauber sacaneava e chamava ele de Zé Bonitinho. Não sei se foi por isso, que o Sganzerla chamou o Zé Bonitinho, mas a história é engraçada. Então eu fui assistente dele no “Sem Essa, Aranha” e eu tinha comprado uma máquina super-8 de um colega meu, Pedro Wilson e comecei a fazer experiências em super-8. E fazer filme com dinheiro de mesada, tentava fazer aquilo milimetricamente. O Sganzerla não, ele queimava filme como queimava fumo (risos) e todo mundo filmava, era uma loucura. Ele era meio estabanado, e volta e meia pedia pra eu deixar minha máquina super-8 na casa dele, aquilo pra mim era um tormento porque aquela máquina era o meu tesouro que em 78. Eu vou fazer o meu primeiro filme que o Hélio e o Torquato em 69 eles viajam pra Londres, pruma exposição que o Hélio fez lá. E eu fiz esse trabalho de assistente...e tanto o Sganzerla como o Bressane eles se vestiam com um conjunto de jaqueta e calça de veludo, calça Lee, jaqueta Lee também. Então, por incrível que pareça eu trabalhei no filme e teria trabalhado até de graça. Mas ele me pagou, porque ele tinha ganho muito dinheiro com esse “Mulher de Todos” e era um cara rico e muito generoso. Ele me pagou e aí eu comprei uma roupa igual a dele (risos) e com o figurino de cineasta, eu me tornei cineasta mas eu era formado pela televisão. Eu ficava muito em casa, fascinado por esses seriados...
Z- Além da Imaginação ?
IC- Além da Imaginação, Cidade Nua, Bonanza, Os Intocáveis, 20.000 Léguas Submarinas, Bat Masterson, Fugitivo, Rota 66. Eu gostava mais de Rota 66 e do Impacto, mas a minha mãe achava que não era muito próprio pra mim e me proibida. E tudo que te proíbem, te estigma mais. E também Combate, era uma loucura que o Brasil sendo o país que a coisa que deu mais certo no audiovisual é a televisão. Mas a nossa televisão se tornou apenas a casa do cinema americano, só tendo um canal que passa cinema brasileiro e o único telefilme que fizeram aqui, era o “Vigilante Rodoviário”. O Galante produziu, Carlos Miranda era o inspetor, tinha o cachorro Hugo e o Simca Chambord que era merchandising da Simca...E eu via tudo isso. Quando a TV Globo chegou no Brasil, a Tupi que era a Globo na época, a TV Rio no Rio, a TV Excelsior, porque até a televisão eram mais regionais na época, e não essa coisa hoje em dia de redes nacionais. As televisões eram diferentes regionalmente: a Tupi de São Paulo, era diferente da Tupi do Rio de Janeiro, por exemplo. Então, quando a Globo começa no Rio ela era quase uma TV a cabo...então eu fiquei muito em casa e pude ver uma quantidade enorme de filmes que não passavam nem na Cinemateca e passavam na televisão. Faroeste, capa e espada...Até obras-primas do cinema como “Bom Dia Tristeza” passavam lá, porque o cara comprava filmes pra TV por quantidade. Então, eu sou mais formado pela televisão do que propriamente por cinema e depois do Sganzerla eu me desformou totalmente (risos). Aí eu tive um grupo de atores, chamado Ivamps que a minha namorada era protagonista e o meu melhor amigo Zé Português, era ator..tinha outro ator que era um vizinho meu. Ele era filho de uma cantora de ópera que era amante de um embaixador chamado Jayme de Barros, que tinha uma coleção de obras muito grande. Uma verdadeira pinacoteca, porque o cara tinha sido embaixador na Tchecoslováquia logo depois da guerra, então ele pode açambarcar uma pinacoteca incrível. E esse cara ele tinha navalhas, bolas de ferro...Violinos, várias coisas que eu usava como objeto-de-cena e a casa dele era quase um museu. E ele era um cara meio sádico, digamos assim (risos), então torturava-se o Português no “Sentença de Deus”. E eram filmes que eu fazia na maneira que o Sganzerla filmava e pau que nasce torto, continua torto. Então, a primeira impressão que fica. Embora, eu tenha feito meu mestrado cinematográfico com o Bressane, sendo assistente e diretor de produção, still e making off. E quando eu fazia produção, eu fazia sozinho porque era eu e um outro amigo dele, mas um amigo bem de cinema...A equipe eram duas pessoas e o fotógrafo era o mesmo, que trabalhava sozinho. Fui diretor de produção do “Rei do Baralho”, “Mostro Caraíba”, que foi um filme que ele fez em dois dias em Búzios com o Carlos Imperial. E acho que o Imperial não leu o roteiro e foi lá filmar. E logo falou que tinha que voltar ao Rio e tal...Embora ele, tenha produzido o filme, acho que não recebeu nada e ainda pagou laboratório. Ele somente pediu pro Júlio um favor: “Júlio, se a imprensa te procurar você diz que foi ótimo trabalhar comigo que eu sou um ator genial, só um dia você teve um problema comigo que tinha tanta mulher comigo, que eu tava fudendo uma mulher e não pude filmar (risos)”...O Imperial já era um discípulo do Goebbels, achava que o que valia...(risos). Depois eu fiz “Agonia” que foi outro filme síntese do Cinema Novo, o Bressane já tem outra trajetória cinematográfica. Era um cara muito...disciplinado, o pai dele era general do exército então ele conseguia fazer esses filmes em quatro dias. “O Rei do Baralho” acho que foi em uma semana. Eu aprendi muito com ele, o “Moreira da Silva”, o meu primeiro curta eu fiz com o mesmo equipamento que ele filmou, com o mesmo negativo, fotógrafo e montador...
Z- Quanto tempo levou o “Moreira da Silva” ?
IC- Um final de semana. E o Moreira também foi genial, porque na época ele tinha 73 anos e já era bem velho em relação a gente. Eu mesmo não entendia nada de cinema, imaginava que playback era colocar um disco na vitrola e o cara cantar em cima. Cinema é uma coisa tão maluca, que tem números que ficaram em cima e outros não...Se eu tivesse mais experiência eu teria até conseguido aproveitar mais números. Ele e o Grey..Mas mesmo assim, como o fotógrafo do Bressane era muito virtuoso e fazia muitos filmes. A gente conseguia filtrar um número com o Grey que é o “Que Barbada” que é um cineclipe e tem outros números que ele faz números musicais. Até o Ricardo Barreto, agora quando deu depoimento sobre mim pra “Marca do Terrir” ele levantou uma coisa que eu sei, mas nunca percebi. Ele falou que era uma loucura porque eu gostava dos filmes do Elvis Presley, que já era uma coisa meio fora de moda pra nossa geração, que era mais Beatles, Rolling Stones...Elvis é pré. Mas o primeiro disco que eu ganhei da minha mãe era “Its Now Or Never”. Ela sempre me reprimiu, mas como toda mãe (risos). Então, eu sempre gostei de número musical de cinema americano, mas eu até pisei na bola porque uma das coisas mais legais do Moreira é a maneira em que ele falava, porque samba de breque é tudo gíria. A música do Moreira são argumentos, roteiros falados...Bem cinematográficos, são histórias de malandros...E eu mesmo não entrevistei porque tinha esses amigos de vanguarda, era contra tudo. Era a época do “Proibido Proibir” então você tinha de fazer tudo que fugisse do convencional, então eu não queria fazer um documentário esquerdofrênico. Eu sempre quis fazer um musical e não entrevistei o Moreira, porque os filmes super-8 que eu fazia só tinham trilha sonora, sem som direto. Som direto era coisa que eu só vim a dominar e conhecer quando eu fiz um documentário pro Mojica, que já era um telefilme co-produzido pela TV Cultura. E a gente fez também...Eu não sei quanto tempo demorou esse filme do Mojica, mas não demorou muito tempo não. A televisão não ia ficar lá muito tempo, foi uns quatro dias. Aí depois teve um concurso, na época da “Geléia Geral”, “Nosferatu”, super-8 eu fiz quatro longa-metragens nesse formato, mais ou menos quarenta filmes. Desde anúncios, trailers de filmes inexistentes, documentários, todos modelos de filme que até hoje em dia consigo ver melhor essa quantidade. Na época, ás vezes eu juntava um filme no outro pra fazer uma coisa maior, mas eram dois filmes separados. E tinha esse grupo Ivamps e fazia sessões que eram paródias de sessão de cinema. Então, tinha anúncio, que era uma crítica a anúncio da Ditadura; trailer e até cinejornal. Eu comprava filme super-8 americano e botava como curta-metragem de filme americano e por último entrava o filme maior, que devia ser longa-metragem. E o Torquato, não sei se pra fazer birra com o Caetano, qual o problema ele começa a investir radicalmente contra o Cinema Novo na coluna “Geléia Geral”. E eu acabei colaborando lá, escrevendo o artigo “A Mixagem É Uma Burrice”, em que eu usava o Zé do Caixão como modelo. Um dos interesses que me aproximou do Sganzerla, é que ele falava muito e gostava muito do Mojica. No Rio de Janeiro, você não tinha...Principalmente eu um cara de classe média, classe alta lugar pra ver os filmes do Mojica...Os filmes dele só passavam em subúrbio, em cinema de periferia. Então, era muito difícil você ver o filme do Mojica e também, os que fizeram mais sucesso são anteriores...Eu não era um rebelde sem causa ainda (risos), eu tinha uns 13 anos, nem conseguiria entrar pra ver o filme. Tava vendo ainda “Lawrence da Arábia” (risos quando passava “A Meia Noite”, “Essa Noite”. Mas eu já via a fotografia do Mojica, aquelas unhas e Zé do Caixão...E só aquele nome Zé do Caixão já é uma loucura (risos). E o Sganzerla dizia que ele era o maior cineasta brasileiro, tal. Então, uma das coisas que mais me aproximou do Sganzerla era ver ele falando sobre o Mojica, e ele falava sobre o Mojica de uma forma muito sganzerliana. Ele acha que o Zé do Caixão é genial porque ele é um imbecil (risos). Porque é um brasileiro que fica coçando o saco em frente a barbearia, que fica o dia inteiro jogando carta e quanto mais o Mojica queria acertar em cinema, mais ele errava. O Zé tem o cinema dentro dele, já que a mãe dele trabalhava em uma sala e o pai foi gerente dessa mesma sala...Então, ele nasceu praticamente dentro de um cinema. E até é uma coisa complicada, eu insisti com ele ontem quando estive com ele e ele nega. Mas esse filme dele “Meu Destino Em Suas Mãos” é impossível que ele não tenha visto o “Vertigo”. Você viu esse filme do Mojica?
Z- O “Vertigo” sim. O do Mojica não.
IC- Esse filme tem a mesma situação de um campanário de Igreja onde a pessoa fica pendurada numa cenografia idêntica ao “Vertigo”. Claro que o do Hitchcock é mais elaborado. A do Mojica a história do pai é um bêbado que dá porrada no filho. O filho fica com horror do pai, e aí quando o Mojica bebe bate no filho, na mãe, dá porrada em todo mundo...E ele foge e vai pra Igreja. Aí o pai descobre que o filho tá na Igreja e vai buscar ele. O filho com medo do pai, sabe do Campanário e acaba caindo do degrau da escada, que está podre, tal...E no “Vertigo” também é assim, o cara tem vertigem. Aí acaba o filho ficando preso no alto, aquela mesma coisa do filme americano e o Mojica ao salvar o filho fica pendurado numa corda e vai cair. E é muito bem decupado, ele sabe filmar muito bem. Eu acho ele, de fato, um dos maiores cineastas brasileiros. E é gozado: eu perguntei se ele tinha visto o “Vertigo” e ele me disse que não tinha. Não sei se ele viu e não sabe o que é, ou quem sabe o Hitchcock viu (risos) “Meu Destino Em Suas Mãos” e copiou o Mojica. Mas isso você tem que procurar um cinéfilo aí, o Rubens Ewald Filho, o Bernardo, o Inácio Araújo, o Carlão... O Sganzerla já morreu...Alguém que destrinche esse mistério. E outra coisa genial que eu vim a saber ontem que eu nunca tinha perguntado, é que ele tinha todas as unhas cumpridas, menos o do indicador que ele dizia que era coçar orelha, tirar meleca, discar o telefone e tirar o peru pra mijar, fechar a barrilha, tal. Nunca me passou pela cabeça, porque mulher vive se queixando que quebrou a unha. Unha de mulher é muito menor que as dele, aí eu perguntei: “Zé você dorme amarrado ? Como você faz ?”. Porque as unhas dele, na época que eu fiz o documentário então estavam com 15 centímetros, uma coisa de louca. Aí ele me falou: “É o instinto Ivan. O instinto de preservação faz com que mesmo eu dormindo me mexo de uma forma que não quebro as unhas”. O Mojica é o tempo todo assim, uma pessoa fantástica. E o Sganzerla, falava muito na época e saia muito na imprensa uma coisa dos testes do Mojica que deve ser a coisa mais genial. Eu tentei até pra esse documentário, comprar partes de um cara do “Cruzeiro” chamado Mário Moraes que filmou os testes prum filme dele chamado “Mundo Cão”. Ele me falou que o Mojica obrigava as pessoas...Porque quando ele fez o filme que tem aquelas aranhas...“Essa Noite Encarnarei No Teu Cadáver”, as atrizes abandonaram o filme no meio das filmagens por causa da cena das aranhas, porque são 400 aranhas caranguejeiras que sobem o corpo das atrizes, então ele teve de recomeçar o filme e começou a fazer filme. Então, o cara ia lá e ele obrigava o cara a comer um prato de barata...Arrancava dente com alicate a sague-frio...Arrancava barba com alicate também, o cara pisava numa bacia e segurava em cabos de alta tensão, levava choque...Culminando com ele prender a língua de um sujeito com um prego. Aí infeccionou a língua do sujeito e aí deu polícia e tal...E proibiram os testes do Zé do Caixão (risos). Ele tinha até um programa de televisão, então ele era um ícone. Era uma pessoa muito estranha.
Z- E a chanchada ? Como você foi ter contato com essa face popular do cinema brasileiro ?
IC- A chanchada também...É gozado esse negócio...Na entrevista do Sganzerla, eu fiz pra conhecer ele e agora eu recuperei a entrevista por causa de um livro que estão fazendo sobre ele e é impressionante, que eu sei a entrevista praticamente de cor, tendo ouvido depois de 69. Na época, eu devo ter escutado muito ela que eu não publiquei em nenhum lugar, e tinha gravado em fita de um quarto, eu tinha um gravador Sony que na época todo mundo tinha. E gravei numa velocidade muito lenta, pra aproveitar mais a fita. Então, pra eu conseguir eu tive de ir no Arquivo Nacional pra através de computador, transcrever ela, porque com computador eles acertaram a voz e a fita. É gozado que nela o Sganzerla fala contra cinema de autor, se interessa muito mais em fazer filmecos pra ganhar dinheiro. Fazer picaretagens, pra ganhar dinheiro que fazer filme de autor. Ele fala muito de cinema americano, tem toda a dialética do Sganzerla, que quando falam bem do Godard ele fala mal, quando falam bem ele fala mal. Porque não existiu realmente outro cineasta que tenha acabado o cinema em seis anos, como o Godard. Não existe, nenhum cineasta que tenha acabado com o cinema. E acabar com o cinema também é uma babaquice porque...Não é legal acabar com ele, porque sem ele a gente não tem o que fazer (risos)...Mas, o Godard. Eu tenho autógrafo dele, ele é meu ídolo também. Acho ele o maior artista, o Godard, o Stockhausen, Augusto, Décio Pignatari, esses caras são os maiores artistas vivos. Acho que o Pollock é vivo ?
Z- Já morreu, tem até um filme sobre ele.
IC- Pois é, mas deve ter algum americano aí. O Liechstein já morreu ?
Z- Não sei.
IC- O Norman Miller acho que é vivo...O Bob Dylan é um dos maiores artistas...E o Stockhausen disse que a maior obra de arte do século foram os aviões que derrubaram as torres. Mas ele teve de parar de dizer isso, porque senão ele não ia tocar mais em lugar nenhum (risos). E a gente vive numa época de crepúsculos. Por isso, eu digo pra você que é difícil falar dessa época. Era uma época de total Ditadura Você não tinha internet, não tinha vídeo, não tinha nada, nada. Mas era uma repressão louca, porque você ia na livraria e tinha o livro vermelho do Mao e você podia comprar qualquer livro do Marx, do Engels. A repressão no Brasil, vamos dizer que não era uma repressão burra porque até hoje em dia você vendo, eu peguei pra fazer os makes do “Sarcófago Macabro” com locução de cinema, eu peguei os anúncios da Ditadura. É a mesma coisa de hoje em dia: “plante que o Governo garante”, Petrobrás, Milagre Econômico...Tanto é que o Delfim Netto, virou o guru do Lula (risos). É inacreditável ! E o ACM virou nosso ídolo (risos)...Pelo menos chamou o Lula de ratazana etílica (risos)...Então, realmente nós andamos pra trás, em vez da gente andar pra frente. Morreu o Brizola, as utopias acabaram e até o professor de história (risos)...Eu ainda folheando Konder na casa do professor de história e o professor quase entrou em transe, porque o Leandro Konder era o crítico do PC...O PC tá apoiando o Alckmin ! Entendeu ? É a loucura total, hoje o bom parece que é o PCC, mas parece que a gente não pode falar isso, por causa da tal lei da associação ao tráfico. Porque você estiver ao lado do Marcola você vai preso por associação ao tráfico, mas talvez o Marcola seja melhor que o Lula e o Alckmin juntos (risos). Pelo menos tem mais capacidade, o Marcola sabe a gente sabe de onde vem o dinheiro (risos). E não é da Opus Dei, lê Danti Aligherri e sabe dá jeito no Alckmin e no Lula. Mas a gente não pode dizer que somos do Marcola, nós somos contra o Marcola ! (risos). Então, a gente vive uma época em que sobrou o Godard e o Bob Dylan (risos).
Z- Qual era a coisa mais difícil quando você começou com o Julinho e com o Sganzerla: fazer still ? Assistência ?
IC- Não, era a coisa que misturava assim...Era um mundo diferente, porque hoje em dia você fala: artista, as pessoas confundem com os atores da TV Globo, não que eles não sejam artistas. Tem alguns atores dessa emissora, que são mesmo grandes artistas mas eu tive o privilégio de conhecer essas pessoas, trabalhar com elas então era um aprendizado, uma coisa muito radical, muito visceral, porque as condições...Esse filme “Sem Essa, Aranha” era uma loucura porque o cara não sei porque razão, queria fazer um filme nos moldes que o Hitchcock fez “Festim Diabólico”. Só que o “Festim Diabólico” além de não ser um dos filmes mais geniais do Hitchcock, ele era um Deus quando chegou a Hollywood, era da Paramount, sei lá que companhia. Penso que da Paramount ? Então, ele chegou e filmou uma peça de teatro e era um cu de ferro total fazia storyboards...Era o Hitchcock, então ele fez esse filme que não é o melhor, que era uma peça de teatro e que você já filma montado. E o do Sganzerla o contrário, ele ficava fumando maconha o tempo todo (risos), não ensaiava nada. Era com o Zé Bonitinho, que era um gênio de improvisação, mas fez o filme em uma semana, o Sganzerla comigo graças a Deus eu sempre fui amigo dele, mas era um sujeito muito estourado, eu mesmo indiquei o fotógrafo de cena que era esse Machado...Mas o próprio fotógrafo do filme, o Edson Santos que é um excelente câmera quando os caras erravam durante a filmagem. Ás vezes durante a filmagem, ele filmava e enquadrava a própria equipe, não tinha nem ensaio o cara saia filmando naqueles planos de dez minutos e o Sganzerla com uma vitrola atrás trocando a música, ainda jogando ás vezes lata na parede pra fazer barulho. Tinha uma sonoplastia até bastante de vanguarda, bastante requintada...Ás vezes eu até fazendo hip-hop, arranhando a agulha do disco da vitrola e era uma loucura total. O Sganzerla era uma pessoa muito virtuosa, foi crítico de cinema muito tempo. Ele escrevia muito bem, mas ele mudava as coisas escrevia de novo, reescrevia.
Z- Eu li uma entrevista do Zé Bonitinho que ele falava que o Sganzerla escrevia roteiro em papel de pão...
IC- É, uma loucura total (risos)...É um filme assim...Terminoso, eu acho que os maiores filmes do Sganzerla foram de fato “A Mulher de Todos” e “O Bandido da Luz Vermelha”, eu acho que ele deveria ter ficado em São Paulo e continuando trabalhando com o Galante, com o Palácios. Ele fazia um cinema americano de gênero, mais popular e no Rio...É gozado que nessa entrevista que eu faço com ele, o Sganzerla esculhamba o cinema de udigrudi americano, dizendo que os filmes americanos tinham todos os defeitos do cinema de autor europeu, inclusive por se influenciar por isso e não tinha a violência do cinema americano...Mas ele ficou fascinado pela maneira do Júlio fazer cinema, pelo dezesseis milímetros, por essa liberdade de trabalhar sem produtor, de fazer cinema experimental...Mas eu acho que o cinema experimental liberou o Júlio do Cinema Novo mas pro Sganzerla acho que não foi uma boa experiência, porque acho que você não deve se arrepender de nada que você faz mas o Sganzerla do “Bandido da Luz Vermelha”, da “Mulher de Todos” e o próprio “Betty Bomba” que virou “Carnaval Na Lama” a parte que foi filmada anteriormente a Belair, a ida dele para o Rio é mais legal do que o que virou “Carnaval na Lama”. Mas era diferente, e eu acumulava essas funções todas e não tinha nem tempo pra saber...O Júlio sempre fez um cinema minimalista, ele sempre conseguiu fazer essa fórmula udigrudi de fazer cinema, filmar em casa, fazer filmes em quatro dias. O “Agonia” acho que ele fez em quatro dias, esse “Monstro” em dois. A maior produção em que eu trabalhei com o Júlio em que eu pude fazer making off mais longo, que depois eu fiz uma viagem a Europa comprei uma máquina Bolier e tentei repetir em 16 a experiência que eu fiz em super-8, mas quando eu estava voltando não sei porque a gente se atrapalhou, depois do “Moreira” teve um concurso do Idac/MEC do Departamento de Assuntos Culturais do Ministério da Educação e Cultura, na época da Ditadura que todos os diretores foram contemplados. Foram 24 filmes, e tinham duas categorias: desses documentários babacas de folclore, disso, daquilo, não sei o que...Que davam oitenta mil e davam quarenta e cinco mil pra filmes de museu: Museu do Ouro, Museu do Açúcar e Museu Goeldi...Museu Goeldi é um museu muito particular, porque é um museu sobre a região Amazônica no Pará, porque é jardim botânico, jardim zoológico e museu de antropologia. E tinha um etnógrafo muito badalado chamado Eduardo Galvão, que foi um cara que trabalhou com o Rondon, com vários pioneiros desse negócio e que odiava o Levi-Strauss, porque achava que ele só tinha visto índio três dias...Sacaneava assim (risos)...E o Viveiros já era estudante de sociologia e antropologia e ele fez o roteiro pra mim desse. Mas quem ganhou na minha categoria foi o Cacá Diegues, mas o pai do Cacá era diretor do Idac e acho que ele se sentiu incomodado de receber de pai pra filho...Não sei se ele se sentiu incomodado, mas eu sei que o roteiro que mais chamou a atenção foi o meu não por ter sido feito por mim, mas pelo Viveiros. E no tal artigo que eu escrevi no “Geléia Geral”, era um artigo dividido em treze itens. Um dos itens ditava uma frase do Décio Pignatari: “Com “Os Herdeiros”, o PSD ganha seu Visconti”e o Cacá ficou maluco com isso e se entregou totalmente. Eles aí se contra atacaram e é uma coisa estúpida, porque você nunca deve responder. Porque quando você é agredido na imprensa quem lê, leu e quem não leu, não leu. Mas quem não lê, não leu. Quando você responde, você não só cria polêmica como quem não leu...Vai ler. Aí me atacaram o Calmon falando que eu era um babaca porque eu fazia filme de vampiro no Brasil, e ele está hoje em dia fazendo novela de vampiro, bebendo água no meu rio, na minha fonte (risos). E dizendo que não se interessava em filme super-8, que isso era coisa de rico, que eu era um fudido, ele fazia filme em 35 dizendo que meu problema era fazer filme em super-8 ! Hoje em dia o sonho de todos os garotos é fazer filme em super-8, voltou até a moda e o vídeo nada mais é que um super-8. Dizendo que a Belair, era uma marca de carro, ou seja, esculhambando o Rogério e o Bressane, e os dois viraram ícones do cinema brasileiro e o Calmon nem mais do cinema é. O Cacá escreveu um artigo no jornal assinado “Luchino do Amaral Peixoto”, ou seja, assumindo que ele era o Visconti do PSD. Pô ! o meu avô que foi prefeito do Getúlio, sempre achou esse Amaral Peixoto um babaca que o apelido do cara era Alzirão, porque ele casou com a Alzirinha que era a filha do Getúlio. A única coisa que ele tinha de importância, foi ter se casado com a filha do Vargas, esse cara era um coronel, um ACM do estado do Rio que era um dos estados mais...Ele era tipo um Sarney do antigo estado do Rio, capital Niterói que era o grande trauma de nós cariocas (risos) foi ter sido jogados pra esse estado do Rio (risos). Agora descobriram petróleo em Campos, e tem até o Garotinho, tal está melhorando (risos), Moreira Franco...Que é até melhor que o Alzirão, Amaral Peixoto...Mas era um cara desprezível e o Cacá deu essa bandeira. Ele disse que eu era um homem que sabia falar javanês, porque filmava em super-8. E era uma loucura, porque, na verdade o que eu fazia eu era um garoto de propaganda do Cinema Novo: filmava com uma câmera na mão e...
Z- Uma idéia na cabeça ?
IC- Uma não (risos), milhares de idéias na cabeça...Entendeu ? Mas a coisa de faz assim, cada geração destrói a anterior e é assim. Taí até hoje, o Cacá fazendo os piores filmes brasileiros (risos).
Z- E fala um pouco como você conheceu o Grey...
IC- O Elyseu Visconti já tinha feito um filme de lobisomem, mas que de lobisomem não tinha nada que se chamava “Os Monstros de Babalu”. Também não são filmes...O Elyseu é um grande cineasta, mas ele é um caso assim muito próximo ao Bispo do Rosário. A minha família é do Rio Grande do Sul, e uma vez eu convidei ele que era muito amigo do Rogério, do Júlio...Mas um pouco mais velho, ele também morou na casa desse embaixador da Tchecoslováquia por linhas cruzadas. Ele é neto desse Eliseu Visconti que é um grande pintor impressionista brasileiro, que pintou até o teto do Teatro Municipal do Rio...A mãe dele, filha desse verdadeiro Eliseu Visconti era uma professora de pintura. Foi professora do Oiticica e o Hélio morria de rir dizendo que ela fazia mamões cubistas (risos)...O Elyseu era de terceira geração dessa família de pintores, então ele era um cara altamente...O monstro de babalu é ele. E eu combinei com ele de fazer um filme sobre o Lupicínio Rodrigues, porque minha mãe é gaúcha, tinha contatos e amigas que moravam no Rio Grande do Sul, parentes que fizeram contato com o Lupicínio, acertamos tudo. No dia em que nós combinamos e eu comprei o filme ele me aparece e diz: “Ah não Ivanzinho...Estou pensando em ir pro Norte” porra ! (risos) convido o cara pra ir pro Sul e ele querendo ir pro Norte ? Mas era um cara muito legal, tal mas não dava pra realizar esse filme. E o Elyseu já tinha feito esse filme com o Wilson Grey, e ele era o recordista mundial de filmes...Perdão: brasileiro de filmes. E ele trabalhou no “Rei do Baralho” e eu conheci ele nesse filme e fiquei muito amigo dele. Ele trabalhou no “Moreira da Silva”, e eu passei a ficar muito amigo dele, aprendi muita coisa com ele, foi uma pessoa assim...Ele era um gentleman, um verdadeiro malandro e o meu filme “O Segredo da Múmia” eu demorei cinco anos filmando o filme. E eu fazia com o Viveros que tinha feito experiências em super-8, que não consegui terminar pelo alto custo das bandagens, porque na época não tinha dinheiro nem produção, a gente comprava bandagens de farmácia e cada vez enfaixava o tal Zé Português de múmia e cada vez era um problema. E o filme acabou ficando incompleto.
Z- E como você teve contato com a chanchada ?
IC- Eu devo ter visto isso também na televisão, meio sem saber o que que eu tava vendo.
Z- Você se considera um cinéfilo ?
IC- Não...Eu infelizmente não...O Hélio Oiticica tem uma definição genial. Ele diz que tem cinéfilos que sabem o nome de todos os filmes, colecionam retrato de diretores de cinema. Eles confundem cinema com mania de bicha de coleciona retrato...Eu nunca tive. Eu colecionava retrato de corredor de automóvel, eu era mais macho (risos). Eu tinha um modelo de uma carta que o meu pai fez e eu bombardeava os pilotos de automóvel. O meu homossexualismo era em outra área, não na área cinematográfica. Então, não tenho essa coisa, embora claro que tenha os cineastas que eu gosto hoje em dia eu conheço bem determinado tipo de cinema, mas eu não sou um maluco por isso. O meu montador, Gilberto Santeiro se você perguntar pra ele, ele te recita ficha técnica, sabe tudo. O Rogério era assim, o Júlio é, o Carlão parece que também é assim. Mas eu não tenho isso. E até nas chanchadas que eu gosto muito...Eu gosto muito de comédias, gosto muito de filme de Abbot Costello, filme de sessão da tarde. Filme de televisão, Elvis Presley, “20.000 Léguas Submarinas”, Marck Nelson...Até filme de Monkees (risos). Quer dizer, eu gosto muito de filme ruim ? Então, filme ruim você não guarda ficha técnica. Eu tenho meu conhecimento cinematográfico do que eu gosto, mas é e engraçado isso...Eu tenho mais conhecimento até de várias coisas que de cinema. Eu fui massacrado...Porque esse cara era pianista clássico e foi massacrado pela gente por ser pianista clássico. Era um inferno, porque você não podia nem conversar os caras tocavam violão e quando paravam o Barreto, que era o pior no violão (risos)...Tinha um tal de Luiz Henrique, colega nosso que era um cara que músico tem uma coisa fálica...Ainda mais música popular que a variedade de acordes é mínima, e o cara sendo virtuoso pega por ouvido e esse cara fez esse negócio de ir pra América e voltar...Ficar lá seis meses, aprendeu a cantar em inglês. Tinha essas coisas que a gente sempre gostou de música cantada em inglês, a gente só foi gostar de música cantada em português depois do Tropicalismo. Se bem que eu cheguei a ver também Edu Lobo, Nara Leão...
Z- E Milton Nascimento ?
IC- Não, Milton Nascimento eu não gosto (risos). Eu entendo até que ele tenha esse lado cult que seja muito bem recebido lá fora, mas na entrevista do Sganzerla que eu vou até tentar publicar na “Folha” ou no “Estadão”, me marcou demais. Ele fala assim que se a gente destruir, porque nessa época 68,69...Era jogar tudo na fogueira, se acabou com tudo. O Chacrinha virou o ícone que jogava bacalhau no povo. Então, o Sganzerla fala assim: “Se a gente jogou todos os ícones internacionais, temos de destruir os nossos também. Temos de destruir o Villa-Lobos, o Mário Faustino”. Ele falou isso, só porque o Glauber usou esse poeta no “Terra Em Transe”...Então, tem essas coisas..Por isso eu não tenho noção de ficha técnica, eu sou de uma geração diferente. Eu comecei pelo Godard, em vez de começar pelo John Ford que é genial ou o Hitchcock. Embora o meu cineasta preferido seja esse último. E gosto muito de faroeste, de cinema de gênero. Porque Hollywood realmente era uma indústria, então os caras faziam filmes em duas semanas. Não tinha essa coisa de artista, essa coisa mais diferente (risos). Então é uma coisa, meia complicada porque a gente nunca teve uma indústria até por causa do cinema americana, porque domina o mundo inteiro.
Z- E a chanchada e a pornochanchada ? Você considera uma indústria ?
IV- A chanchada foi e a pornochanchada também...Mas é complicado isso. O Godard diz que todo filme vira documentário. Porque quando você vê um filme de vinte anos atrás, aquilo vira um painel daquela época. A pornochanchada...Que eu via muito nos cinemas e fiquei muitas vezes acordado até ás duas da manhã porque a TV Excelsior, canal 2 do Rio...Não sei se tinha, se não tinha...Ás vezes tinha, ás vezes não tinha um número de strip tease que encerrava a programação (risos). Eu ficava lá dormindo em pé, porque ver uma mulher nua era...Eu vi muita empregada, porque o cinema que eu mais curti foi o buraco da fechadura vendo a empregada trocar de roupa (risos). Hoje em dia, em qualquer banca vende filme pornô...O próprio garoto já come a namorada dele de treze anos...Então não tem essa repressão sexual que a minha geração tinha. Então, era uma coisa curiosa isso...Por que a pornochanchada fazia tanto sucesso ? Porque tinha a Ditadura, a mulher nua o máximo que você tinha era o cinema francês e o italiano que mostrava um peitinho, uma coisa assim. E vem a pornochanchada, que não é sexo explícito mas mostra a mulher nua, não sei o que e começa...É legal, mas é muito barbárie. Eu gosto porque sou muito ignorante, muito burro, meio tarado (risos)...Mas é difícil...O Remier acha o máximo, mas é uma degeneração isso. Você não pode achar que o Carlo Mossy é um cineasta, nem cineasta ele é. É uma coisa complicada. O Galante é genial, eu mesmo agora montei um ciclo no Canal Brasil. Botei “Ariella”, “Convite Ao Prazer”...
Z- Eles deram uma listinha ?
IC- Eles deram...Porque eu pensei em vários jeitos...Pensei em fazer de cinema de cangaceiro, não dos clássicos mas “Corisco, o Diabo Loiro”...Os subgêneros de filmes do cangaço.
Z- Você gosta desse tipo de filme...Do Carlos Coimbra ?
IC- Gosto, porque é faroeste, faroeste brasileiro. Inclusive nessa entrevista do Sganzerla ele fala que a coisa mais fascista é a idéia de uma cultura brasileira, no cinema brasileiro. Que isso é a coisa mais fascista que existe. Cinema...Que as artes são coisas universais...Cinema é americano, até o negativo é americano. Como vai ser brasileiro ? Não existe cinema brasileiro, nem filme brasileiro. O Celso Furtado não inventou o Filbras (risos), você filma com negativo americano ou alemão. A pornochanchada é genial porque na época as pessoas queriam que a gente fizesse um cinema de vanguarda, como o Cinema Novo. Ele chegou a ser de vanguarda em relação ao cinema europeu de autor e a pornochachada era totalmente desprezada porque ela era produzida pelos exibidores que davam dinheiro pra esses caras que não eram politizados e que faziam filmes sem compromisso social. E os filmes, você revendo eles, embora não fossem assim bem dotados artisticamente...As atrizes eram muito bem dotadas, são filmes básicos...Você consegue entender o filme. Uma coisa é você ser autor sendo o Fellini, sendo o Godard, sendo um autor. Agora não é qualquer um, eu até acho que alguns do Cinema Novo o Leon Hirzman, o Glauber, o Ruy Guerra...Esses caras até tinham...
Z- David Neves ?
IC- (risos) Prefiro o David Cardoso (risos). Embora não goste dele, também não. Mas eu acho interessante assim...por essa coisa kitsch desses filmes, porque são piadas infames, as mulheres ficam nuas...Você comprava, não era nem “Playboy”, não sei o nome. Tinham algumas revistas que tinham um pouco de mulher nua, era difícil...Então era legal e hoje em dia você vê que os caras até tinham algum conhecimento cinematográfico e fazem um tipo de cinema mais normal. Porque pior é o Bruno Barreto, Arnaldo Jabor são caras que...O Jabor até como jornalista, ás vezes ele escreve algumas coisas boas...Mas é muito...Nem psiquiatra ele é. Complicado, complicado...A gente vive um momento complicado, principalmente aqui em São Paulo. Você chega aqui em São Paulo, você pensa que as pessoas como você vão votar no Alckmin. Mas elas odeiam o Alckmin. É gozado isso...No Rio ninguém gosta dele, mas tá todo mundo de saco cheio do Lula...(risos). Realmente, é difícil porque o cara só quer construir presídio, quer...E ele já é todo vendido, porque o Serra e o Aécio são os que mais sacaneam ele. Já me disseram que quem espalhou o papo dos vestidos foi o Serra...Entende ? Então, é cobra comendo cobra. A gente vive uma época em que a pornochanchada virou do caralho, mas ela era do caralho porque ela era feita sem o dinheiro do Estado. O dinheiro era do exibidor, ela arrastava pra dentro do cinema doid milhões de espectadores, ela formava público, ela formava técnicos...Formava elencos que não são de televisão, ela descobria essas deusas do sexo. Mas é muito...vai ver Godard, Stockhausen, conhecendo Bob Dylan é muito pouco. O Hélio Oiticica era pianista clássico. Eu não tenho essa cultura. Pra ele o artista mais importante era Mozart, ele tocava piano clássico antes de fazer as obras dele. É uma cultura isso, o cara da pornochanchada...(risos)...Porque ele devia conhecer o pior tipo de música possível (risos), é genial por causa disso. Agra é genial isso...São caras que dirigiam, produziam e escreviam e até protagonizavam...Uma coisa assim sensacional. O Imperial tem uma história que o cara do estúdio de som me contou que o Carlos trabalhava com um sujeito que só leva esporro dele. Aí mixou o primeiro rolo, mixou o segundo rolo...O rolo era duas de diálogo e duas de música, sem música sem nada. Aí chegou no sexto rolo, o sujeito esqueceu a música na produtora e pagando o estúdio o Imperial não ia esperar vim o rolo. Aí ele pensou, pensou e disse: “Repete o quarto rolo” (risos)... Que dizer, é de uma coragem sem precedentes. Mas é...o Brasil é um país sem tradição artística. O Hélio Oiticica, fala isso no documentário “HO” uma frase do Mário Pedrosa, que o Brasil era um país condenado ao moderno, porque a nossa tradição artística passada é muito pobre em relação a países que...A Itália, porra lá tem arte há dois mil anos e criou isso. Por outro lado, eu viajo muito e vou a festivais, então é gozado, porque as pessoas só pela maneira de você falar os caras ficam te olhando...Devem te achar alguma espécie de orangotango, pela maneira que você fala. Normalmente, o brasileiro fala mais alto. O Glauber então, explorou isso como ninguém. O Glauber em Cannes usou como ninguém isso, no prêmio em “Deus e o Diabo” ele usou a mesma roupa o festival inteiro. E dizia que só tinha aquela roupa. Limpava o cu com a mão e passava merda na parede do hotel...Olhava pro café da manhã, ia dar entrevista e via geléia e falava: “O que é isso ?”, respondiam: “Geléia” e ele falava: “No meu país não tem isso” (risos). Quer dizer pô ? No Brasil tinha...Ele se fazia de Terceiro Mundo.
Z- Isso que revoltava o Sganzerla ?
IC- Não. Acho que era o lado mais bacana do Glauber (risos). Mas é um lado naify...Porque tem até uma frase que o Décio usa no livro dele que é muito legal: “Não tenha medo de ser forte intelectualmente”. Acho que a Tropicália faz um pouco essa ruptura. Ao mesmo tempo que ela assimila mal gosto...Ela recicla Vicente Celestino, Chacrinha e devia reciclar até a pornochanchada no caso...Tinha Duprat, Júlio Medaglia, esses caras que são de vanguarda. Os Mutantes são sensacionais. Mas é complicado, se tivesse uma receita...Cinema falam que é a única atividade que você pode fazer tudo certo e dar errado e pode fazer tudo errado e dar certo. Eu acho que as outras atividades devem ser assim, eu não sei. O cara, o Arquimedes não descobriu a física tomando banho ? As histórias são mais...Hoje em dia eu sou viciado no canal de história da televisão. Você não sabe se aquilo ali é tudo inventado ou se é verdade. Um dia tava vendo um tal Case, que é um profeta americano, um médium que ele dormia e no que ele dormia, ele fazia premonição. E depois de um certo tempo, ele passou a ter uma secretária e...vai ver ele até comia a secretária que americano anota tudo e arquiva tudo. Então, esse cara tem um arquivo boçal...e o Theodoro Rossevelt e vários outros. Eu já vi um programa sobre esse Case, que foi uma desgraça que como todo bom médium ele não recebia dinheiro pra fazer isso e isso desgraçou ele. Aí depois de um tempo ele passou a aceitar doação, porque a família deu um basta na situação dele...Criaram uma fundação Case. E na América também é diferente...Porque se um cara desse quer ganhar dinheiro não tem limite. O doutor Fritz, nunca o cara recebe...O sobrinho do doutor Fritz, a mulher do doutor Fritz...Quer dizer ? O Chico Xavier, o cara aceitava uma galinha (risos)...O cara tinha a maior criação de galinha de Minas. Então é complicado isso. Aí outro dia eu vi um documentário sobre quanto maior a pessoa, mais ele se sente inseguro e quer saber do seu futuro. Era sobre os presidentes americanos, que recorreram a médiuns pra saber o seu futuro. Aí recontaram esse caso do Case...Que esse cara descobriu que o Theodoro Roosevelt ia morrer e ele não morreu. E ele ainda deu assessoria pra outros presidentes. Falaram também do Lincoln que teve quatro filhos e parece que morreram três. E a mulher do Lincoln ficou baratinada e recorreu ao espiritismo pra se comunicar com os filhos. E o presidente fez vista grossa, e participava até de sessões espíritas na Casa Branca. E aí veio até o Nixon, que através de uma secretária mantinha encontros com uma médium chamada Dixon. Era concretisma até e revelava coisas pra ele...O Lincoln Johnson, os sonhos também...Mas os sonhos Freud já trabalha a mais tempos (risos). Os pesadelos na Casa Branca (risos)...É gozado, você não sabe ali se aquilo tudo é invenção, porque americano é todo fuma, mas não traga. Esporra, mas não goza (risos).
Z- E quando vai ser lançado sua biografia na Coleção Aplauso ?
IC- Na Mostra do ano passado eu vim com três filmes e já existia a Coleção Aplauso. Eu aí não só falei: “Vamos fazer esse”. Porque você pode ver biografias de pessoas que você pensou que nunca teria acesso. Chamei o Remier Lion pra escrever e estamos trabalhando nisso.
Z- Fala um pouco da sua relação com a Embrafilme...
IC- Na época das “Sete Vampiras”, quem ia produzir o filme...O Khouri tinha me apresentado o Enzo Barone, um produtor da Boca. O Walter tinha ido fazer os filmes com o Aníbal e o Enzo não tinha projeto, e portanto, ele ia produzir “As Sete Vampiras” que seria estrelado pela Carla Camurati. Eu vinha do “Segredo da Múmia”, tinha arrebentado e tinha ganhado 17 prêmios, prêmio em Portugal...Filme que foi a Cannes. Eu queria fazer meu segundo longa, então tive várias reuniões com o Enzo. Aí teve um vestibular da Embrafilme, que por causa dessas fofocas todas, as coisas cada vez ficavam mais difíceis e mais controladas: o sistema de julgamento e tudo mais...E eu tinha o acesso via o Calil, o diretor geral da Embrafilme era o Roberto Parreira. Ele era um cara meio estranho, um executivo....Que é muito gozado, porque a história do Celso Amorim eu conto depois. “O Segredo da Múmia”eu tinha botado um projeto lá nos anos 80. Não me lembro o diretor, qual foi...Acho que o Roberto Farias, que saiu e entrou o Celso Amorim. Aí na arrumação da gaveta, acharam a minha carta e um dia estou em casa toca o telefone e era o Celso Amorim: “Um momentinho Ivan, que o ministro quer falar com o senhor e vamos produzir o seu filme”. Aí veio ele me dizendo que iriam produzir o meu filme. Só que eles assinaram e liberaram a verba no valor que eu tinha pedido três anos antes, então aquela verba não dava pra fazer o filme. Aí que eu me associei com ao Zelito, ele tinha todo tráfego, era do sistema...Uma das famílias do Cinema Novo, então as portas da Embrafilme se abriram pra mim e a gente usou esse dinheiro que eu ganhei pra filmar “O Segredo da Múmia”. E em seguida, o Zelito arranjou mais reajustamentos pra terminar o filme. Aí estamos no caso das “Sete Vampiras”, aí eu já tinha ficado amigo do Calil, que era assuntos não-comerciais. O meu montador, Gilberto Santeiro é muito amigo do Calil e através disso eu fiquei amigo, camarada dele...E uma hora ele me disse: “Olha Ivan, o teu filme não está na lista dos projetos aprovados”. Mas eu me desdobrava em explicações culturais e de mercado, que o cara tava doido que você fosse embora, porque ele tinha que tratar de coisas mais relevantes e eu com esse papo de vampiras, mercado (risos). E no final deu certo. Mas antes disso, quem iria produzir o filme era o Enzo Barone, só que quando se aproximou essa coisa a mulher do Barone se separou dele, que era uma atriz do Khoury. E aí pra se reconciliar com a mulher foram pra Honolulu, aí eu fui pro Aníbal, perguntando se ele queria produzir o filme. Ele me disse: “Eu topo, mas eu tenho esse filme aqui, dos primos. Uma mão lava a outra, você faz um episódio com a Camurati pra comprimentar aqui o meu filme”. Aí fizemos o filme, mas deu uma confusão total, aí eu perdi o coisa...Mas depois deu tudo certo.
Z- Vamos falar do seu primeiro longa “O Segredo da Múmia”. Parece que a primeira versão era muda e depois que o roteiro veio do Luchetti...
IC- Como eu te falei: quando se olha pra trás é rápido. Eu tenho 54 anos, eu fui casado três vezes, mas não fui casado. Não tive filhos, eu vivo e sou viciado em trabalho. E ataco até por ter sido discípulo do Hélio Oiticica eu sou multimídia: eu sou fotógrafo, artista plástico, cineasta, jornalista...só não mato, não roubo e não como a mulher do muito amigo...o resto (risos). Aí eu tinha feito esses filmes em super-8 que foram até por essa polêmica com o Cinema Novo, foi muito legal. Depois dois acontecimentos que foram muito especiais...Não é por eu ser botafoguense, que isso aconteça comigo. Mas os filmes chegaram ao Museu de Arte Moderna, numa exposição de Carlos Vergara em 72. O Torquato ainda era vivo. Passou lá “Nosferatu”, “Sentença de Deus”, todos...Aí fiz até um convite, o Vergara seja por uma generosidade dele ou sei lá por que ele abriu a exposição com o Hélio Oiticica, pro Chacal. Pra alguns fotógrafos, e ele não quis fazer uma só dele por essa coisa da Ditadura em que as pessoas que estavam começando tinham dificuldade de começar, porque não tinham como mostrar o trabalho. E ele também fazia filme super-8. Então, tinha uma sala de super-8 no MAM, onde estavam programados os meus filmes. Aí começaram a passar os meus filmes e deve ter gerado uma fofoca no MAM porque antes de “Nosfeartu” tinha o trailer “Amor e Tara” que eram duas mulheres trepando: a minha mulher e uma amiga. Era um filme pornô, mas o Hélio Oiticica até escrever que era o “anti-playboy”. Tinha o único filme que eu fiz no mesmo modelo que não era documentário, que era um dos meus melhores filmes, que se chama “Onde Freud Não Explica”. Eu fiz esse trabalho em 72...porque eu andava com a câmera o dia todo. Eu tinha um grupo de atores e gente filmava o dia tudo. E eu tava filmando a calçada da praia de Copacabana uma vez aí dois garotos de escola pública, que deviam ter menos de 10 anos ou 10 anos me viram com a câmera e começaram a encher o saco: “Me filma ! Me filma”. Eu até, por não ter filho e na época ter 18 anos, não gostava e não tinha relação com criança. Eu filmava de tudo, e eles estavam vestidos com roupa de escola pública um de casaco de couro. Aí os caras começaram a se masturbar nas calçadas de Copacabana pra eu filmar e obviamente, eu como fotógrafo filmei. E é um dos meus melhores filmes, que os caras se masturbam de dia na Avenida Atlântica em frente ao Forte do Leme. Mas na época, nem existia pedofilismo e eu não era menor de 18, mas era menor de 21 e não tinha...Eu não paguei, eu não obriguei...Eu vi aquilo na rua e filmei. E imagens de vampiro que não era político nem nada, mas só pelo vampiro ter uma capa vermelha já achavam que eles e eu éramos comunistas. Aí subiu essa fofoca ao terceiro andar do MAM e o embaixador Walter Moreira Salles, pai do Waltinho e do João, proibiu a exibição dos meus filmes. Não só proibiu, já que ele era embaixador...Ele fez uma carta que se tentássemos continuar a exibição, ele próprio se encarregaria de mandar os filmes para a Censura para obter uma Censura especial. Só que esses filmes em 72, se batesse na Censura eu não tava aqui talvez. O filme com certeza não estaria. Aí houve um impasse estava muito grande, porque a gente nem podia fazer um protesto oficial disso em jornais porque chamaria a atenção da Censura para os filmes. Então, uma curiosidade para a sua entrevista: pai censor, filho artista (gargalhadas). Não bastava ser banqueiro...Aí eu já tinha feito esses filmes todos, já tinha chegado num impasse, mas esses filmes já tinham passado no MAM, na PUC...Passou em vários lugares como na casa do Hélio Oiticica em Nova York, na casa da Lygia Clark em Paris...Onde eu podia passar, passou. Mas também não tinha como eu ganhar dinheiro naquilo, eu já tinha tirado todo suco daquilo.
Z- Você vivia do que ? De ser fotógrafo ?
IC- Não, vivia de mesada. Tinha 21 anos em 72. Eu tinha 20 anos. Aí eu fiz essa viagem a Europa em 75 e comprei um fotômetro automático, que você carregava com aqueles filmes de 16mm de três minutos, sem saco preto, sem nada era muito parecido com uma máquina super-8 pretendendo continuar esse tipo de trabalho que eu fazia em 16mm tentando ampliar para 35. E comecei a fazer esse filme de múmia sem roteiro, Viveiros e eu...Gozado, nós contratamos Wilson Grey que era ator pago, o Julio Medaglia era meu amigo e trabalhava de graça. O Felipe Falcão, o careca trabalhava de graça. Um puta ator, a melhor revelação que eu fiz. E a gente filmava, filmava e poderia estar filmando até hoje. Um tempão. Essa época foi muito proveitosa pra mim, porque eu fazer esse filme e paralelo a isso eu fiz o filme do Mojica que foi o Medaglia que me arranjou produção. O Medaglia era muito amigo do Walter Durst, que era o diretor da TV Cultura. Então, com um telefonema ele arranjou a produção pra eu fazer o documentário do Mojica que era o sonho que eu tinha e graças a produção da Cultura eu tive a chance de fazer algo com som direto. Filmei de mais uma hora, fazendo um filme que resgatou o Mojica, aí depois por essa coisa louca de fazer e não parar de fazer...E ganhamos o prêmio de melhor roteiro em Brasília, prum filme que não tinha roteiro (risos). Porque é documentário e é o primeiro filme que o Gilberto Santeiro montou, esse filme meu sobre o Mojica. Aí depois eu fui ao Sul, porque eu era muito amigo do Pignatarri...E ele falava muito dos “Ratos” que era um livro do Dyonélio Machado, que ele queria fazer o roteiro pra mim, que eu deveria fazer esse filme. Aí eu fui lá, fiz um documentário sobre o Dyonélio, só que eu fiquei mais interessado...Porque ele escreveu “Ratos” em 1935, e depois ele escreveu outros livros. Mas na época que nós fomos lá, ele já estava com 83 anos e já tinha acabado de fazer uma trilogia de livros passados em Roma no século I. Eu sempre fui muito ligado a essa coisa de filmes épicos, filmes romanos...Eu adorava filmes de Hércules do Steve Reeves
Z- Porra que legal ! O David Cardoso também é muito fã dele. Ele comia todas as atrizes da época...
IC- Ele era um grande ídolo da época...Comia todas as atrizes e tinha atrizes italianas muito bonitas, deusas. Aí eu gostei mais dessa parte greco-romana do Dyonélio...E fiz um filme sobre o Oiticica...E tudo isso paralelo ao filme de múmia. Eu ainda tenho um documentário que eu comecei a fazer sobre o Jackson do Pandeiro, que eu tenho o clipe que eu ainda não finalizei. Já ampliei pra 35, ainda esse ano. Foi uma época que eu trabalhei muito. E eu tive a felicidade de fazer esse filme do Hélio Oiticica, que eu vim a descobrir que as únicas cenas do Hélio com a Lygia Clark estão no meu filme. Mandei esse filme pra exposição que estão fazendo em Huston sobre a obra do Hélio, que vieram sobre essas imagens. Se eu soubesse, eu como fotógrafo eu teria feito essa foto, mas está no fotograma do filme. E o filme do Hélio, também tá na Bienal...Porque virou assim...Me deu um trabalho desgraçado pra fazer, porque na época a obra dele estava toda encaixotada. Eu só pude filmar os parangolés e as obras como ele falava, obras desclassificadas, de invenção...Eram invenções...Porque fazer um documentário sobre um pintor é fácil: filma os quadros dele e pronto. Mas as obras do Hélio, você tinha que descobrir como filmá-las, filmando. Então, ás vezes a maneira como você filmava não era correta...Você tinha de filmar de novo. Então, foi um curta que me deu um trabalho enorme, mas eu fiquei com uma hora de material...Mas depois ficou treze minutos. Por isso, eu pude fazer “A Meia-Noite Com Glauber” e o “Heliorama”, porque eu tinha esse tesouro, porque não era sobra eram inéditos. E foi uma coisa bacana, porque você faz uma coisa que você não sabe e anos depois o que você pensava que era menor se torna maior. Ainda mais sobre o Oiticica, porque ele nem chegou a escrever sobre o filme, já que ele morreu em seguida do filme. Então, foi uma pena porque senão ele seria o maior crítico, o maior incentivador desse filme. Mas esse filme hoje em dia, é o maior tesouro porque você não somente ouve a voz dele e vê ele em movimento...Mas você vê ele manipulando. Porque uma coisa é você mexer nas obras dele, eu mexer...Mas outra coisa é ele próprio, que sabia melhor mexer naquilo.



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