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Entrevista

Entrevista: Concórdio Matarazzo

Por Matheus Trunk
Fotos e edição de arte: Gabriel Carneiro

Muitos estranham essa minha fixação pelos técnicos da Boca. Mas após essa entrevista que considero a melhor que fiz até agora, com Concórdio Matarazzo, tudo estará explicado.

Concórdio pra quem não sabe, foi o segundo mais ativo assistente de câmera da Boca. Esteve presente nessa função em mais de 25 filmes, muitos clássicos da época como “Ariella” de John Herbert ou “Pornô” e “A Noite das Taras 2”, produzidos por David Cardoso. Foi amplo colaborador de Jean Garret, participando de filmes como “Tchau, Amor” e mesmo de “Karina, Objeto de Prazer”. Atuou em diversos filmes do grande Ody Fraga como em clássicos como “O Palácio de Vênus” e “A Fêmea do Mar”. Foi também fotógrafo de três longas, entre eles o único filme (“Uma Aula de Sanfona”) dirigido pelo crítico da “Folha de São Paulo” Inácio Araújo.

Conca, como foi mais conhecido nas esquinas próximas do Soberano fala de tudo e de todas as pessoas do período. Elogia, engrandece, reclama e até xinga. Concórdio Matarazzo é mais um desses gigantes que andam pelas esquinas das cidades formado pela faculdade da vida.

O homem que esteve sempre ao lado de Ody Fraga, Carlos Reichenbach, John Herbert, Jean Garret e foi o fiel escudeiro de Cláudio Portioli destila sua visão de cinema e mundo. Com Portioli, formou uma das mais famosas e talentosas duplas de fotógrafo e assistente que o cinema paulista já conheceu. E revela ainda ter sido parceiro dos primeiros trabalhos de Jayme Monjardim, diretor de “Olga” e novelas da Rede Globo. Passando por todas as espécies de produtores da época como Alfredo Palácios, Aníbal Massaini Neto, Cláudio Cunha, David Cardoso, Fauzi Mansur e mesmo Antônio Polo Galante, todos são citados nessa entrevista de uma forma ou de outra. O Soberano, Máximo Barro, Ozualdo Candeias, José Rosa, Rafaelle Rossi, Zé Manir, Luizinho Oliveira, Kyula Kolosvari, os fotógrafos, os espertalhões, os grandes homens, as musas fantásticas, nada sai ileso pelo forte olhar de Conca.Técnico em quase 30 filmes em 60 anos de vida, hoje dono de uma loja de imóveis, Concórdio Matarazzo não teve nenhum tipo de receio de abrir o armário para a Zingu!.

Um homem que amou e ama o cinema e a vida. Eu aprendi muito com Concórdio Matarazzo e espero que vocês também aprendam.


Z- Pra iniciar seu Concórdio, queria que o senhor falasse como o senhor se interessou por fotografia e como o senhor veio parar na Boca.
CM- Essa pergunta é o seguinte: eu não comecei propriamente na Boca. Eu comecei numa firma chamada Jaraguá Filmes e eu não tinha nada a ver com fotografia, com filmagem. Completamente diferente. Recém formado pelo Senai, em eletricidade com 20, 21 anos e comecei a trabalhar numa firma chamada Francisco Matarazzo, só que era uma indústria de tecelagem e manufaturados. E aí por intermédio da minha irmã que trabalhava no jornal “O Estado de São Paulo”, ela me ofereceu: “Olha você gosta de viajar, tem uma pessoa que tem uma excelente vaga pra você”. E essa pessoa era exatamente o Rubens Muniz dos Santos, um jornalista do “O Estado de São Paulo”. Quando eu cheguei no jornal ele me fez a seguinte pergunta: “Você conhece o que é arriflex ?”, e eu fiquei espantado. Quase que eu pergunto: “Isso é pra comer ?” (risos). Mas aí ele me fez uma série de perguntas e eu sempre respondendo: “Não, não, não”. Até que uma hora eu perguntei pra ele: “Olha doutor, é o seguinte: o senhor está precisando de um eletricista pra ligar todos os equipamentos ? Ou uma pessoa que faça só filmagem ?”, porque até então eu tinha ido lá como eletricista. Aí ele olhou pra mim, ficou pensativo, coçou a cabeça várias vezes e aí ele falou assim: “Olha, pela tua resposta tem um trabalho pra você. Tem um trabalho institucional com atores, atrizes para a Pirelli. Chamado da estrada a rodovia”. Até hoje eu me lembro desse filme.
Z- Era um documentário ou um vídeo publicitário ?
CM- Era um documentário mostrando os pneus da Pirelli, o que a Pirelli era capaz de trazer de novidade pros carros da época
Z- Quando isso ?
CM- 63, 64.
Z- Na época só tinha DKW ?
CM- Não, eu não tinha nada (risos)
Z- Não eu sei seu Concórdio, mas na época os carros eram somente DKW, Fusca.
CM- Na época tinha DKW, os carros antigos dessa época e aí eles alugaram um carro, um Camaro, um Camaro vermelho. E nós fomos pra Paraty. Nossa ! Quando eu me deparei com Paraty eu fiquei muito assustado. De Paraty nós fomos pra Ouro Preto, Congonhas do Campo e esse trabalho demorou trinta dias, pra você ter uma idéia. O colorido era recente aqui no Brasil, aquela coisa toda então uma série de processos assim que ainda tinham de ser dominados, mudei pra cá e me apaixonei pela profissão. Mas vim a largar, largar entre aspas, porque de vez em quando tenho alguns convites e ainda acabo fazendo.
Z- Nesse primeiro trabalho o senhor foi assistente de câmera ?
CM- Magina ! Pra olhar num visor de uma câmera, eu demorei dois anos, porque até então não deixavam olhar de forma nenhuma. Não é como hoje: “Olha aqui, faz ali”. A turma era muito preservada, muito, muito. E não gostavam de dar oportunidades pra novatos. Então, eu tive uma dificuldade...dificuldade entre aspas porque sou muito despachado, sou muito falante. E por fim acabei me apaixonando, acabei me aperfeiçoando e eu sou um dos únicos caras vivos que trabalhei com todos os antigos técnicos da Vera Cruz.
Z- Quais deles ?
CM- Todos os fotógrafos que tinham passado pela Vera Cruz: o George Pfister, o Tekete, enfim quase todos eles eu tive a oportunidade e o prazer de trabalhar com eles em documentário.
Z- E qual deles foi o grande mestre do senhor ?
CM- George Pfister, o alemão, George Pfister. Que foi o pai, porque o filho trabalha em comerciais até hoje. E o grande mestre da brincadeira aí foi
ele. Além dele com o Paulo Ferreira e até com o Máximo Barro como edição. Mas como cortar, como colocar a câmera o grande problema como é você chegar na edição e não ver os planos que você credita. E então eu aprendi muito com essas pessoas. Com o Paulo Ferreira, principalmente.
Z- Portioli também.
CM- O Portioli foi assim em longa-metragem o máximo do máximo. Além dele ser um sábio, não por causa dele ter morrido essa coisa toda, mas como pessoa, como capacitação.
Z- Foi o melhor amigo de cinema que o senhor teve ?
CM- (emocionado) Meu maior amigo de cinema, nos tornamos compadres, por causa disso de tanto trabalhar junto. Nós não trabalhamos somente aqui em São Paulo. Trabalhamos em Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Florianópolis. Fizemos um trabalho muito grande pra uma empresa de petróleo em alto-mar na Bacia de Campos. Então, tem uma longa, longa e tem muita, muita história pra contar do Portioli muita, muita. Além dos copos, além da cerveja que depois do trabalho, essa coisa toda nós se reuníamos lá e aconteceu isso, aquilo sempre com uma cervejinha.
Z- O Portioli gostava de uma cervejinha também ?
CM- Nossa ! Nós nunca fomos assim alcoólatras. Mas sempre gostamos de cerveja.
Z- O senhor ia muito no Soberano ? Nos bares da Boca ?
CM- Com certeza.
Z- O Pio Zamuner ia ?
CM- Também ia.
Z- Quem batia ponto no Soberano ?
CM- No Soberano, eu aponto eu, o Cláudio Portioli, Mário Vaz Filho, Toninho Meliande, Jean Garret, o Pio Zamuner....
Z- Rafaelle Rossi ?
CM- Rafaelle Rossi, de vez em quando. Não era sempre, porque ele não participava da nossa turma. Quem mais que eu posso te dizer ? O Zé Manir que era eletricista. Enfim, nós se dávamos bem com todos eles, sem exceção, sem por, sem tirar.
Z- O Luizinho Oliveira ?
CM- O Luizinho ! O Luizinho foi e é um grande amigo.
Z- O Luizinho continua amigo do senhor ?
CM- Sim, continua só que ele pegou...
Z- Ele fez explícito.
CM- Mas isso na época era normal e é o ganha-pão de muitas pessoas, atrás das câmeras não tinha isso.
Z- Quando o senhor trabalhou na Boca o senhor viveu exclusivamente de cinema ?
CM- Vivi dez anos só de cinema.
Z- Que ano a que ano ?
CM- De 74 a 84. Só de cinema, não fiz essa coisa. Vivia muito bem. Era uns trabalhos prazerosos, eram trabalhos que davam prazer da gente participar. Essas produções, que hoje você tá vendo aí o que acontece ? Eram produções medíocres, perante equipamento, a quantidade de luz, ou seja, a disponibilidade de equipamentos que a gente tinha. E fazíamos grandes obras e fizemos muitas obras.
Z- O senhor via as pornochanchadas ? Gostava de ver nos cinemas ?
CM- Com certeza. Todos eles. E além do que eu censurava o meu trabalho e o trabalho dos meus amigos, pra comparar pros outros não cometerem os mesmos erros nas mesmas coisas. Então, isso aí é muito gratificante.
Z- O senhor foi mais assistente de câmera. Mas o senhor preferia ser fotógrafo ?
CM- Não, eu fui e acabei virando fotógrafo por convite e eu já tinha fotografado fora da Boca longas-metragens pela Jaraguá Filmes. Eu fiz “Isto É Brasil”, um documentário, um outro documentário de longa-metragem chamado “Isto É São Paulo”. Um monte, um monte. Fui fotógrafo de cromo, numa firma chamada George Henry associados, enfim, olha só não fiz a edição. Fiz desenho animado, com o...
Z- Latini ?
CM- Flávio...Esqueci o sobrenome...
Z- O Máximo também trabalhou nesse filme né ?
CM- Ele editou. Fiz o primeiro trabalho do Jayme Monjardim, “Maysa”, um curta-metragem dele e eu que fotografei para ele. Os primeiros trabalhos que ele fez, fora da Boca fora de qualquer lugar foi na Bela Vista com nós chamada eu e o Máximo na Maco Filmes. Nós tivemos essa firma e os primeiros trabalhos que ele fez foi com nós e quem dirigia era o Cimila Barbosa e ele ficou rico, na época ganhou muito dinheiro com sexo explícito. Foi o primeiro sexo explícito feito no Brasil.
Z- Não foi do Rafaelle Rossi “Coisas Eróticas” ?
CM- Não, não foi dele não. Ele se associou com, aquele cara da Boca. Ele veio também da Jaraguá Filmes, e ele teve uma passagem muito curta e por politicagem e coisa do gênero ele veio parar na Jaraguá. E nessa passagem dele, deve ter ficado dois e três meses e fizemos contato e essa coisa toda e de lá pra cá ele foi prum canto, que saiu daquela empresa e perdemos o contato. Depois ele voltou, já mais maduro e com a idéia de produzir os próprios trabalhos dele, dirigindo. Ele tinha muita vontade, aquela garra que tinha de ter diretor de filmagem. E ele acabou sendo um bom diretor hoje. Tanto é que nós trabalhamos numa produtora chamada Palavra Viva, da Igreja Católica e fazia a abertura tanto da Globo quando abria logo de manhã cedo. Nós fizemos 280 historinhas, um mais legal que o outro.
Z- Histórias da Bíblia ?
CM- Pegava uma frase da bíblia e desenvolvia o roteiro em cima disso. Passava ás cinco, cinco e meia da manhã. E chegamos a fazer 280.
Z- O senhor foi assistente de câmera ?
CM- Não, aí eu já fui fotógrafo e câmera.
Z- Que ano isso ?
CM- 90, e esses trabalhos já foram feitos em vídeo.
Z- Depois da Boca...
CM- Sim, mas mesmo assim eu nunca perdi os contatos com a Boca. Só agora, que agora virou Cracolândia que nem vale nem a pena passar lá (risos). Ainda quando foi ? Uns três e quatro meses, eu pensei: “Vou lá, ver se eu encontro alguém”. Aí eu passei lá, e foi uma decepção total.
Z- O senhor se emocionou ?
CM- Foi uma emoção muito grande (emocionado). Aquela rua cheia de astros, de estrelas, de técnicos e de repente tudo terminar. Tantas pessoas, tantas histórias e de repente como se passasse a borracha em cima, tudo acabou e o vento levou. E você me perguntou de que outros filmes eu participei, do “Cangaceiro” do último do Massaini. E esse outro que vai ser passado na televisão, também andei colaborando em alguma coisa do “Cangaceiro” pra televisão, pelo menos foi feita, nós filmamos muito.

Z- O senhor foi assistente ?
CM- Fui assistente também. E quem dirigia era o Massaini e o Conrado fotografou. O Conrado fotografando e eu fazendo a assistência.
Z- E ele é muito exigente o Conrado ? Como é trabalhar com ele ?
CM- Comigo ele é tranqüilo. E eu cheguei a trabalhar com o pai dele, o Plínio Sanchez em documentário também. Na rua Santo Antônio, em que eles tinham escritório.
Z- E o Máximo era amigo do Plínio ?
CM- O Plínio era muito amigo do Máximo. Enfim, tem muitos nomes, muitos nomes é uma pena que todo esse material que eu tinha como eu te disse por telefone foi extraviado. Mas eu tinha uma pasta desse tamanho que dava pra fazer um filme. E eu fiz um ano e seis meses com uma produtora americana chamada Hot Filmes um capítulo do reino animal que nós nunca vimos aqui. Uma equipe de 60 pessoas.
Z- Filmava no Pantanal ?
CM- Pantanal, Manaus. Um ano e meio colhendo imagens com atores, aventura, essa coisa toda. E nunca eu vi um fotograma aqui. É um negócio incrível isso...
Z- O primeiro filme do senhor na Boca foi qual ? Como o senhor conseguiu ele ?
CM- Foi “A Árvore dos Sexos”. Como experiência, como todo primeiro trabalho o coração bate mais forte, a ansiedade de você fazer um bom trabalho. Era um negócio novo, porque apesar de eu ter participado disso e daquilo, como se trabalhava, a emoção é muito maior que qualquer outra coisa. Muito grande (emocionado) como se a pessoa tivesse tido um filho sabe ? (risos). Sabe eu levo essa emoção, essa coisa exatamente como tivesse tido o primeiro filho. O José Rosa uma pessoa extremamente difícil de trabalhar com ele. Uma pessoa muito difícil.
Z- Foi o fotógrafo mais difícil que o senhor trabalhou ?
CM- Com certeza. Foi o mais difícil pelo gênio, pela prepotência: “Eu mando, eu sei e acabou”, o resto era o resto. Eu acredito que por ser o primeiro longa-metragem e uma pessoa difícil com certeza eu não peguei ninguém mais difícil que este para trabalhar. Mas apesar das dificuldades, foi um trabalho muito bom, muito gostoso de ser feito e demorou muito.
Z- Demorou quanto tempo ?
CM- Hum...Os dias exatos eu não sei, mas chegou a 60 dias. E fora do estado de São Paulo, porque esse filme foi feito no Bananal e outro pedaço em uma estância que tem outro nome.
Z- O Rubens Ewald Filho foi co-roteirista desse filme com o Sílvio de Abreu. Não sei se o senhor viu ele no set ?
CM- Sim, sim. Eu sei disso daí e inclusive esse roteiro deve estar no sótão da minha casa. Eu devo ter guardado, não só esse mas como todos os roteiros que eu peguei pra guardar tá debaixo do sótão. Só se as traças comeram (risos).
Z- O senhor nunca pensou em dirigir ? Teve proposta não teve ? Por que o Portioli teve e dirigiu dois filmes.
CM- O Portioli dirigiu mais de dois. Ele dirigiu pela Embrapi, que daqui a pouco você vai me perguntar.
Z- Pelo David Cardoso, “A Noite das Taras”
CM- E outro também
Z- “Pornô !”
CM- E eu fotografei.
Z- O senhor não foi assistente ?
CM- Não, num desses eu fotografei. Eu fiz tanto trabalho e depois quando você não passa a folhear o passado, a memória vai colocando outro assunto no chipzinho. Mas eu não recordo, mas a gente pode levantar isso aí.
Z- O segundo trabalho do senhor foi com o John Doo e o Candeias como fotógrafo. Como foi ser assistente dele ?
CM- Olha, eu admiro muito o Candeias porque ele improvisa muito. Uma pessoa que da época assim, ele era o top em matéria de inovar. Poucas pessoas, a inovação da câmera na mão que surgiu veio tudo do Candeias, porque antes era tudo câmera no pé, câmera no pé. E ele resolveu inovar, pegou a câmera na mão, e hoje tivéssemos assim como uma câmera de vídeo. E o Candeias renovou muito, muito e você me perguntou se uma pessoa difícil de trabalhar com ele, eu acho que não. Isso vai muito do relacionamento e da capacidade de cada um de alcançar no que ele pede. Então, ele não aceita um “não” e não aceita um erro. Você tem que ser muito preciso. Ele é muito perfeccionista, embora hoje eu não saiba como ele vive, nem nada porque eu perdi o contato. Mas na época, era uma pessoa simples que andava de chinelos e um extremo talento.
Z- Andava com menininha mais nova ?
CM- Só com mais nova, só com ninfetas (risos). Mas foi gratificante, eu aprendi muito com essa gente, com o Candeias com todos da minha época e estou aprendendo até hoje. Não vai pensar que eu estou aqui com vocês e não estou aprendendo.
Z- Como se estabeleceu essa parceria com o Carlão ? Fala um pouco dessa parceria e como o senhor foi conhecendo essas pessoas que o senhor foi formar a Embrapi: o Jean, o Éder, o Mário Vaz.
CM- Olha, a minha relação com o Carlão na Boca por intermédio do dia-a-dia, mas fora da Boca. E acabamos fazendo uma relação assim: “Olha, o que você gostaria de fazer um filme ?” ou eu falando pro Carlão: “Posso participar do seu filme ?”. Porque o Carlão até então, não era esse nome que tem hoje. Era uma pessoa desconhecida, sem nome, mas uma cultura um pouco além das demais pessoas. E ele veio de uma produtora chamada J. Filmes e ele tinha feito trabalhos lá e acabamos fazendo esse bem bolado e acabei sendo assistente dele em vários filmes. Eu fiz com o Cláudio Cunha, com produção dele uns três, ou quatro Carlão fotografando e eu sendo assistente.
Z- “Tchal Amor” o senhor fez ?
CM- “Tchal Amor” eu fiz, o roteiro é do Inácio e a direção é do Jean Garret. Eu sou assistente de câmera.
Z- E é com o Fagundes inclusive ?
CM- Sim.
Z- E ele deu um certo trabalho pro Fagundes ?
CM- O Jean era uma outra criatura muito perfeccionista, que queria assim nos mínimos detalhes: o foco tinha que ser preciso, a câmera precisa. Cobrava muito e essas cobranças que fazem que o trabalho ficasse bom e que o público aceitasse esse trabalho na tela. Ser criticado e ser elogiado, então por causa desse detalhe, dessas cobranças que o trabalho rendia.
Z- E ele era um puta diretor. Eu pessoalmente, penso que da Boca ele era o melhor.
CM- Olha foi uma pena ele morreu cedo e a gente não sabe as causas nem nada.
Z- Ele namorou muita atriz ?
CM- Todas (risos). Todas que passavam perto dele. Ele era um senhor garanhão. Passava perto, ele não perdoava. Mas ele não misturava direção com coisa amorosa. Jamais misturava.
Z- Angelina Muniz, eu sei que ele namorou.
CM- Angelina Muniz...
Z- A Aldine também ?
CM- A Aldine também...
Z- Porra que legal ! Ele era demais mesmo. E a Neide Ribeiro ?
CM- Não, a Neide Ribeiro era uma das atrizes mais inteligentes que eu vi durante esse percurso todo: pra ganhar dinheiro, nos vestimentos, na fisionomia.
Z- É verdade aquela história que o Galante queria tanto transar com ela que ela disse: “só se pagar tanto”.
CM- Não sei (risos). Mas o Galante coitadinho era baixinho, menor que nós (risos). Só tinha dinheiro.
Z- É verdade aquela história que a Matilde comia nua no set ? Que não tinha problema com ela ?
CM- A Matilde Mastrangi foi um caso único na história. Hoje a gente não pode contar porque ela tá bem casada. Mas a gente tem que tomar muito cuidado. Esse negócio de ficar nua, tem fotos por aí e realmente ela andava pelada mesmo. Tem uma foto, a coisa mais engraçada que vocês podem imaginar: ela nua e toda equipe de costas.
Z- Não agüentava ver ela mais nua ?
CM- Não, não agüentava mais. A Matilde foi uma pessoa extremamente agradável no trabalho, uma pessoa muito, muito dócil.
Z- O David tratava bem os técnicos ? E ele namorou todas as atrizes ?
CM- Na verdade, não é que ele tratava bem os técnicos é que tinha os técnicos que faziam que ele tratasse bem, senão abandonava o trabalho. E todos os trabalhos que nós fizemos na Dacar do David, todos os trabalhos deram dinheiro. Nenhum trabalho que nós fizemos lá na produtora dele deu prejuízo, todos foram sucessos: todos, todos. Os que eu fiz. Agora ele é outro que também namorava todas. Mas tinha uma diferença: o Jean Garret tinha uma cultura portuguesa, aquela coisa toda e o David é mato-grossesense, veio da escola do Mazzaropi, então é casos e casos.
Z- Dessas atrizes da Boca qual que dava mais trabalho pra filmar ?
CM- Helena Ramos. Era que se tinha uma cena que era pra ficar despida: era tapa-sexo daqui, tapa-sexo de lá aquela coisa toda e dava muito trabalho, mas muito, muito. Só que tinha um detalhe: você vendo a Helena Ramos visualmente, ninguém dava nada por ela, quando você via ela nas telas do cinema, ela se transformava. Na frente da câmera uma deusa pô ! E no dia-a-dia da filmagem nós não dávamos um vintém por ela e na tela ela crescia. Agora a pessoa que mais deu trabalho em todos esses trabalhos, foi ela a Helena Ramos. O público aplaudia e os nossos produtores iam atrás porque o objetivo qual que é ? Ganhar dinheiro, agradar o público.
Z- A Aldine também ?
CM- Não, a Aldine é uma pessoa extremamente amiga dos técnicos, amiga da equipe, enfim, era gente como nós. Não tinha problema não. Agora, obviamente tinha uma ou outra: “Não me toque, não me regue”.
Z- A Vanessa Alves também era tranqüila ?
CM- Também era tranqüila. Tranqüila, tranqüila.
Z- O senhor chegou a trabalhar com o Osvaldo “Carcaça” Oliveira, ele fotógrafo ?
CM- Sim, trabalhei com ele. Não me lembro o que ele fazia, mas eu fiz trabalhos com ele sim. Eu fui um dos únicos caras da Boca que eu trabalhei com todos os produtores. Larguei de muitos também, não vai pensar que não. Alguns, eu passava a mão na minha malinha e ia embora. Muitos não, acho que foi uns dois.
Z- Dos produtores que o senhor trabalhou qual que era mais generoso com os técnicos ? O Cervantes, por exemplo como ele era ?
CM- O Cervantes era espanhol, era uma pessoa sem família no Brasil até que eu sei e ele tratava os técnicos como se fossem filhos. Em comida, em hospedagem, em salário. Se ele gostava da pessoa, o que a pessoa pedia ele não chorava, não tinha é muito ou pouco, ele sempre dava o que você tinha pedido. É uma das pessoas nas produções dele que era o melhor pra tratar a equipe. Era o melhor, o top de linha.
Z- Era o que o senhor mais gostava de trabalhar ?
CM- Não que eu gostava, eu era bem tratado por todos.
Z- Cláudio Cunha, David.
CM- Cláudio Cunha, David com esses não tinha problemas.
Z- Galante ?
CM- O Galante era mais mão fechada. Pão-duro.
Z- Mas o filho dele era gente boa ?
CM- Eu fiz um filme com o filho dele. Também tranqüilo.
Z- O filho dele casou com a Sandra Graffi ?
CM- Ele casou. E nesse filme que eu fiz é que eles começaram a paquera.
Z- Existia uma concorrência entre o senhor, o Gyula, o Luizinho e os outros assistentes ?
CM- Sim. Não como é que é por “Olha eu vou querer fazer esse filme, aquele outro”. Mas a gente sempre tinha uma preferência das produtoras e um não conseguia entrar ou sair. Eu nunca fui muito disso não porque com a graça do bom Deus, eu sempre tive trabalho em todas as produtoras, essa coisa toda. Mas a gente notava que tinha assim um certo ciúmes e você me perguntou do Gyula, eu fui assistente dele. Eu não sei que trabalho, em que ele fotografou mas não estou lembrado.
Z- Um filme do Clery Cunha ?
CM- Do Clery Cunha. Eu fiz um ou dois filmes do Clery Cunha e eu fui assistente dele. É uma outra pessoa que é muito detalhista e que é muito complicado pra se trabalhar o Gyula, complicado não, atrapalhado melhor dizendo. Porque um simplifica e o outro atrapalha, atrapalhado.
Z- Ele tá vivo ?
CM- Tá vivo, só que quem pode te dar referência de onde ele anda vocês conhecem a Cinevídeo ? Na Caiubi. É uma produtora de vídeo, em que eu fiquei uns dois ou três anos fazendo comerciais nessa produtora fazendo comerciais pra ele e ele de vez em quando, e quando eu não fazia, chamavam ele pra fazer (risos).
Z- Continuou a concorrência !
CM- Só muda as datas.
Z- Como se estabeleceu a parceria do senhor com o Portioli ? Por que em todos os trabalhos dele ele chamava o senhor ?
CM- Sim. Essa parceria se deu pela afinidade, que eu já sabia o que ele queria, onde que ele queria colocar a câmera junto com o diretor, a altura essa coisa toda e eu facilitava ao máximo a vida dele. E ao mesmo tempo e ele facilitava a minha. Conclusão da história: nos últimos trabalhos dele eu fiz todos, não só aqui em São Paulo, como Belo Horizonte também. Então, essa parceria se deu por um acaso, a gente se deu bem, um entendo o outro e cobrávamos um cachê até mais alto que os demais.
Z- E como se estabeleceu essa parceria dele com o Ody, que ele foi fotógrafo do Ody em quatro filmes que o senhor foi assistente.
CM- Muito gratificante, muito gostoso porque o Ody era uma pessoa simples, uma pessoa com um nível intelectual, um QI elevadíssimo e o Ody dava o roteiro pro Cláudio e o Cláudio que passava a dirigir praticamente o filme com o Ody. Era assim, uma pela deficiência que ele tinha de saúde o Ody tinha deficiência de saúde: asma, bronquite, enfim ele era uma pessoa muito frágil. Então, chegava uma determinada ora: “Olha Claudião vê aí o que tá faltando e você me chama”. Então na realidade, quem acabava fazendo o filme era o próprio Cláudio Portioli. E o Ody era outro que gostava de fazer o teste do sofá (risos).
Z- Então, ele escolhia as moças a dedo...
CM- Sim, o velhinho tinha: “Essa aqui que vai fazer”, mas ele já tinha feito o teste há muito tempo (risos). O velhinho era fogo.
Z- O senhor lembra de alguma que ele fez ?
CM- Não vou citar.
Z- Mas o senhor lembra ?
CM- Lembro, lembro mas não quero citar.
Z- Ficou famosa a moça depois ?
CM- Todas que passaram pelo divã ficaram (risos).
Z- Amigo pessoal do senhor na Boca o senhor foi do Portioli e de quem mais ?
CM- Olha do Portioli, do Jean Garret, do Ody Fraga, do Carlão, do Luizinho. Bom, esses eram os mais chegados e eu nunca tive inimizade com ninguém naquele lugar. Aliás nem naquele lugar, nem em nenhum porque quando eu tinha inimizade tinha de esclarecer rapidinho. Não podia deixar pra trás não. Mas eu fui amigo, amigo, amicíssimo essa coisa toda desses aí. Até pode ser do Zé Manir que até hoje, mas me perdoe Zé, esqueci o teu nome ! Esse Zé Manir hoje ele faz a saúde dele está bem frágil.
Z- O Máximo Barro o senhor foi amigo também.
CM- Outro que eu tenho que pedir desculpas, o Máximo Barro. O Landini, o Nanni essas pessoas eram todas pessoas da faculdade Álvares Penteado e além deles darem aula.
Z- O Manoel Paiva o senhor conheceu ?
CM- Com certeza, até hoje.
Z- (espantado) Mas o Manoel Paiva não morreu ?
CM- Só se mataram ele agora (risos).
Z- Informação veio errada.
CM- Eu fiz um comercial de uma loja de roupa masculina com ele no finalzinho do ano passado, ele dirigindo e eu fotografando. O Manoel Paiva fez produção no filme do David Cardoso.
Z- Eu sei que ele dirigiu um filme em que o senhor foi assistente.
CM- Eu fiz sim.
Z- E o Carlão foi fotógrafo...
CM- Eu fiz.
Z- “Doce Delírio”.
CM- Então ele tá vivo e bem vivo.
Z- Ele deu aula na Faap ?
CM- Tá confundindo. Quem deu aula na Faap foi o Comte, o Nanni, o Máximo, o Landini, o Gozze. Hoje ele é coordenador da Faap e continua até hoje.
Z- O Máximo não
CM- O Máximo tá afastado e o Nanni também. Esse pra falar a verdade eu nem sei se ele está vivo. Mas o meu amigo José Paiva tá vivo (ocorreu durante a entrevista uma confusão, eu me refiria ao já falescido Manoel Paiva que se formou em cinema na Faap e dirigiu um filme na Boca “Doce Delírio” que Carlos Reichenbach fotografou e Concórdio Matarazzo foi assistente. Manoel também fez seleção musical de diversos filmes de Reichenbach e outros diretores como Fauzi Mansur, por exemplo. Conca se referia a José Paiva, que trabalhou em direção de produção de alguns filmes do David Cardoso e depois deu aulas na Faap).

Z- O senhor gosta de relembrar os tempos da Boca ?
CM- Na realidade, recordar o passado é muito gostoso, que nem eu estou aqui com vocês recordando o passado é muito legal. Eu se eu tivesse tempo, eu com certeza eu pegaria em DVD, em VHS essa coisa toda e começaria a recordar o passado. Uma que eu não tenho mais tempo e outra por preguiça também. Mas quando a gente começa a recordar assim como foi aquilo, como foi aquilo outro então a gente tem que colocar a fita debaixo do braço e não importa se for em casa, onde for e ver com calma pra lembrar como aconteceu, como foi. As dificuldades, os prazeres, as brigas, as encrencas (risos). Eu citei briga, briga não tinha briga, tinha assim alguma discussão alguma desavença, mas não briga de se pegar um querer comer a orelha do outro. Mas durante o período em que eu fiz filme na Boca, o pessoal de longa-metragem não cheirava, não consumia droga alguma a não ser bebida, a não ser de vez em quando aparecia um engraçadinho: “Oh meu, vai lá”. Mas não tinha hábito. Era um pessoal popular e o objetivo das pessoas que viviam e faziam isso aí era pra ganhar a vida e pra mostrar o público que aqui no Brasil o pessoal não tão bom ou melhor ou pior, mas pelo menos estamos fazendo.
Z-Tem algum trabalho do senhor que o senhor tem preferência ? CM- (pensativo) “Tchau Amor”. Foi um filme muito gostoso de ser feito, a fotografia ficou muita, muito boa. O Portioli era o fotógrafo.
Z- O senhor se lembra no “Tchau Amor” e na “Menina e o Estuprador” de um menino chamado Eduardo Aguilar que foi estagiário e depois virou assistente. Ele é grande amigo meu.
CM- Lembro, lembro. Branquinho, cumprido. Lembro, lembro sim.
Z- Ele tá bem, tá dirigindo.
CM- Que bom. Fala pra ele me convidar que eu ainda estou na ativa (risos)
Z- Tá bom (risos)
CM- Não, eu estou brincando. Inclusive tem pessoas que estão me chamando pra fazer mas eu não estou por dizer o seguinte não que eu não queira a fotografar, a fazer. Mas eu optei por ser empresário de outro ramo, então eu não posso ficar por exemplo, dez dias fora. Se eu ficar dez dias fora como que é ? Tudo que consegui até então vai pro brejo. Então eu não posso me afastar por causa disso. Mas não que eu não gostaria.
Z- Desde quando o senhor tem essa loja de móveis ?
CM- Há quatro anos. Mas na realidade, eu parei, parei há um ano e meio. Quem gerenciava aquilo lá é a minha esposa.
Z- Desde quando o senhor é casado com a dona Sandra ?
CM- 35 anos.
Z- Ela não ligava pro senhor trabalhar na Boca ?
CM- Ligava, ligava.
Z- Tinha problemas ?
CM- Tinha. Problemas sempre tem (risos). Mas eu sempre fui discreto, aquela coisa toda. Mas tínhamos e até hoje temos. E nós se damos muito bem, criamos dois filhos.
Z- O Portioli é padrinho de um né ?
CM- Padrinho do mais velho. E hoje ele já está vivendo no México, hoje não já faz vários anos.
Z- O que ele faz ?
CM- Ele é formado em ciência da computação e faz uns programas muito loucos prumas multinacionais. Então, criamos esses dois filhos estão criados, já não vivem mais em casa, se bem que o caçulinha depende um pouco da gente porque não está formado ainda. Está com 20 anos, e está se formando em agronomia.
Z- Todos os filhos do senhor estão encaminhados então...
CM- Pelo menos encaminhar, a gente encaminha mas depois a cabeça de cada um tem a sua. Mas a gente põe ele no lugar. É como o pai de vocês: “O caminho é esse, vê lá o que vocês vão fazer”.
Z- Como surgiu a idéia da Embrapi ? E os filmes não deram muito certo, como foi ?
CM- A Embrapi foi uma idéia de bar com o copo na mão e tava faltando assim filme pra exibir no circuito, na distribuidora e o Jean Garret, o Toninho e o Portioli falando assim: “Vamos fazer, vamos fazer” e um faz o roteiro, outro faz não sei o que, e eu tinha o equipamento de câmera. Então, vamos fazer aquela coisa toda: um entrou com roteiro, um entrou com a fotografia, com assistência, enfim fizemos uns trabalhos e metade do dinheiro nós pegávamos na distribuidora adiantado na bilheteria que era da firma. Foi uma idéia assim mirabolante e tinha tudo pra dar certo, deu certo, só não deu certo na ambição de cada um. Porque eu fiz esse filme deu X, outro deu Y e aquela coisa toda. Mas foi uma idéia assim que projetou muita gente, inclusive o Carlos Reichenbach. Foi assim, ninguém era conhecido fora do circuito de São Paulo aí de repente, o Carlão fotografando já se projetou fora, não só em Gramado como fora do país. Então, tudo isso em razão da Embrapi. Tinha pessoa ambiciosa, tinha pessoa que não ligava.
Z- O senhor não quer dar nomes ?
CM- Nem se deve, nem se deve. Mas se não fosse ambição e se nós tivéssemos partido e colocado um ou dois sexos explícitos nós teríamos um grande sucesso. E até hoje, até hoje as pessoas que eu ouço falar estão ganhando dinheiro. E quem fizer hoje, ganha dinheiro !(incisivo) e hoje é muito fácil de ser feito, muito fácil, muito fácil.
Z- Bem mais que na época ?
CM- Ah ! Não tem nem comparação. Hoje a pessoa que conhece a técnica de cinema é muito fácil, você faz ela em vídeo e transfere em fita. Você nem precisa fazer em película nem nada, que fica muito caro.
Z- Por que o senhor não quis fazer explícito ? Porque o senhor me contou que teve convites...
CM- Muitos. Não sei se eu venho de uma família meio puritana, italiana eu não aceitei.
Z- O senhor ia ganhar muito dinheiro ?
CM- Não, quem faz não ganha tanto dinheiro. O produtor é que ganha . Quem faz é que ganha dinheiro, quem é técnico não ganha muita grana. Agora pra produzir fica milionário e tem outro detalhe não só na produção se você elaborar, tem que ter a distribuição também. Por que senão !
Z- Qual a visão pessoal do senhor pro fim da Boca e da pornochanchada ?
CM- Na minha visão é assim: o filem nacional não tinha qualidade de som. Porque hoje virou carne de vaca, o som é impecável por que ? Porque você já faz ele combinado, hoje você já não precisa nem fazer mais em película como eu acabei de falar, você pode fazer em vídeo. E a qualidade do nosso som era péssima, era péssima. Então era isso, uma das razões. E a outra, a falta de recursos financeiros que ninguém injetou dinheiro nessa área. Que nem, tem o Conselho Nacional de Cinema...
Z- Hoje é Agência Nacional de Cinema...
CM- Agência Nacional de Cinema, como é ? Você já viu São Paulo receber alguma verba ? E quando dá essa verda dá pra quem ?
Z- Pruma meia dúzia...
CM- Pruma meia dúzia porque ganhou prêmio lá fora e porque é apadrinhado com A, B ou C, então o que acontece ? Acontece que a falta de investimento e a falta de visão das pessoas de só colocarem dinheiro nele. Tem que distribuir pô !
Z- Como o senhor vê a Embrafilme hoje ?
CM- Era melhor que hoje. Muito melhor que hoje. Porque você mandava o seu roteiro e se o teu roteiro tivesse conteúdo e tinha o respaldo da equipe técnica e o elenco, aí você pudia até mudar óbvio. Mas acompanhando o roteiro tinha de ter a equipe técnica e artística, hoje até não sei como funciona. Mas na época era melhor.
Z- O senhor acha que ajudou então ?
CM- Ajudou e muito, não só no cinema mas intelectualmente as pessoas precisam de algo como a Embrafilme. E hoje o que está acontecendo ? No cinema, muito pouco está se inovando e na televisão estão repetindo coisas do meu tempo. Ninguém tá fazendo nada, nós estamos pegando os roteiros velhos e refazendo. Então, eu acho que somos infelizes. Eu mesmo, se tivesse produções, essa coisa toda e largar tudo e me enfiar dentro de uma loja ? Você é doido !
Z- O senhor prefere trabalhar com cinema ?
CM- Com certeza. O tanto que é que você viu que nós tínhamos marcado no sábado...
Z- Mas rolou aquele negócio da banda...
CM- Aí: “Não, não quero”, aquela coisa toda e aí eu falei: “Mulher, como está nossas contas ? Não tem ninguém pra fazer esses trabalhos pra fazer, porque eu vou embora” (risos). E foi um trabalho muito gostoso, vocês vão ver o DVD da banda, que se chama Zincaro e é o primeiro DVD deles. Não é desconhecido, o primeiro registro de show deles
Z- O senhor fez câmera ?
CM- Não eu só fiz a luz. Só fiz a luz do show. Fui lá, colocamos a parafernália toda e vocês vão ver que trabalho.
Z- É uma banda de rock ?
CM- É tudo misturado, mas o som dos caras é um som que faz tempo que eu não via. Uns meninos muito bons, muito bons. E porque já andei fazendo esses trabalhos, enfim na área eu fiz quase tudo, só na fase de edição eu nunca mexi em nada.
Z- O senhor já fez roteiro ?
CM- Roteiro não. Como que é ? O nome das pessoas que trabalharam desde o tempo do Boca 7 e filmava em câmera quatro, porque tudo isso aí era filmado em câmera quatro. Então eu fiz tudo isso aí pô ! Vídeo eu passei a fazer vídeo na Globotech: institucional como diretor de fotografia. Mas é um negócio assim que você acaba abandonando exatamente por causa do dinheiro. Que é muito instável, eu quando comecei a largar o ramo, eu tinha de fazer só coisa com vídeo e vídeo você vê na hora pô ! Se bem que tem saber fazer tudo na hora.
Z- O senhor pensa que um fotógrafo de grande talento e qualidade como o Portioli um injustiçado ?
CM- Com certeza ele foi injustiçado. Agora, por outro lado o que acontece ? Quem não se mostra, não aparece e tanto Cláudio, como eu, enfim o pessoal da Boca era um pessoal que não fazer alarde, de não mostrar: estou vivo, eu sei fazer, contatos, essa coisa toda. Talvez se ele tivesse feito isso daí, com certeza ele tinha ganho prêmio.
Z- Mas ele ganhou no final...
CM- Mas prêmio que ele merecia. Então, isso daí uma das deficiências do pessoal da Boca é não se mostrar e não gritar: “Eu sei fazer, eu sou bom e acabou”.
Z- O senhor pensa que isso pra todo pessoal da sua geração foi prejudicado por isso ?
CM- Nós mesmos nos prejudicamos, não é que fomos prejudicados. Porque você pode pegar o pessoal do Rio que fazem as coisas pior que nós aqui ganharam prêmio, levantaram bandeira aquela coisa toda. Nós não, nós se aquietamos e nós não ganhamos nada, só ganhamos trabalho. Ainda pedindo “Pelo amor de Deus e tal” (risos) pra trabalhar. Isso é deficiência nossa e eu to te falando isso porque eu vejo essa coisa dessa forma. E porque não tinha ninguém que falasse: “Olha vocês tem gritar, tem que fazer curso, se reunir”. Então, o que acontece: se isola, não ganha e fica sem trabalho.
Z- O senhor trabalhou em dois filmes do John Herbert. Em “Ariella” com a Nicole Puzzi e no “Tessa, A Gata”. Fala um pouco de como era ele dirigindo e se a Nicole falam que ela era muito difícil.
CM- O John Herbert era uma pessoa que sabia o filme que ele queria fazer e ele tinha a Nicole que sempre foi problemática desde quando nasceu (risos), tanto é que durante os trabalhos metade do John Herbert e da produção tinham que ficar do lado dela. E eu fiz esses dois filmes, me dei muito bem com ele o Carlão que foi o fotógrafo e o trabalho dele foi um que ajudou a projetar o Carlão pra fora do país nesses dois filmes. Foi um trabalho gratificante tanto pra mim, pro Carlão, pro Johnny e pra própria atriz que projetou ela. Mas é uma pessoa muito problemática.
Z- Chegou a informação que o senhor foi diretor de produção do “Shock”, um filme do Jair Correia. Essa informação é correta ?
CM- Não tem nada a ver. Eu nunca fiz produção. A produção que eu fiz foi só institucional da minha firma que eu tinha com o Máximo.
Z- E com o Castellini ? Como foi trabalhar com o Castellini ?
CM- É outra pessoa, outro diretor que não sabe o que quer. E além de não saber o que quer, ele tem a voz ativa porque sabe de tudo e conhece de tudo, então com uma pessoa assim é muito complicado, muito complicado até demais. Eu trabalhei em dois filmes dele e ele foi sócio da Embrapi também.
Z- Ele deu problema quando sócio da empresa ?
CM- Também deu problema também (risos). O problema que eu digo é o seguinte: eu mereço receber isso porque eu fiz isso, aquela coisa toda então é sempre o valor assim, agregado. O dinheiro agregado as tarefas, então é isso, essa coisa tá errada. E numa sociedade eu acho o seguinte: não tem que fazer questão disso e daquilo e sim reunir o grupo: “Pera um pouquinho aí,vamos ver o que está acontecendo. Se eu mereço tanto, por que eu não estou recebendo isso ?”, então ele foi a pessoa que mais levantou a bandeira que estava sendo prejudicado.
Z- O Ody foi sócio da Embrapi ?
CM- O Ody foi. Foi sócio eu, o Portioli, o Carlão, o Éder, o Mário Vaz Filho, falescido Moreiras, o Castellini.
Z- O Moreiras morreu ?
CM- Esse é garantido (risos). Bom éramos em dez, quem tá faltando ?
Z- Ninguém: o senhor, o Carlão, o Castellini, o Portioli, o Ody, o Jean, o Moreiras, o Toninho Meliande e o Mário Vaz, tá certo.
CM- Éramos em dez e hoje se tivesse umas pessoas dessa daqui com a qualidade de trabalho que tem e montasse uma sociedade pra fazer esses trabalhos o cinema brasileiro ia ser muito melhor.
Z- Uma geração extraordinária...
CM- É uma pena que um fica velho, outro fica cego, como é que é ? Outro com as pernas bambas.
Z- O Toninho Meliande tá mal de saúde ?
CM- O Toninho Meliande operou o coração.Agora tá bem, pelo menos tava bem.
Z- Ele mora no Rio, mas pelo que sei ele vem muito a São Paulo ver a sogra...
CM- Não tive mais contato, não tive mais informação.
Z- Da época quem o senhor mantém contato hoje ? O Máximo ?
CM- O Máximo eu tinha muito, muito contato porque cada pouco eu tava junto com ele, essa coisa toda. Depois desse negócio da loja, como fica longe, distante e com esse trânsito caótico que tem a gente nem procura os amigos. E outra que o Máximo mudou de casa também. Ele morava próximo do Bom Retiro e agora mudou pra Angélica, aqui pra cima. Então, agora que piorou mais ainda só por telefone e olhe lá. E o Máximo também tem uma filha que casou e foi morar no Rio, então ele tá um pouco aqui, um pouco lá.
Z- Mas ele tá bem ?
CM- Tá, de saudade tá bem, ele já era aposentado na Maco nessa firma que nós tivemos e depois ele se aposentou na Faap também.
Z- Existiam uns sindicatos de técnicos na Boca. Eles funcionavam ? Ajudava ?
CM- Nunca funcionou. Sindicato só serve pra atrapalhar.
Z- Esse atual inclusive ?
CM- Olhe eu tenho registro e nunca ninguém chegou pra mim e falou: “Pra você fazer tal trabalho, você precisa dar o número”.
Z- O senhor é desse sindicato atual ?
CM- Sim, sou mas não pago mais nada. Vou pagar o quê ? Pra quê ? E tem outra coisa: fui me aposentar depois de quarenta anos de INSS que eu contribui e não quiseram me dar a porra da aposentadoria. E você sabe por que ? Porque o INSS não tem nos arquivos deles de 80 pra trás. Pô ! Então, se de repente seu eu tivesse mal de saúde, não tivesse o que fazer estaria morto de fome. Então, só atrapalha. Por outro lado, vou ser sincero: nunca bati na porta pra eles me ajudarem. A coisa tem que ser dita.
Z- Mas o pessoal da sua geração, o senhor pensa que ajuda o Luizinho, esse pessoal ?
CM- (indignado) Nunca vi ajudar ninguém, a não ser quer ver por trás dos panos Eliseu Fernandes, fotógrafo ninguém citou o nome dele ? Esse aí, coitadinho eles tinham como terceiro time, aqui ninguém se lembra do homem. O Eliseu é a única pessoa..
Z- Que o senhor viu ?
CM- Não, que eu vi não, que me falaram que o sindicato dava uma verba pra ele e ajudava. O resto, só servia pra cobrar mensalidade. Inclusive, tem outra coisa: eu fiz um filme fora da Boca e o diretor já falesceu. Deixa eu pensar e o Portioli que fotografou. O sindicato só serve pra te cobrar a mensalidade. Um dia eu cheguei no sindicato e eu não me recordo o nome da produtora nem nada, mas se eu vou me lembrar e faltando dois dias a produção chegou pra toda equipe e falou: “Olha eu não vou ter dinheiro pra pagar vocês”e falamos: “Como não vai ter dinheiro pra pagar nós, nosso salário ?” e responderam: “Só vou ter quando receber tal parcela, vocês podem terminar que não tem problema”. Aí terminamos o filme, passou-se um mês, dois meses, seis meses, um ano e bati na porta. “E aí meu, vocês de carro zero e eu andando a pé ? Como é que é ?” (risos), me responderam: “Não sabe, não recebi, não sei o que”. Fui no sindicato, se sabe o que o sindicato falou pra mim: “Mas é uma celebridade paulista como você quer que a gente acione o homem ?”. É um carequinha, até dava aula, um baixinho. Então como você vai acreditar no sindicato desses ? Não tem condições !
Z- Era crítico também ?
CM- Não dava aula na Faap, mas ele andava dando aulas, era uma pessoa assim que andou na mídia. Agora me fugiu o nome do homem. Mas eu vou me lembrar o nome dele, que eu fiquei com tanta raiva, que eu foi a única pessoa que foi no sindicato tentar receber. Aí eu fiquei sabendo isso daí: a pessoa com o dinheiro do filme comprou carro, comprou casa com piscina e não só eu como técnico fomos receber depois de dois anos. Teve pessoas que já tinham falescido quando foram receber, as esposas. Que nem o fotógrafo still, o Amaral que tinha falescido quando a esposa dele foi receber o cachê dele. Bom, é muita coisa ! Como é que nós vamos acreditar num sindicato ? (risos).
Z- O sindicato não fez nada e esse caso ficou debaixo dos panos ?
CM- Os caras não tem coragem de contar pô ! Eu to contando hoje porque não vivo mais disso (risos). Mas se eu vivesse não devia falar ou sei lá eu se devia falar também.
Z- Tem algum trabalho que o senhor se arrepende de ter feito ?
CM- Nenhum, nunca. Não tem esse trabalho, nem na Boca, nem fora da Boca. Que nem quando eu não me dava com o trabalho eu pegava: “Olha não to me dando bem e vou embora”. O filme do Fauzi Mansur...
Z- Mas a gente acha...
CM- Não, mas não vai constar porque eu larguei.
Z- É “O Inseto do Amor” ?
CM- “Inseto do Amor” esse mesmo ! Então, mas acontece o seguinte: eu na Boca e até hoje sou amigo do Fauzi. Se ver ele, eu aperto a mão, se abraça. Aí chegamos no hotel em Ilha Bela, a produção chamou nós dizendo o seguinte: “Olha, aqui na minha equipe ninguém toma cerveja, ninguém toma não sei o que”. Aí eu falei: “Durante o trabalho, acabou o trabalho não tem essa”. Aí mandaram um cara me vigiar pra ver se eu ia beber (risos), aí pus a garrafa de pinga em cima da mesa, aí o cara: “Oh grande não falei pra não beber ?” e eu respondi: “Você comprou o meu trabalho, não a minha pessoa. Estou num horário de expediente ?”, aí o cara: “Não, mas o Fauzi falou que não podia”. Falei com ele: “Manda o Fauzi a merda” (risos) Ora, eu sempre tenho a seguinte norma: você não vai beber sendo que no outro dia você tem uma obrigação a cumprir, sendo que essa obrigação tem cinqüenta, cem pessoas dependendo do seu trabalho. Agora pô, o cara me conhecendo, todo dia comigo. Todo dia no bom sentido, todo lá, sabendo da minha pessoa e como eu sou vai colocar um cara pra me vigiar. Eu não fazia o trabalho, precisava me tirar de São Paulo pra fazer o trabalho ? Aí mandei o diretor, mande ele, madei tudo as favas.
Z- Tem algum outro que o senhor abandonou ou só esse aí ?
CM- Não, só esse aí.
Z- Vamos falar um pouco dos filmes que o senhor fotografou: vamos falar do filme do Inácio. Como foi esse trabalho com ele ? Essa parceria com ele ? O Carlão me disse que ele que indicou o senhor.
CM- Depois de eu ter feito uns trabalhos com o Carlão, ele me apresentou o Inácio. E me apresentando o Inácio, ele me pediu: “Olha vamos trabalhar juntos. Você não quer fotografar o meu filme ?” e eu falei: “Por que não ? Vamos lá ! Não tem o que recusar”. Aí fizemos o trabalho, foi o primeiro trabalho que ele fez em cinema, o único que eu tenho conhecimento que ele fez e foi um filme muito bom, uma produção se não me falha a memória do Galante e foi um filme muito gostoso de ter sido feito pela compreensão dele, ele é uma pessoa calma, tranqüilo e tiramos esse trabalho de letra, nota dez. Fizemos rapidinho, se não me falha a memória dez dias, foi muito rápido uma passagem. Mas esses dias que trabalhamos juntos, foi muito prazeroso porque deu retorno e deu bilheteria e a bilheteria foi boa, não sei ao certo, mas foi boa.
Z- Mas tranqüilo mesmo sendo intelectual e tal ?
CM- Não teve problema, porque eu me adapto a todas as circunstâncias.
Z- Ele vinha da França na época né ?
CM- Ele era recém chegado de fora, não sei de onde, recém-chegado então ele estava meio se readaptando aqui ainda, mas foi um trabalho nota dez.
Z- Qual foi a produção que o senhor trabalhou que menos teve dinheiro ?
CM- Da Embrapi (risos).
Z- O do Amado Batista, por exemplo ?
CM- O Amado Batista foi um filme em que o Jean Garret descobriu o Amado Batista, ele tava na crista da onda e fazendo um puta dum sucesso e o Jean com a visão de empreendedor que ele tinha, o convidou pra fazer um filme. O Toninho Meliande que dirigiu. O dinheiro era muito curto, os exibidores não quiseram dar dinheiro pra nós porque não sabiam o que ia acontecer e não tinha locação, foi um filme feito assim de um dia pro outro.
Z- Uma parte foi filmada em Goiânia né ?
CM- Uma parte foi filmada na minha casa (risos). Não tinha locação e precisando de uma sala assim, assado e o diretor de produção, também outro que eu não vou lembrar o nome já tinha me levado em casa, aquela coisa toda e ele se tocou que a sala que ele precisava era igual a minha. Aí é que entra as coisas: eu fui fazer um filme com toda aquela gente o que eu ia fazer ? Tirar a minha mulher de casa. Como vou fazer isso ? Vou mandar ela pra onde ? Pra rua ? (risos). Aí digo: “Sandra, vamos fazer uma coisa: não tá querendo viajar, pega o Tatá e vai viajar, vai pra praia e vê onde você quer ir”. Dei um dinheirinho que eu tinha ganhado, essa coisa toda e forcei ela a sair. A mulher muito esperta, o que ela vez ?. Ela foi no primeiro dia e no segundo ela já voltou pô ! (risos). Aí quando chegou, a produção toda em casa aquela parafernália toda, o equipamento.
Z- E ela não sabia que ia filmar lá ?
CM- Sabia nada (risos), eu não tinha falado nada. Mas ela foi nota dez: chegou no portão e perguntou: “O que está acontecendo ?” e responderam: “Nós estamos fazendo um filme, aquela coisa e tal” e ela falou: “Fala pro Concórdio me buscar na casa da minha mãe quando ele resolver” (risos). Então, ela saiu terminamos o filme e depois eu fui buscar ela.
Z- O senhor foi assistente ?
CM- Eu não sei se fui assistente ou se fotografei eu só sei que o Toninho dirigiu.
Z- E o Conrado foi assistente de direção.
CM- Então eu fotografei. Essas informações que você tem aí, o Mário Vaz Filho tem um amigo que fazia uns livros só sobre filmes nacionais com ficha técnica e tudo. Ele era lá de Santos.
Z- O Araken ! Ele ainda tá vivo ?
CM- Araken. Não sei. Ele tinha a ficha técnica de todos os filmes feitos até 90 ou 90 poucos.
Z- Mas tem uns erros também, e foi lançado um recente que tem mais informações e que uso que é dum cara do Ipiranga que se chama Antônio Leão da Silva Neto. Ele fez o “Dicionário de Filmes Brasileiros-Longa Metragem”. Mas o senhor trabalhou em quantos filmes ?
CM- Eu devo ter participado de uns 60 longa-metragens. Eu era uma pessoa que fazia cinco ou seis filmes por ano de longa-metragem, saia de um e ia para outro. Eram raros os anos em que vivi só de longa-metragem em que eu não fazia isso. Então, se eu fiz dez anos de cinema e um pelo outro eu fiz cinco, são cinqüenta com certeza. Mas eu fiz mais.
Z- E o Jean o senhor foi amigo pessoal ?
CM- Amicíssimo, amicíssimo do Jean.
Z- Ele foi casado ?
CM- Foi casado, com dois filhos. Ele morava na Bela Vista com os filhos, ele como pai não deixou faltar nada, mas zoeira fora de casa é como qualquer um de nós (risos). Mas como pai, foi um pai que sempre compareceu, mas agora fora nos trabalhos da Boca...Ele se apaixonava fácil (risos). O Jean, na realidade ele morreu por causa de um acidente ou sei lá o que com a Angelina Muniz. Você sabe dessa história ? Já te contaram ?
Z- Não. E a Angelina Muniz nos anos 80 era uma das mulheres mais desejadas do país.
CM- Ela fazia e fez quase todos os filmes dele naquela época. E os dois se curtiam, aquela coisa toda. E ela tinha um amante, um cara que patrocinava ela e ela morava no terceiro andar de um prédio na Gávea.
Z- Ela tinha um bar na Rua Augusta né ?
CM- Isso eu não sei. E o Jean foi pro Rio e tava no apartamento e o Jean pulou do terceiro andar e as pernas dele entraram pra dentro, operou e tudo mais. Porque o Jean tinha uma saúde muito boa.
Z- Ele tinha um tipo atlético.
CM- É ele tinha uma saúde que não sei se foi jogado, o que aconteceu.
Z- A moça traiu ele e ele ficou meio triste ?
CM- Não, eu acho que ele tava com ela e chegou o outro. Eu acredito que ele não tenha perdido a cabeça não e a saúde começou a complicar e ele veio parar no Teatro Brigadeiro. E ele veio a administrar o teatro porque não podia mais andar e deu assim um troço nele, porque ele morreu e bateu num poste.
Z- Ele morreu novo ?
CM- Eu estou com 60...Ele tinha a mesma idade, faz 10, 12 anos...Morreu com uns cinqüenta anos. Mas mesmo assim ele tinha a minha idade e foi uma pena, morreu cedo. Pela capacidade dos projetos dele.
Z- Ele queria voltar a dirigir ou o senhor não sabe ?
CM- Ele nunca tinha largado da ambição e os projetos que ele fazia, uns projetos muito loucos, muito ambiciosos. Ele era um empreendedor, um cara que sempre olhava pra frente;
Z- Ele trabalhou muito com o Inácio nos anos 80 ?
CM- Ele escrevia junto com ele.

Z- E com o Cláudio Cunha ?
CM- Eu fiz uns cinco ou seis trabalhos com ele.
Z- Ele produzia legal ?
CM- Era outro que não deixava faltar nada. E ele buscava recursos e os filmes davam bilheteria. Respeitava os técnicos.
Z- Desses da Boca todos respeitavam os técnicos ? Não teve nenhum que foi mais imprudente ?
CM- Eu a pouco acabei de falar, não tem o que não respeitar porque se não respeita a pessoa pega a cueca e vai embora. Não tem essa de ficar porque eu vim e fui obrigado a ficar. E na época existia trabalho, não é como hoje. E hoje mesmo se a pessoa tiver nome e saber fazer não falta trabalho.
Z- E essa experiência com o “Cangaceiro” do Aníbal Massaini ?
CM- Não tava querendo ir, eu sabia que eu ia pegar uma bucha. Uma equipe que é problemática, afinal você sair de São Paulo e ir trabalhar. Com figuração só, eles tiveram lá todos os dias mais de 200 pessoas. Bem diferente de trabalhar com 50 pessoas e desde o início era pra mim fazer. “Pra você fazer, pra você fazer” e tá bom e fui lá acertar e eu pedi um salário que eu achava que tinha de pedir. Aí me falaram: “Você é doido, nem o fotógrafo está ganhando isso” (risos), aí eu falei: “Mas eu quero lá saber o que o fotógrafo tá ganhando ? Eu nem perguntei pra você quanto ele tá ganhando”. Aí falaram que eu era doido e que eu já tinha um outro projeto em vista e quem ia fotografar era o Portioli. Eu não podia falar pro Portioli: “Eu não vou, porque eu tenho outro projeto”. Porra, era um chegar lá e assinar o contrato desse outro projeto e ficava aqui em São Paulo do lado dos meus filhos e da minha família. Aí eu pedi e falei: “Se quiserem me levar que levem, se não quiserem eu vou ficar e já vou fazer esse outro”. Então, eu levantei e falei pega outro, pega outro. Levantei e fui embora e a primeira etapa foi feita pelo Luizinho.
Z- O Luizinho ainda é mecânico ?
CM- Não ! Magina. Ele trabalha numa firma de publicidade nas Nações Unidas. Vai ser difícil de eu pegar porque é o seguinte: eu preciso pegar um dia e sair rapaz, pelo menos pra rever os amigos. A única coisa que eu sei te dizer é o seguinte: quem te pode dar o endereço dele ? Você tem o telefone do cara do Morumbi que aluga câmera ?O nome dele é Waldir, o nome da firma dele e quem toma conta é o Paulinho. A Central o nome da firma que loca câmera, e equipamentos de câmera. Porque os caras só locam equipamentos e eles tem o telefone de todo mundo. Se procurar o meu lá, o da minha casa, eles tem lá. E aí as câmeras e o equipamento só saí com cara que eles conhecem. O cara que tem referência, porque eles não deixam sair não. Por isso que eu estou falando e o Luizinho, pelo que sei ele mora nos Campos Elíseos. Há um ano e pouco atrás, fiquei tão puto fui fazer um trabalho e o cara me deu um chapéu: não me pagou. Peguei tudo que eu tinha e joguei tudo fora. Então, por isso que eu não tenho telefones dessa gente toda. Lá que eu tinha tudo, mas lá você consegue.
Z- E lá tem de todo mundo que mexe com fotografia ?
CM- Tem de todo mundo. Pelo menos se tá na ativa e tá vivo. Mas eu é capaz deles darem como morto já (risos). Quando você ligou e falou com a minha esposa, eu até achei estranho (risos).
Z- É que eu consegui com o Conrado...
CM- Pelo Conrado porque nós viemos trabalhando juntos.
Z- Eu pedi de uma série de pessoas e ele foi me ditando.
CM- Que nem assim: um vai puxando o outro e assim você vai indo longe.
Z- Como que era o Luizinho como assistente ? Por que nos três filmes que o senhor fotografou ele foi seu assistente.
CM- Muito bom. Talvez ele era melhor que eu. Porque ele zelava, zelava muito pelo equipamento aquela coisa toda e eu era mais relaxado. Não que eu largava, aquela coisa toda mas eu nunca fui assim tão minuncioso. Eu na hora que eu fazia, não tinha o que puxar esse fato: tinha que fazer na hora. O Luizinho não, ele já se dedicava dia e noite a aquilo lá. Mas eu não, eu fazia meu trabalho e colocava a etiqueta, fazia boletim aquela coisa toda e pra mim o trabalho estava feito. E ele não, terminava a filmagem e enquanto não terminava de mixar e fazer a manutenção ele não parava. Mas não era somente nesse ponto, o Luizinho tinha outra vantagem que eu não tinha: ele nunca foi de beber cerveja, nunca foi de beber nada. E eu já tomava.
Z- O Gyula o senhor sabe ?
CM- Não, o Gyula nunca foi de beber nunca foi de ficar até muito tarde, coisa pra mim que era muito diferente.
Z- Como era a relação da criminalidade, da malandragem com o pessoal de cinema ? Como que era ?
CM- Zero. Não tinha problema porque eu não sei se nós éramos muito conhecidos e respeitados, mas nunca mexeram com nós nada, nada.
Z- O senhor ia de carro ? Trancava o carro ?
CM- Ia de carro, ia de ônibus que na época e não tinha problema nenhum. Eu só tive problema uma vez na Boca que a polícia pediu meus documentos e dentro dos meus documentos tinha dinheiro e eles queriam (risos). E esse dia se as pessoas não tivessem me visto, eu teria passar um mal-bocado. Porque foi a polícia a paisana e quando colocaram o dinheiro com os documentos no bolso e eu peguei os documentos. E o cara começou a bater e eu peguei e fui lá também. Aí foi um banzé, me levaram pra delegacia e me deixaram lá. A minha sorte foi que o Jayme Monjardim e o pessoal do meio me viu e correu na delegacia, senão eu não sei o que ia acontecer.
Z- E o Jayme: como foi pro senhor trabalhar com ele ?
CM- Tranqüilo, gente fina. Só que quando tava na Boca, sabe meu contato da Boca, da Bela Vista sempre uma pessoa que cumpriu com todos os seus deveres. Depois, que passou pra Globo nós perdemos o contato.
Z- O senhor achar ele aí ?
CM- Ele vai ficar muito feliz e eu também.
Z- O senhor viu “Olga” ? O que achou do filme ?
CM- Vi. Olha, eu sinceramente esperava mais.
Z- Dos diretores da Boca, tinha algum que o senhor preferia ?
CM- Não, não tinha preferência assim não por A, B ou C. Quando se trabalhava com diretor de fotografia, enfim cada um tinha o seu estilo de fazer o trabalho. O Carlão, por exemplo gostava muito de usar a lã de vidro e o pessoal da pesada que trabalhava comigo detestava isso. Porque aquilo pica, hoje não, hoje tem um monte de produtos que não prejudicam a saúde e o Carlão dirigindo aquela coisa, picava aquela coisa toda. Mas a fotografia do Carlão ficava muito boa e aí que entra a coisa: hoje você não precisa da lã de vidro, você não precisa da luz elétrica. Você usa filtros e dá o efeito da lã de vidro. Então, era a falta de equipamento da época, então se usasse ou se passava a se usar determinados produtos que não era para aquela finalidade, acabava adequando ao trabalho.
Z- Mas com a lã de vidro as mulheres ficavam mais bonitas ?
CM- Ficava mais suave, a pele ficava suave.
Z- O Portioli usava essa técnica ?
CM- O Portioli já recortava a luz. Essa lã de vidro o que acontece: ela espalha e o Portioli era mais de recortar. Então, são dois estilos diferentes de fotografia.
Z- O Toninho Meliande o senhor chegou a trabalhar com ele ?
CM- Sim.
Z- E como era o estilo dele ?
CM- Expressinho. Com ele não tinha enrolação: “Põe a luz aqui, uma luz aqui e ali na câmera e uma de continuidade. Com o Meliande, lavava tudo e pronto.
Z- Um grande fotógrafo ele também...
CM- Aí é que tá ! Depende do trabalho que a pessoa tá fazendo. Depende do dinheiro que a produção tem. Eu fiz dois ou três longa-metragens com o Toninho fora da Boca. Não me pergunte o nome não, porque eu não vou lembrar o nome. Mas eu fotografei sempre assim. Inclusive foi uma menina que era atriz e agora é produtora. Ela mora no Rio de Janeiro e tá colocando dinheiro.
Z- A Carla Camurati ?
CM- A Carla Camurati ! Ela era atriz nesse filme e esse filme não foi feito na Boca. Ela sendo atriz e o Toninho fotografando.
Z- Dá pra achar seu Concórdio. O Toninho fotografou mais de 100 filmes...Ele fotografou explícito inclusive...
CM- Com o Toninho o que caia na rede era peixe.
Z- (risos) Então ele não negava trabalho ?
CM- Não negava trabalho. Precisava trabalhar e acabou.
Z- Como era o estilo do Osvaldo Carcaça ? O senhor chegou a conhecer ele ?
CM- Não cheguei a ver nada dele não. Mas normalmente, tudo era feito no estilo do Toninho porque tirando assim alguns diretores bons de fotografia...
Z- O Ciambra, por exemplo ?
CM- Bem picareta. Metido a intelectual.
Z- Ele é amigo do Máximo Barro ?
CM- Eu não sei. Eu vi ele na praia, mas até um ficou olhando pro outro e acabamos nos reconhecendo.
Z- (risos) Que episódio engraçado. Mas ele não era bom fotógrafo ?
CM- Não.
Z- E o Henrique Borges ?
CM- Não. O Henrique tá no Ipiranga, tem uma agência de modelos. Na verdade, a agência de modelos quem toma conta é a mulher dele, mas tá bem também.
Z- Sei somente pela lista...Ele tem uma longa filmografia. O senhor chegou a trabalhar com ele ?
CM- Acho que eu também fui assistente dele. Também fui. Dando dinheiro não tinha problema não (risos).
Z- E era complicado pra trabalhar com ele ?
CM- O Henrique Borges não. Ele é assim: se ele sabe que você tem capacidade pra fazer e você faz junto com ele, ele te respeita. Se não tiver, tá fudido.
Z- Desses fotógrafos todos da Boca que o senhor trabalhou quem o senhor considera o melhor ? O Portioli ou o Carlão ?
CM- Os dois: o Portioli e o Carlão.
Z- E o Toninho Meliande ?
CM- Água com açúcar.
Z- Com o Walter Hugo Khouri o senhor nunca trabalhou ?
CM- Trabalhei.
Z- (surpreso) Em qual ?
CM- Não sei. Era o Miro, mas eu fiz sim. Acho que nenhum, deve ter sido metade. O Toninho tava fotografando. Fui muito assistente de câmera e fiz diversos filmes em que o Meliande era fotógrafo.
Z- E o senhor gostou ?
CM- Claro. O italiano é bem sossegado, só que ele é como eu estou te dizendo: muito rápido. O Toninho chegou a fazer longa-metragem em dez dias. Aí começa a desmerecer todos os trabalhos de todo mundo e começa a meter pau e faz de qualquer jeito, acabou. Agora, os fotógrafos que realmente eram bons lá da Boca é esses dois: o Portioli e o Carlão. Mas isso no colorido, porque preto-e-branco nenhum dos dois, nenhum dos que nós falamos, nem eu e da Boca nenhum.
Z- Só os da Vera Cruz ?
CM- É. Porque é outra técnica.
Z- Hoje em dia, não tem nenhum fotógrafo bom pra preto-e-branco na opinião do senhor ?
CM- Não existe, não tem mais. Uma que a luz é totalmente diferente, a técnica de fotografar é diferente pra dar um brilho e pra aparecer. Então, é muito complicado e hoje tá todo mundo usando colorido, colorido e vamos empastelar tudo que tá tudo certo.
Z- E como que foi trabalhar no filme do Conrado, “A Menina e o Estuprador” que foi o único longa que o senhor fotografou. Ele me disse que só ganhou essa chance pra dirigir porque o Galante não achou ninguém mais barato.
CM- Com certeza. Tanto pra ele quanto pra mim, porque estavam leiloando os trabalhos e só tinha essa verba e eu acredito que ninguém quis fazer. Porque não tinha travelling, não tinha luz, não tinha nada. Não sei se o Conrado te falou que os travellings a gente fazia com uma mão em cima de uma três tabela e eu com a câmera na mão. Ele chegou a te falar isso ?
Z- Não seu Concórdio, mas eu soube que a equipe cabia numa Kombi.
CM- Numa Kombi. Era o Conrado, eu, o Luizinho e...o eletricista era outro Luizinho de Campinas. Então, na verdade eram seis ou sete caras só: cabíamos numa Kombi. E foi filmado na Avenida São João num puteiro que tem lá.
Z- (assustado) Num puteiro ??
CM- Num puteiro. Na São João, enfim.
Z- Mas o Conrado me falou que foi gravado na represa Guarapiranga, pelo menos umas cenas de praia.
CM- Tinha as cenas de praia. Mas a maioria do filme foi feito na São João, quase todo num apartamento que era de um senhor que tinha umas menininhas lá que...Só não tinha a luzinha vermelha, mas...Aquilo lá era puteiro. O apartamento foi aqui. A luz tinha que ser baixinha, porque tinha ação deles andarem e a câmera andando, aquilo foi tudo feito no arroz com feijão. E deu uma puta duma grana e pra nós não projeção por causa do bom esconderijo, nós não se mostramos. Porque se a gente decidir mostrar, a coisa ia ser outra. Como técnico, não era vou pegar a cópia e falar: “Fiz isso aqui, eu quero fazer outra”.Você esconde.
Z- E o Zózimo Bulbul como foi trabalhar com ele ?
CM- O Zózimo é uma pessoa do cacete. O negão lá é muito bom. Intelectualmente, ele era muito culto. Ele tá vivo ?
Z- Tá vivo sim. Já tá meio velhinho, mas tá vivo sim.
CM- Mas eu acho isso legal.
Z- Tem uma história curiosa que o Zózimo levou o filme pro Candeias e ele achou uma droga e disse na cara do Zózimo. E ele ficou arrasado...
CM- Mas não pode. Se fosse ao contrário ele ia gostar ? Não tem jeito, por pior que for o trabalho ele deve falar: “Tem que melhorar, tem que fazer”, mas não desprezar o trabalho do outro. Aí é complicado. Mas todas essas passagens de trabalho, tem umas histórias que na verdade a gente não pode contar.
Z- Que tipo de história ?
CM-Tem umas histórias de diretor, não de fotografia: diretor de filme. Que não tem condições nenhuma de falar. Não tem qualificação e o cara acaba dirigindo, pegando dinheiro essa coisa toda. Mas não tem qualificação. Qualificação é zero.
Z- O senhor trabalhou em filmes assim ?
CM- Muitos. Teve um que nem foi lançado, nem nada e eu até vou contar o dinheiro era de um médico da Santa Casa. E queria fazer um bangue-bangue, mas bangue-bangue nacional ? Aí me convidaram pra fazer o filme. Eu falei: “Faroeste você é louco, tão malucos. Arruma outro cara”. Mas passou o tempo e vieram de novo com a proposta pra terminar o filme. Falei: “Deixa eu ver o que vocês fizeram, vamos terminar o filme, já que vocês tem dinheiro pra terminar: vamos lá”. O diretor depois de um dia que eu tava lá estava com a arma, pôs no dedo e puxou gatilho. Tinha bala de verdade e o dedo do cara voou. O diretor meu ! Pô, peguei minha mala e me mandei.
Z- Que ano foi isso seu Concórdio ?
CM- Não sei.
Z- Mas não era do Tony Vieira não ?
CM- Não.
Z- A produção era de algum produtor conhecido tipo o Galante ?
CM- Não. A produção era desse cara famoso, médico dum hospital. Porra, médico uma opção boa (risos) e foi pior que os da Boca. E o cara, faz uns anos aí e eu me encontrei com esse cara, com esse tal diretor e o dedo dele tá faltando (risos). Aí eu falei: “Você foi se meter a diretor viu o que aconteceu”. Um outro, eu vou contar um negócio: você sabe a banda de música ?
Z- Satisfaction ?
CM- Não, aquelas bandas antigas: trombone. Banda de praça.
Z- Banda marcial.
CM- O maestro fica de costas pro músico ou de costas ?
Z- Que eu saiba fica de frente.
CM- Bom, ele me colocou o maestro de costas pros músicos. E o cara é vivo ! O cara é intelectual, só me falta o nome.
Z- Mas o senhor não pode falar o nome ?
CM- Não, ele vai mandar me prender (risos).
Z- E o fotógrafo desse filme o senhor pode me dizer ?
CM- Mas aí eu dou a dica (risos). Mas piada o negócio.
Z- Nos filmes da Boca, o fotógrafo era o câmera mesmo ?
CM- Era o câmera mesmo. Era o fotógrafo que fazia a câmera, tinha o assistente, o eletricista, o maquinista, o primeiro eletricista, segundo eletricista, still, maquiador...
Z- Mas esse filme que o senhor fez com o Conrado, por exemplo não tinha isso tudo ?
CM- Tinha o eletricista que era o Zezinho e um ajudante. Três panos verdes, quatro refletorzinhos e vamos fazer.
Z- A produtora que o senhor teve com o Máximo Barro durou quanto tempo ?
CM- Sete anos, oito anos.
Z- Quando vocês tiveram ?
CM- De 80 pra cá.
Z- Fazia o que ?
CM- Só curtas-metragens. E nem filmes comerciais o Máximo queria fazer, porque dizia que estava se prostituindo. E na realidade nós acabamos essa firma por causa disso. Porra, onde dava dinheiro o homem não queria fazer. Ele só queria curtas e filmes institucionais, aí quebrou. Porque foi aquela minha transação entre aqui no Bexiga que era intelectual e a Boca do Lixo, onde os caras eram pé rapados. Então, foi aquela minha transação: vou pra Boca e vou fazer o que eu gosto. Aí me debandei e acabamos com a firma. Mas antes disso aí eu ainda tive uma outra firma com ele, se chamava Grupo Quatro. Era eu, o Máximo, o Jordão e o Barbieri. Eram os quatro funcionários que a Jaraguá Filmes tinha. Então cada nota nós tivemos essa firma. Na verdade foi uma firma imposta já nessa época que éramos tercerizados, não tinha jeito já éramos tercerizados (risos).
Z- O senhor conheceu o Jairo Ferreira ? Como ele era ?
CM- Sim. Eu tive muito contato com ele na Boca, fora do estúdio mas era uma figura. Uma pessoa adorável.
Z- Fala um pouco como era ser assistente de uma pessoa como o Carlão.
CM- Como é que uma pessoa que tem um óculos de fundo de garrafa fazia câmera ? Vocês sabem o que nós tínhamos de fazer pra ele fazer câmera ? Aí ele colocava o olho no visor e você tinha de chegar com um pano preto pra encapar a cabeça dele, senão ele não via o filme no visor. Tinha de colocar uma capa, uma armadura no homem. Ele ainda faz câmera ?
Z- Não, seu Concórdio. O último filme dele que ele fez fotografia foi “Alma Corsária” em 1993.
CM- Ele tá produzindo ele e a...menina lá
Z- A Sara Silvera ?
CM- É.
Z- Sim. Mas ele não fotografa mais os próprios filmes.
CM- É que é assim: as pessoas que projetam os semelhantes e depois ficam desvalorizados. Porque quem projetou a Sara, quem projetou o Carlão, quem projetou um monte de gente aí foi a Boca. E depois o pessoal que acompanhava não tem mais valor, não presta mais. É complicado isso. Pro próprio diretor e pra quem tem voz ativa. Que nem, o Carlão tem a voz ativa nos trabalhos dele. O Guilherme tem voz ativa nos trabalhos dele.
Z- Mas o Guilherme teve uma grande parceria com o Portioli...
CM- Não, mas isso quando estava precisando. Porque no último trabalho dele vê se ele deu pro Cláudio fotografar. Nesse que o Portioli foi terminar o filme pra ele. Quem começou a fotografar ? Foi uma outra pessoa e o Cláudio que foi terminar e aí chamou ele: “Vem cá”, essa coisa toda. Então, essas coisas se você pegar uma outra pessoa, tudo bem beleza vai fazer outro estilo, vamos fazer de outra forma. No meio do caminho, se desentendem depois sobra pro antigo colaborador...
Z- Ainda sobre o Portioli: o senhor acha que ele ficou muito preso a Boca ? Que ele podia ser mais reconhecido ?
CM- Com certeza ele foi injustiçado. Agora por outro lado o que acontece: quem não se mostra, não aparece. E tanto o Cláudio como eu, enfim o pessoal da Boca era um pessoal de não fazer alarde. De não falar: “Estou vivo, sei fazer”, contatos e essa coisa toda. Talvez se ele tivesse feito isso daí, com certeza ele tinha ganho o prêmio que ele merecia. Isso daí, uma das deficiências do pessoal da Boca é exatamente não se mostrar e não gritar: “Olha eu sei fazer, eu sou bom e acabou”.

Z- O senhor acha que por isso esse pessoal da geração do senhor acabou prejudicado ?
CM- Nós mesmos acabamos nos prejudicando. Não é que foram prejudicados, nós nos prejudicamos. Se você pegar o pessoal do Rio que fazem pior que nós aqui ganharam prêmio, levantaram bandeira aquela coisa toda. Nós não: nós se aquetamos e acabamos por não ganhar nada. Só ganhamos trabalho e ainda pedindo pelo amor de Deus pra trabalhar (risos). Mas isso é deficiência nossa. Eu estou te falando isso daí porque hoje eu vejo a coisa dessa forma. Porque não tinha ninguém que pegasse: “Olha, vocês tem que gritar vocês tem que fazer curso, se reunir”. O que acontece ? Se isola não ganha e fica sem trabalho. Mas eu tenho uma mágoa, uma determinada mágoa. O Carlão depois que foi projetado não me chamou mais. O Guilherme não me chamou mais depois do “Perfume de Gardênia” e de outros também.
Z- O senhor tem uma mágoa então ?
CM- Com certeza tenho. Porque se o cara começou debaixo e de repente o cara cresce e tá no auge você não presta mais porque ficou velho ? Ou você não presta mais ? Até ontem você sabia e hoje você não sabe mais. E outras pessoas que não te conhecem acaba te oferecendo trabalho e vão fazer. Mas tem essa coisa. Vou citar mais um: o próprio Jaiminho. Eu fiz nada mais, nada menos que uns vinte trabalhos com o Jaiminho. E quando ele foi pra Globo cadê o Concórdio ? O Concórdio ficou parado numa loja (risos). E por falar em loja, ainda vou acrescentar uma coisa: sou muito mais feliz hoje do que quando eu trabalhava com longa-metragem, arte, essas coisas todas. Você sabe porque ? Eu vou te contar o porque: porque eu não preciso correr atrás de dinheiro porque preciso pagar a escola dos moleques. Não que eu ganhei dinheiro, mas porque eu tenho uma projeção de dinheiro pra mim pagar minhas contas durante o mês. E filmagem você não tem estabilidade. Então, estou mais velho mas estou mais feliz. Entendeu ? Porque mão-de-obra nesse país é muito complicado. Talvez, se eu tivesse a vivência que eu tenho hoje há 20, 30 anos atrás a história seria completamente outra. A minha história é bonita. Imagina a dos outros, aí que começa.
Z- O senhor se sente injustiçado ?
CM- Não.
Z- Mas mágoa...
CM- Tenho, exatamente porque quando você começa com a pessoa, aquela coisa toda você não precisa ser lembrado em todos os trabalhos, mas pelo menos ser lembrado uma vez. Que nem você , tá fazendo um trabalho de jornalismo, bonitinho eu não sei se é pra você quem é o dono da revista...
Z- Não seu Conca, sou eu mesmo..,
CM- Que ótimo ! Então você não tem que dar satisfação a ninguém. Então, beleza você não tem que dar satisfação a ninguém mas quando você presta serviço você tem que dar satisfação e muita. Que nem esse trabalho que eu fui fazer no sábado a primeira coisa que eu cheguei lá a pessoa que me contratou me disse: “Concórdio...Eu te contratei você sabe pra que ?” e eu falei: “Sei, claro que sei senão você não tinha me enchido tanto o saco pra me levar” (risos). Aí ele falou assim: “Meus parabéns”. Aí ele começou a olhar, olhar, olhar e falou assim: “Bom de primeiro você trabalhava com copião e agora ?” e eu respondi: “Agora trabalho no olho com fotômetro”. Ele deve ter pensado: “Filho da puta !” (risos). Falei: “Pode deixar, amanhã lá no hotel na hora de assinar nós vamos colocar o papel”. Eu não tinha levado, mas ás vezes a gente faz determinadas coisas que acaba dando certo. Chegou um pessoal aqui de São Paulo da Record e o que o cara fez: o cara com um fotômetro na mão. Aí eu falei: “Oh amigo, vem cá comigo sobe no palco aqui. Me empresta isso aqui”. O que tava errado eu já corrigi e acabei fazendo o trabalho. Depois eu falei com o cara que me contratou: “Você falou que eu não trouxe, olha aqui”. Mas acabei com ele.
Z- O senhor com tantos trabalhos, prefere ser lojista ?
CM- Não esquece o que eu vivi com tantos anos vivendo na Boca mas se for uns três ou quatro dias tá de bom tamanho, não pode demorar muito também não. Trabalho de três, quatro dias no máximo. O próprio compromisso que eu assumi é um negócio novo, mas os compromissos são enormes. Um negócio que não dá pra você calcular...
Z- O senhor sente nostalgia da Boca ? Saudades ?
CM- Tenho do jeito que ela era, não do jeito que ela é. Do jeito que ela era: agitação, as condições, pessoal saindo pra filmar, fotografando aí eu tenho sim. Não é a mesma coisa no vídeo, se eu quisesse trabalhar com vídeo eu trabalhava onde eu quiser e com um puta dum salário. Mas não me satisfaz, não é a mesma coisa. Eu fui da Boca, e de vídeo eu conheço quase tudo, porque a gente nunca conhece tudo.
Z- O senhor conhece mais vídeo que preto-e-branco ?
CM- Claro. Eu numa firma que eu trabalhei eu fazia todos os comerciais até que um dia eu falei: “Eu não vou fazer mais não”. Porque a dona era assim: “Era isso aqui que eu quero: você abre a câmera no monitor, imprimiu e acabou”. Sabe duma coisa, com pessoa assim é melhor não trabalhar. O que adianta me contratar e fazer do jeito que ela quer ? Então, eu prefiro ficar onde eu estou. Com a preocupação do boleto e de quanto eu vou pagar amanhã e se não vender onde eu vou arrumar esse dinheiro pra poder pagar minhas obrigações. Pô, tem conta pra pagar todo dia e conta alta...Pra você ter uma idéia é o seguinte: não tem objeto lá dentro por menos de R$ 100,00. Voc~e tem que ficar preocupado mesmo.
Z- O senhor sempre morou em São Paulo seu Concórdio ?
CM- Sempre.
Z- Mas o senhor é natural de onde ?
CM- Eu nasci na Itália. Eu vim com seis anos pro Brasil, de Salermo.
Z- Os pais do senhor são italianos ?
CM- Todos italianos.
Z- A mãe do senhor está viva inclusive ?
CM- A minha mãe tá viva.
Z- Porque eu liguei pra casa do senhor e o seu filho me disse que o senhor tava na casa dela...
CM- A minha mãe fez 84 anos. A minha história pra chegar aqui no Brasil foi outra história muito gozada. O meu pai após a guerra veio embora pro Brasil. Era assim: quem ia pra Argentina, trabalhava e voltava. Quem ia pro Brasil depois da ida, não saia mais daqui. Meu pai saiu e deixou eu e duas irmãs. A caçula com dezesseis dias. Depois de um ano e meio, surgiu imigração pro Brasil e o meu pai já tava aqui. Então ele falou pra minha mãe: “Olha, vai no Consulado que tem um jeito de você vir pra cá porque eu não vou voltar mais. Tem trabalho, tem terra e tudo. Um país maravilhoso”. Aí minha mãe foi lá, fez os papéis aquela coisa toda e conseguimos fim como imigrantes, sem pagar passagens nem nada. E a primeira parada saindo da Itália foi em Recife. A minha mãe passando mal, mas muito mal. Aí o que eu faço: eu subo no convés. Eu nunca tinha visto um negro na minha vista, com seis anos. Rapaz ! Eu desci aquelas escadas lá pulando e gritando que nem ! (risos) E depois eu me tornei na juventude, me tornei amigo de todos: branco, negro, cor de rosa, marrom. Então, eu tomei um baque muito grande: “Onde é que eu vou ?” não sabia falar nem o italiano e nem o português. Mas então são umas coisas que marcam a gente. E eu fui o único da minha casa que não voltei mais: minha mãe voltou, meu pai voltou. Eu não quis porque o meu pai quando voltou na hora de se despedir teve um enfarte o coração. Aí meu pai, querendo morrer aqui no Brasil. Conclusão: não sei por qual cargas da água ou se foi milagre ele ficou sessenta e tantos dias estirado numa cama. Colocaram ele com cama e tudo da Itália pro Brasil e trouxeram ele pra cá com médico e tudo. A primeira operação aqui no Brasil foi o meu pai. E depois da operação, ele ficou setenta dias, os médicos não deixaram ver. Eu tinha uns 30 anos, na época. Essa foi uma das passagens. A minha mãe foi e não deu esse problema, mas deu outro que ela quase fica também. Eu falei: “Pra que eu vou ?”: já sou brasileiro e pronto.
Z- O que ele o pai do senhor fazia ?
CM- Ele era comerciante, teve mercearia, bar, lanchonete. Foi de tudo.
Z- E o que ele achava do senhor ir pra área de cinema ?
CM- Ele achava meio estranho por causa das viagens. Mas meu pai e minha mãe sempre incentivaram.
Z- Mesmo sendo pornochanchada nunca teve nenhum problema ?
CM- Nenhum, nenhum. Muito pelo contrário: eles incentivavam: “Se você gosta Concórdio, faça”. E eles falavam que os filhos eram do mundo e então, se sou do mundo eu vou embora, vamos pra frente. Nunca se opuseram, nada. E os meus também, se eles quiserem fazer não tem problema nenhum (risos), se bom que pegaram um rumo diferente.
Z- O senhor sempre gostou de cinema ?
CM- Não, eu caí de pára-quedas e depois me apaixonei.
Z- O senhor mexia de algum jeito com fotografia ou câmera ?
CM- Não.
Z- Mas antes do senhor entrar, o senhor acompanhava ?
CM- Não. Eu sou formado em desenho mecânico, em eletrotécnica, em tudo menos cinema. Tenho quatro, cinco diplomas menos cinema. Então, eu aprendi no dia-a-dia nas condições da Boca. A coisa mais difícil na área pra se fazer é o croma, e foi um desafio pra mim fazer nessa Jorge Henrique que eu só fotografava croma e precisava de um cara pra fotografar. Eu larguei de tudo, comprei um equipamento e fui fotografar. Depois de um ano você nem imagina o que eu falei pro cara: “Olha tá aí o equipamento que eu não quero mais”. Depois que você vence o desafio não tem mais graça. O cinema é um negócio que te desafia, você sempre tem tudo aquilo diferente do outro: sempre, sempre.
Z- O senhor mantém contato com a viúva do Portioli ?
CM- O contato se não era diário era semanal e agora é esporádico. Mesmo porque as minhas atividades são outras: ela leciona do Dom Bosco. Não sei em que área.
Z- Ele morreu do que ?
CM- Ele tinha pressão alta.
Z- Ele morreu e deram uma notinha no jornal somente...O cara fotografa 50 filmes e vira notinha...
CM- Mas isso daí: morreu já não presta mais, já cumpriu a missão.
Z- Ele sempre usou bigode ?
CM- Sempre, sempre. Ele chegou a trabalhar no Mazzaropi. No primeiro trabalho que ele fez foi com o Mazza em cinema e ele veio do interior de São Paulo, não sei a cidade e de lá pra cá ele foi um bom maquinista. Ele veio de baixo: batalha ali, batalha aqui e se aperfeiçoou. Até que tava perfeito, mas não tava mais vivo (emocionado) uma pena mesmo.
Z- Foi o melhor amigo do senhor na Boca ?
CM- Todos foram meus amigos. O que eu tinha mais afinidade, o que mais trabalhamos juntos.
Z- A esposa do senhor era amiga da esposa dele ?
CM- Sim, amicíssima. É uma perda muito grande. A única certeza que a gente tem é a morte, mas a gente não aceita ela. Fica meio receoso, mas vamos em frente. Que mais ?
Z- Como foi o trabalho com o Adriano Stuart no “Mário Fofoca” ?
CM- Foi com o Luiz Gustavo inclusive. Foi um filme engraçado, cômico. O Adriano sempre agitadão consciente e não teve assim grandes problemas. Problemas de uma produção normal e a agitação do Adriano pra quem conhecia ele era o dia-a-dia. Ele saiu do Renato Aragão, quando fez o “Mário Fofoca”. Não teve aceitação, mas na minha opinião o filme era bom, popular, pra dar risada. Mais chanchada que pornô, mas na executação dos trabalhos tudo ocorreu muito bem. O câmera foi o Antônio Moreiras e eu fui assistente dele.
Z- Como foi trabalhar com ele ?
CM- Tranqüilo.
Z- Ele também é estrangeiro ?
CM- Não, ele é descendente de português. É outro que morreu novo e ele também começou debaixo, garoto na Boca: maquinista, eletricista. Polivalente. Uma pessoa assim maleável. A esposa trabalha em produções, a Silvinha não tive mais contato com ela nem nada. Ela trabalhou muitos anos em longa-metragem em continuidade.
Z- Não sabia. E o Walter Wanny o senhor conheceu ?
CM- No contato, nós tivemos no Soberano, num de frente a ele outro bar.
Z- E o Tony Vieira ?
CM- Com ele eu nunca fiz nada. Mas eu vi alguns filmes dele. Ele era figuraça e ele foi casado com a Claudette, mas foi uma das últimas. Ela tá fazendo filmes produzindo em Brasília.
Z- Ela se casou com o Brazza. Um bombeiro que fazia uns filmes no estilo do Tony em Brasília. Mas ele morreu também..
CM- Então tem que ficar esperto (risos).
Z- Com o Fauzi o senhor trabalhou só uma vez ?
CM- Só uma.
Z- E aquele filme com o Ewerton de Castro, que o Carlão fotografou: “As Viúvas Precisam de Consolo”. Como foi esse trabalho ?
CM- Foi bom. O Ewerton foi uma pena que ele só dirigiu e produziu. Mas foi uma produção nota dez. Uma pena que acabou não dando dinheiro, mas a produção, a fotografia, a montagem foi legal. Uma pessoa muito legal, uma mãe com os técnicos. Deram uma pontinha pra ele agora na Record, pra não aposentar ele.
Z- E o senhor conheceu o Gilberto Wagner ?
CM- Só de vista. Não sei o que ele fazia, porque eu não participava da área de montagem, então todos esses montadores que você tá me perguntando eu conhecia somente de vista.
Z- Tinha outro bar na Boca além do Soberano ?
CM- O mais freqüentado era o Soberano, mas não tinha assim todo dia assim, aquela coisa toda. A gente se deslocava ia pra São João, pra outros lugares. Mas a parada principal era sempre no Soberano. Queria encontrar alguém era no Soberano. Uma porque ele era mais espaçoso, a gente tinha mais amizade. O primeiro passo era parar lá e era um point.
Z- O tipo de cinema da Boca passava no centro ou em bairro também ?
CM- Não, passava em todos os lugares. Onde tinha público, o filme tava. Porque como nós sabemos, um filme depende do público para ser pago.
Z- O senhor ia nas sessões ?
CM- Olha, eu via na premier, já em circuito eu via.
Z- Hoje o senhor freqüenta cinema ?
CM- Muito pouco. Muito pouco porque o que aconteceu: veio o primeiro vídeo, agora o DVD quando você quer ver um filme você pega leva na tua casa e no seu sofá. Acabaram as salas grandes, os cinemas de bairro. Se bem que eu estou notando o seguinte: o cinema está voltando mas não naquelas salas gigantescas. Tá voltando em shoppings, lugares com segurança e salas pequenas, não tão grandes.
Z- O senhor chegou a ver algum produtor tratar com o distribuidor ?
CM- Isso era segredo de Estado. O que acontece ? Hoje você compra um produto com código de barra. Mas e de primeiro ? Cadê o código de barra ? Cadê o controle disso aí. Você mandava e fazia na gráfica o que você queria. Não que tinha um controle, não tinha como controlar. Mas isso aconteceu até pouco tempo atrás até 95, por aí. Não tem colocaram catraca, aquela coisa toda era tudo piada. Sobre distribuição, circuito tem uma pessoa que é contador que fazia contabilidade pro Cervantes, pro David, pro Fauzi. Ele trabalha aqui...Agora tem hora que falha a memória, porque a gente perde o contato. Ribeiro. Pra qualquer um que você perguntar, fale do Ribeiro. Ele fazia a contabilidade de todo mundo e inclusive ele tem cartazes de todos os filmes.
Z- Tem cópias também ?
CM- Tem que ver com ele. Porque era um antigo cinema no Pátio do Colégio que eles fizeram uma rampa e fizeram um estacionamento. E o velho: o que aconteceu ele ficou com o escritório de 3, 4 andares e o cinema virou estacionamento.
Z- Uns viraram igreja evangélica...
CM- Outros igreja evangélica, supermercado...
Z- Como foi essa briga do Galante com o filho ?
CM- A única coisa que eu sei é que o pai não queria que ele cassasse com a atriz. É a única coisa que eu sei. Dizem que a discussão, a briga veio aí dessa razão e depois a esposa do Galante veio a falecer. Eu sei que a herança foi dividida. Como qualquer um de nós.
Z- Como qualquer família. Como foi o trabalho com o Guilherme de Almeida ?
CM- Ele é tranqüilo. Mas não foi somente no “Perfume de Gardênia”, tem outros trabalhos. Mas infelizmente, eu não lembro os nomes. Um cara chamado Ribeiro tem tudo, ele pode te ajudar. E o Carlão é amigo dele e eu sou muito amigo dele.
Z- O Rafaelle Rossi está meio mal ?
CM- Não sei.
Z- O senhor sabe que time foi que ele investiu todo o dinheiro que ele ganhou com “Coisas Eróticas” ?
CM- Comentaram que foi a maior bilheteria da história do cinema foi a dele. E ele perdeu tudo. Enfim, pegou com uma mão e gastou com a outra. Não sei qual filme foi. Matheus vamos encerrar ?
Z- Vamos seu Concórdio, quando o senhor quiser.




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