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Dossiê Howard Hawks

Scarface - A Vergonha de Uma Nação
Direção: Howard Hawks
Scarface, EUA, 1932

Por Leandro Caraça, especialmente para a Zingu!

Vindo do sucesso do épico aéreo "A Patrulha da Madrugada" (ganhador do Oscar de melhor história original), Howard Hawks se uniu ao bilionário Howard Hughes para um projeto que iria tirar o sono de muita gente, inclusive dele próprio. Hughes não queria realizar um filme de gangsters comum, mas sim algo realista e brutal. Mesmo sendo ele avisado de antecedência que tal produção não seria tolerada, deu o sinal verde para Hawks tocar a obra. Inicialmente baseado num romance de Armitage Trail, só manteve mesmo o seu título original e tornou-se um mosaico da bandidagem da velha Chicago onde o principal homenageado era Al Capone, que segundo a lenda conta, possuía uma cópia particular do filme.

Uma vez pronto o filme foi barrado pela Censura que exigia mudanças, sendo uma delas a inclusão do subtítulo A Vergonha de Uma Nação. Hughes não teve outra saída a não ser ordenar a Howard Hawks para fazer as alterações. Até então, o diretor tinha adorado a experiência de realizar um filme sem nenhuma interferência de qualquer estúdio ou executivo, e sempre destacava isso dizendo ser "Scarface" a favorita dentro de todas as suas obras. Não era por menos, uma vez que a saga do temível Tony Camonte (Paul Muni) pode ser facilmente colocada entre as melhores produções dos anos iniciais do cinema falado. Para quem no futuro seria chamado de artesão sem muita personalidade, Hawks abusou da liberdade que teve criando um sem número de seqüências de impacto que mesmo hoje não envelheceram nem um pouco. Foi dele a decisão de se criar uma obsessão incestuosa de Tony por sua irmã Cesca (Ann Dvorak) e o que contribuiu para que o filme fosse barrado. Quem assiste a filmes americanos do começo da década de 30 pode se surpreender com o nível de violência mostrada nas telas ou com o comportamento das mocinhas interpretadas por atrizes como Mae West ou Jean Harlow, só para citar dois exemplos. O famigerado Código Hayes que determinava o que poderia ou não ser mostrado no cinema surgiu em 1930, mas só foi entrar realmente em vigor quatro anos depois.

Mesmo assim logo no seu começo nenhum filme sofreu tanto quanto "Scarface" que parecia existir somente para confrontar o decreto castrador - que entre tantas coisas proibia a nudez, a glorificação da violência ou cenas promovendo miscinegação entre raças. O filme de Hawks foi o primeiro a mostrar um criminoso fazendo uso de uma metralhadora, e sempre mostrava Tony como um anti-herói que apesar de ser um sociopata, jamais era confrontado com qualquer tipo de moralidade ou consciência. São antológicas as cenas onde Paul Muni ao brigar com sua irmã, acaba deixando a mostra parte do seio dela, ou então a dança de Cesca para seduzir o capanga George Raft - outro que brilha no filme, assim como Boris Karloff no papel de um chefão rival de Paul Muni.

"Scarface" só foi liberado dois anos mais tarde e entre as mudanças estava a estava a inclusão do subtítulo A Vergonha de Uma Nação, a alteração do seu final mostrando o facínora Tony Camonte sendo julgado e sentenciado a morte (em vez de simplesmente encontrar seu final num tiroteiro com a poilícia) e a exigência em particular de uma cena mostrando autoridades e cidadãos comuns (um ítalo-americano entre eles) indignados com a presença de gangsters dentro da sociedade americana. Howard Hawks até que aceitou certas imposições mas foi contra algumas, como o final diferente que acabou sendo filmado por outra pessoa. Nada disso, porém, conseguiu reduzir a força do filme que mesmo depois de mais de trinta anos ainda impressiona.

Leandro Caraça é um dos maiores conhecedores de cinema de gênero. Seu vasto conhecimento cinematográfico pode ser conferido em seu blog Viver e Morrer no Cinema (http://buchinsky.zip.net).



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