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Babel

Por Gabriel Carneiro

Babel
Direção: Alejandro González Iñárritu
EUA/México, 2006.

Tenho a impressão de que quanto mais dinheiro Iñárritu consegue para fazer um filme, piores eles ficam. Sua estréia em longas veio com o mexicano Amores Brutos, dividido em três histórias que tem um ponto de encontro. Ganhou reconhecimento, chegando a ser indicado ao Oscar. Três anos depois, foi convidado a fazer um filme nos EUA com grandes astros. Disso nasceu 21 Gramas, novamente dividido em histórias com um eixo central. Uma produção independente americana que fala sobre a alma. Mais três anos, e Babel foi concebido. Mais astros do grande escalão, várias histórias paralelas que se unem. O que era local tornou-se global. E é assim que um dos filmes mais pretensiosos dos últimos anos chegou ao mercado.

Amores Brutos, como diz o nome, era brutal. Inovador e sensível, o filme mostrou como diferentes histórias se ligam por uma mera coincidência. Este é seu melhor filme. 21 Gramas me desagrada, uma brilhante interpretação de Sean Penn e uma histérica de Naomi Watts em um filme que quer ser cult. Babel extravasa tudo. Iñárritu não inova na fórmula – e que fórmula virou esse tal de mosaico de acontecimentos, principalmente às premiações -, e o pior é que força os eventos. Falta naturalidade. Um tiro numa americana. Ok, um desgraça. Um tiro sem intenção. Aí aparece a babá mexicana, está sozinha com as crianças do patrão e seu filho se casará no México. Ok, eventualidades (fatalidades) são comuns. Do nada, surge então a adolescente japonesa surda-muda com incríveis complexos sexuais. Aparentemente o pai dela é dono da arma que disparou o tiro. É quando se percebe que foi longe demais. Há uma construção feita para fazer do mundo uma grande conspiração. Pega quatro histórias distintas, e as conecta por um laço forte. E mais: todas são repletas de catástrofes. Soa absurdo, exagerado e forçado. Tragédias ocorrem, é fato. O problema é que só tragédias ocorrem, e assim Babel deixa de ser um filme de coincidências e passa a ser uma película de extravagâncias.

Para amarrar a experiência global de desgraças – afinal, para que se restringir a uma parte do mundo se ele conhece o mundo todo tão bem? -, Arriaga usa e abusa da estupidez das personagens. Evidentemente na da babá. O que leva uma imigrante ilegal a carregar duas crianças sem parentesco a outro país e tentar trazê-las de volta aos EUA, com a Doutrina Bush? Deve faltar parte do cérebro dela, já que além da ilegalidade, é considerada uma seqüestradora. Sim, queria muito ir ao casamento do filho. Mesmo assim, Arriaga torna inverossímil demais tal aspecto da narrativa. E isso é para ficar num exemplo, já que “nós crianças vamos brincar de atirar num ônibus cheio de gente, provavelmente turistas, só para ver se o rifle alcança ‘x’ metros de distância” e “vamos para o meio da lanchonete expor nossas vaginas porque somos surdas-mudas e ninguém gosta da gente” parece para a maioria um tanto quanto plausível.

Outro aspecto é a falta de empatia que as personagens carregam. A nenhum momento me pareceu importante ou interessante o destino das personagens. Empatia é algo que se deve criar para cativar o espectador, seja positiva ou negativa. Quando deveria torcer por um personagem ou para outro, nada. Aliás, torcia para que todos não alcançassem seus objetivos, já que a irritação pelas atitudes das personagens era enorme. Não me venham dizer que todos cometem atos falhos – o que ocorre -, mas um pouco de ponderabilidade ajudaria. Chama-se instinto de sobrevivência. O que nenhum deles parece ter.

No quesito interpretações, deveras elogiado pela crítica, todos surgem apagados. Não há destaques e me parecem corretos apenas. Se o filme não fosse tão prestigiado, hoje ninguém saberia quem são Adriana Bazarra ou Rinko Kikuchi. É de Bazarra a melhor interpretação, a única que se sobressai num emaranhado de situações caóticas, num mundo globalizado e inverossímil.

Acerca das supostas semelhanças com Crash, tenho apenas a dizer que o principal elo que vejo é o painel de histórias sobre preconceitos e desgraças. Aliás, vejo a comparação como um insulto a Crash, que mesmo pairando na mediocridade, é muito superior a Babel.

E que Babel não ganhe um Oscar sequer.



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