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Coluna CINEMA Extremo
ONDE O CINEMA PODE SER VIOLENTO...

Por Marcelo Carrard

Nekromantik
Direção: Jorg Buttgereit
Alemanha, 1987.

É impossível fazer um levantamento de uma filmografia básica dedicada ao Cinema Extremo sem falar sobre uma produção alemã de 1987, dirigida por um jovem e radical artista. O filme: NEKROMANTIK. O Diretor: JORG BUTTGEREIT. Com sua trama central sobre um casal de necrófilos, o filme já se inicia de maneira brutal. Um casal está em um carro, ocorre um acidente fatal. Vemos após os créditos um grupo de funcionários responsável pelo resgate dos corpos mutilados. Essa seqüência já antecipa o que estará por vir. Bobert, interpretado por Daktari Lorenz, é funcionário dessa equipe de resgate de corpos, profissão perfeita para um necrófilo. Sua esposa Betty, interpretada por Beatrice Manwrski vive com o marido uma rotina de contato com órgãos humanos em uma aparente harmonia. Robert está em uma busca interior por algo que ultrapasse seus limites. Na seqüência da alucinação, a câmera foca seu olho e vemos cenas de autópsia seguida de imagens de um coelho tendo o pêlo retirado. Essas imagens brutais surgem como uma espécie de antecipação da chegada de Robert em casa com um cadáver em adiantado estado de decomposição, instaurando assim um macabro e doentio triângulo amoroso. A criação desse corpo morto ficou a cargo do próprio Daktari, que também colaborou com a trilha-sonora do filme. A seqüência onde Robert, Betty e o morto estão na cama é uma mistura delirante de imagens grotescas e quase surreais, um desafio para o espectador. Os desdobramentos dessa paixão macabra são absurdos.

O ritualístico sacrifício do gato do casal e um ritual de auto-mutilação que constrói alguns dos momentos mais extremos de todos os tempos na história do audiovisual, tornaram esse filme um clássico do Cinema Extremo. Essa seqüência da auto-mutilação mistura as imagens do homem dando golpes de punhal em si mesmo enquanto ejacula, num gozo supremo onde o esperma se transfigura em sangue revelando ao espectador toda a densidade da loucura abissal da personagem.

Com esse filme Jorg Buttgereit conseguiu ser banido e até processado em vários paises. O filme ficou em um limbo underground por muitos anos até ressurgir no final dos anos 90 com seu lançamento em DVD. A angústia de Robert é muito bem expressada pelo ótimo e corajoso ator que se expõe como poucos nesse filme difícil até para iniciados em Cinema Extremo. Juntamente com Nacho Cerda, Jorg Buttgereit é o representante maior da necrofilia no Cinema. A criação de um estilo poético em retratar esse tema chocante e perturbador também pode ser observada em filmes como SCHRAMM. Suas influências são variadas. Do Drama Barroco Alemão, passando pelo Cinema de Fassbinder, os artistas radicais de Viena na década de 60, a cultura underground de Berlim e muito mais.

Em NEKROMANTIK 2, feito alguns anos depois, já com a queda do Muro de Berlim, é a figura feminina que surge em uma tentativa de viver um relacionamento amoroso e sexual com um homem vivo, mas seus desejos necrófilos irão se sobrepor ao convencional e ela cria uma forma brutal de mesclar os dois homens que deseja, um vivo e um morto. Chocante, doentio, grotesco, imoral... Vários adjetivos foram usados para definir NEKROMANTIK, mas sua força radical e sua profunda e perturbadora viagem aos abismos da mente humana, não pode ser classificado com poucas palavras.



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