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RUÍDO
MÚSICA DE VERDADE.

PIXIES - DOOLITTLE

Por Raphael Carneiro

O Pixies foi, provavelmente, a banda mais influente dos últimos 20 anos, e acabou ganhando merecidamente o status de cult. E o melhor de tudo, é que ao contrário de milhares de bandas eles souberam atingir o pico, ficar por lá, e abandonar tudo no momento em que perceberam que não conseguiriam mais manter a antiga unidade. Ou seja, trata-se daquele tipo de banda que quando termina, bate uma tristeza e ao mesmo tempo uma felicidade, porque seria praticamente impossível manter o alto nível de antes. Doolittle, seu terceiro lançamento, é um dos melhores discos da década de 80 e o trabalho mais significativo desta trupe de malucos.

A principal figura dessa banda genial é o fantástico Charles Micheal Kitridge Thompson IV (mais tarde ficaria conhecido como Francis Black), uma dessas crianças que aprenderam a tocar todos os instrumentos e desde pequeno tinha música enfiada goela abaixo. Sempre acompanhado de seu fiel amigo Joey Santiago, com quem sonhava montar uma banda de rock, seguiu rumo a Universidade de Massachusetts, onde passaram a viver nos famosos dormitórios para universitários. Completamente desinteressados da vida acadêmica, passavam seus dias fumando a boa erva e ouvindo discos, assim como praticando suas guitarras. Seus gostos diferiam um pouco, enquanto Francis era viciado em anos 60 (escutando os Beatles e o Doors) sem parar, Santiago era mais ligado no movimento punk e seus inventores, Lou Reed, Iggy Pop e David Bowie.

Insatisfeito com seu curso universitário, e após uma viagem de intercâmbio mal sucedida, Francis resolveu montar a banda com seu amigo Joey e colocou um anúncio procurando um baixista. A única pessoa a responder foi a jovem Kim Deal, que se interessou após ler o anúncio, que segundo ela era assim: "precisamos de uma baixista que possa misturar Husker Dü com Peter, Paul and Mary". Kim, porém, não possuía o instrumento, e recebeu de Francis dinheiro para viajar e convencer sua irmã a emprestar o instrumento, assim como assumir a vaga de baterista, o que foi prontamente recusado. Kim então, indicou o baixista David Longhorn que foi aceito.

A trupe passou a ensaiar na garagem de David, até gravarem o ep "Come on Pilgrim", custeado pelo pai de Francis. O Pixies já era, a essa altura, um peixe fora d'água no cenário norte-americano, principalmente após assinar com o selo inglês 4AD, que tinha em suas fileiras bandas como o Cocteau Twins. Seu segundo disco foi produzido pelo lendário Steve Albini (famoso por produzir bandas punks e hardcore), o que explica sua sonoridade raivosa e barulhenta. Era o nascimento de um clássico, e o disco, chamado "Surfer Rosa" acabou ganhando diversos prêmios de Melhor do Ano. Após o lançamento, a banda saiu em turnê pela Inglaterra abrindo para bandas como My Bloody Valentine.

Quando a banda havia chegado ao ápice na Inglaterra, começaram os preparativos para a gravação do terceiro disco, o já citado Doolittle, tema desta coluna. Mesmo com o alto nível dos trabalhos anteriores, acredito que ninguém estava preparado para o Doolittle, por isso o disco atingiu a juventude com a potência de uma bomba atômica. O disco era um clássico absoluto.

Abria com "Debaser", inspirado em filmes de Buñuel com o Salvador Dali, e possuía uma sonoridade raivosa e agressiva, ao mesmo tempo em que era extremamente pop e excitante. O principal tema do disco é a violência, a dificuldade de se lidar com sexo, além de muitas outras coisas que jamais fariam sentido se não fossem organizadas por um cara do nível de Black Francis. São 40 minutos de gritarias, distorções, microfonias, gemidos sexys da Kim e que viria a influenciar tudo que veio depois dele. Uma mistura totalmente original de surf music e pop puro é a ultra-famosa "Here Comes your Man", que os levou ao mega-estrelato. É fascinante ver o número de coisas que eles conseguem misturar em apenas 2 minutos de música.

Kurt Cobain deve ter enloquecido ao ouvir "Hey", talvez a mistura mais perfeita de música pesada com pop genuíno, ou seja, é a canção que o Nirvana sempre quis compor. Original, inovador, influente, qualquer adjetivo é insuficiente.

Foi um sucesso estrondoso, e responsável pelo mestre David Bowie os citar como a banda mais excitante do mundo, e desejar por shows conjuntos que acabariam acontecendo no começo dos anos 90. Eles ainda gravariam dois excelentes discos antes de terminarem sua carreira sem terem tido um filho feio, embora com Doolittle eles tenham parido um super-modelo. O melhor a se fazer, é esquecer essas palavras proferidas por um pseudo intelectual de boteco e escutar o clássico. É obrigatório.



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