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RUÍDO
MÚSICA DE VERDADE.

THE VELVET UNDERGROUND - THE VELVET UNDERGROUND & NICO

Por Raphael Carneiro

Em 1967, o movimento Flower Power hippie estava atingindo seu momento máximo. Os jovens americanos dançavam ao som de Doors, Jefferson Airplane, The Mamas and the Pappas, entre outras. Passavam seus dias fumando maconha, cultivando a paz e o amor, além de protestando contra qualquer tipo de conflito bélico. Enquanto isso, em Nova York, surge uma banda que simplesmente desprezava o movimento Hippie, pouco se importava com as guerras, e estava interessada apenas nas drogas e no sexo promíscuo.

Os membros dessa banda se vestiam invariavelmente de preto, usavam microfonias e ruídos estranhos para transformar melodias em barulho, e possuíam uma deslumbrante vocalista húngara ex-atriz, que contrastava com doçura a voz áspera e agressiva do principal vocalista da banda, um americano junkie que compôs para a banda uma ode a heroína. Não bastando isso tudo, ainda eram produzidos pelo papa do pop Andy Warhol, e tiraram o nome de sua banda de um livro pornô sobre sado-masoquismo. Não precisa ser muito esperto para sacar que isso só poderia ter sido (e foi) um fracasso retumbante de vendas. Em 1967, em pleno flower power, fazer músicas a respeito de homossexualismo, sado-masoquismo e consumo de drogas pesadas, era basicamente um pedido para ser enterrado.

Hoje, o disco da banana (como ficou conhecido devido à capa clássica feita por Warhol), é considerado um dos mais importantes da história do rock. Mesmo que em sua época tenha tido pouquíssima repercussão, diz a lenda que quem escutou o disco formou uma banda logo depois. O line-up da banda era formado em primeiro plano pelo genial Lou Reed (responsável pelas letras fabulosas e pesadas da banda); por John Cale (que cuidava do som agressivo e diferenciado), além de Sterling Morrison e Maureen Tucker, esses em menor destaque, até por não chamarem tanta atenção quanto os dois líderes.

Após serem expulsos de um bar ao tocar "Black Angel's Death Song", e aqui entra o próprio Lou Reed falando "Nossa idéia era de berrar as palavras junto com o som, sem nenhum significado. Além da letra pesada, John tocava a viola bem alto, que chocava com o som da minha guitarra e de Sterling. Era realmente muito agressivo", passaram a mostrar desprezo pelos clubes locais. Foram chamados para tocar em um bar na véspera de Natal, e para irritar o dono, começaram a tocar "Black Angel's...". O dono exigiu que parasse com aquele barulho, e para provocá-lo ainda mais, a banda executou a música novamente. Foram expulsos na hora, mas chamaram a atenção de um estranho rapaz de cabelos prateados, que costumava andar com um séqüito de bajuladores que faziam todas as suas bizarras vontades. E foi assim que Andy Warhol integrou a banda na Factory e começou a produzir o disco dos mesmos.

Como Andy nunca havia produzido um álbum, deixou a banda à vontade no estúdio, enquanto criava a fabulosa capa da banana e coordenava seu espetáculo multimídia "The Exploding Plastic Inevitable", do qual a banda seria a atração principal. Foi a primeira vez que equipamentos de luz eram usados enquanto o show rolava, e apesar das críticas negativas, foi algo que influenciou até o Pink Floyd, que assumiu como obrigação a utilização de tais equipamentos. Andy começou então, lentamente, a convencer o Velvet a utilizar a modela húngara Nico, que mais tarde se tornaria a estrela do E.P.I, devido a sua beleza.

Lou compôs umas músicas para ela e começaram os problemas, porque muitas vezes ela não queria cantar, e havia na Factory quem quisesse que ela fosse a voz principal da banda, o que enfurecia Lou e piorava a relação entre cantor-cantora. Diz Cale a respeito de tal situação: "Nessa época criou-se um clima tenso entre nós, porque Lou queria tocar e Nico muitas vezes não queria fazer. Ela não estava nem aí para o que a banda achava. Os ânimos só foram acalmados quando Lou fez as duas canções para Nico, que ficou realmente comovida. Depois disso, os dois criaram um vínculo tão forte, que acabou ajudando muito".

Após alguns problemas de produção típicos de bandas diferentes que lançam seu primeiro disco, saiu o fabuloso The Velvet Underground and Nico. Era uma obra-prima incontestável, ainda que na época quase ninguém tinha dado o devido valor. Talvez ainda seja o cruzamento mais belo entre barulho e música pop. Agressivo e lírico ao mesmo tempo. Suave e pesado. A utilização de Nico acabou por mostrar-se uma escolha de gênio. Difícil imaginar o disco sem as baladas "Sunday Morning"; "Femme Fatale" e "I'll be your mirror", que são simplesmente magistrais. O soberano do disco, porém, é Mr. Lou Reed, que mais tarde se tornaria um dos nomes mais importantes da história do rock. Para não me alongar nos elogios, deixo a opinião de dois caras realmente importantes:

"eu me lembro que fui à casa de uma amiga. Entre um beijo aqui e ali, ela colocou o disco do Velvet. Na hora eu parei, fiquei assustado, e depois não parava de ouvir. Eu queria saber mais sobre aquelas letras, aquela selvageria no som. Eu perguntei o que era e ela riu na minha cara, falando que eu era muito careta. Pois foi isso que me senti na hora: um careta! Como uma banda dessas existia e eu não conhecia?"
Iggy Pop

"eu ouvi o disco em Londres pouco tempo depois do lançamento. Não acreditava nos meus ouvidos. Era totalmente fora de moda, agressivo, sujo, excitante. Ninguém concordava comigo quando mostrava o disco e colocava para ouvir. As pessoas pediam para eu desligar o aparelho de som, ficavam chocadas. Londres apesar de ser uma das principais cidades da época em qualidade de música, não estava preparada para agüentar aquilo. Sinceramente, nem eu sabia como gostava. Só sabia que pensava conhecer esse grupo."
David Bowie



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