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RUÍDO
MÚSICA DE VERDADE.

THE JAM - IN THE CITY

Por Raphael Carneiro

"A platéia no Roxy na noite de quinta não merecia o Jam. Eu já tinha visto a casa lotada dançando ao som de bandas que não são dignas de lamber as palhetas do Jam. Três meses atrás não era cool dizer que se gostava do Damned, agora a ovelha negra da new wave é The Jam. Isso me dá náuseas, esse tipo de merda é tão vazia quanto bandeiras de paz e solos de guitarra de meia hora. O show do Jam, com canções atualizadas do The Who, clássicos do soul dos anos 60 e canções autorais, como o seu novo single da Polydor, "In the City" (o contrato de quatro anos vai levá-los tranqüilamente até os 21), é tocado com o tipo de urgência louca e genuína que infelizmente falta em todas aquelas bandas de abertura de quinta categoria que vêm do subúrbio com suas bobagens superficiais e seus instrumentos reluzentes comprados por seus pais. Paul Weller nos vocais, o cool Rick Buckler na bateria e Bruce Foxton no baixo vestem ternos justos de mohair e camisas brancas/gravatas pretas. O logo da banda é bem parecido o do Shepherd's Bush Old Masters, e por isso um monte de retardados presume que é uma espécie de revival da banda – e isso está tão longe da verdade que chega a ser inacreditável. "Para a próxima música, vamos desafinar nossas guitarras, e talvez vocês gostem mais", diz Paul Weller, naturalmente amargurado. Se você não prestou atenção neles porque não consegue ver nada além do alfinete na ponta de seu nariz, você não passa de um imbecil, certo?"
Tony Parsons

IN THE CITY é o primeiro disco da minha banda predileta. A Ruído deste mês não será uma coluna comum, e acredito que minha primeira frase já deixe isto claro. Sou absolutamente suspeito para falar do Jam, já que trata-se da banda que mudou a minha vida, que me fez ver as coisas de outra maneira. Mas, antes de tudo, façamos uma viagem no tempo. Estamos na Inglaterra, 1977, e o turbilhão Punk está varrendo Londres como se fosse um furacão. Os Sex Pistols estão pregando abertamente a anarquia, agredindo publicamente a rainha, e, pasmem, faturando uma boa grana com isso. Os jovens acreditam que para demonstrar agressividade tudo que se precisa fazer é colocar um alfinete no nariz, criticar a monarquia e pregar a anarquia (mesmo que muitos nem saibam do que se trata esta doutrina política).

O momento não poderia ser ao mesmo tempo mais e menos propício para que três jovens britânicos aparecessem. A princípio, o surgimento do Jam parecia um retrocesso. Quem são esses caras, que em pleno turbilhão Punk ousam se vestir bem e reverenciar o passado? O que muita gente não percebeu, é que por trás do visual cosmopolita e paixão pelo Soul e pela década de 60, existia uma banda ainda mais agressiva, mais radical, e principalmente mais politizada do que as outras bandas que se diziam Punk’s. Aliás, pode até não se concordar, mas se formos falar de conteúdo, o Jam sempre esteve anos-luz a frente das bandas de sua época.

É natural que de começo fosse uncool elogiar o Jam, afinal, a juventude estúpida sempre preferiu gente fantasiada gritando sobre o que não entende do que pessoas que não queiram parecer palhaços de circo. O fato é que Paul Weller (líder da banda e Deus nas horas vagas), tinha apenas 17 anos quando In The City saiu nas paradas, e sempre foi um cara diferente da maioria dos caras de sua idade. Seria, porém, injusto apontar apenas o Paul Weller como razão da qualidade do Jam. Certamente o som da banda não seria o mesmo sem o maravilhoso Bruce Foxton, destruindo tudo no baixo, e o relógio humano chamado Rick Buckler, um batera fodíssimo.

O som da banda, logo foi definido pela crítica da época como “Mod Revival”, talvez pelo fato do Modernismo ser a maior influência da banda. Embora refutado por Weller, que dizia “Como posso ser um revivalista se tenho apenas 17 anos?”, este “rótulo” foi a pedra inicial de todo um movimento que se desenvolveu a partir daí, e que nos presenteou com bandas maravilhosas como o Small Hours; The Chords e Secret Affair entre outras. O fato porém, é que a música do Jam transcende o Modernismo, e flerta com inúmeros gêneros, entre eles o Soul, Disco, Funk, e até o próprio Punk, que é a força motriz por trás de In The City.

In The City pode não ser o melhor disco do Jam (cargo que ficaria, ao meu ver, com o Sound Affects ou o Setting Sons), mas certamente abriu as portas para tudo o que veio depois. Mesmo com alguns deslizes na produção (típico de uma banda iniciante lançando seu primeiro disco), o que chama a atenção, é a agressividade e o idealismo juvenil que estão impregnados nas letras. O disco é cheio de pequenos clássicos, entre eles a música título, I’ve Changed my Adress, Art School, a Away From the Numbers, ultra-influenciada pelo Who, e muitas outras. Basicamente é um pequeno clássico da década de 70. E é mais Punk do que muitos outros discos da época.

Entre 1977 e 1982, o Jam lançou 6 discos, todos obras de arte maravilhosas. Do começo raivosa e idealista a sofisticação Pop, sempre com letras espetaculares. Quando o power trio terminou em 1982, no auge, diga-se de passagem, eles já eram a maior banda da Inglaterra e com o maior número de Singles no TOP 50 U.K desde os Beatles. Ao seu término, alguns pensaram que Paul Weller estava acabado e que sua criatividade havia terminado. Mal sabiam que ele estava prestes a embarcar em um projeto ainda mais audacioso, o Style Council. Mas isso fica de tema para uma próxima coluna...




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