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Cantinho do Aguilar...

PORQUE NÃO VI E NÃO GOSTEI DE “BAIXIO DAS BESTAS”

Por Eduardo Aguilar

Porque da mesma forma que não acredito no processo educacional que acha que ‘uma boa surra’ pode resolver as coisas, também acho que agredir os olhos do espectador não apenas é incapaz de cooptá-lo, mas na maioria das vezes irá contrapô-lo ao que você quer lhe dizer e se a intenção é ‘rezar missa pra convertido’, sinceramente, isso me parece extremamente inócuo. Sobra então a possibilidade do pretenso artista encarar tudo do ponto de vista mercadológico, ao meu ver, é como aqueles jornais sensacionalistas, que dando a impressão que estão pondo o dedo na ferida, no fundo, querem mais é faturar com o nosso lado sádico e ‘voyeur’. Uma das coisas que me deixa com essa convicção é o fato de que dizem que mais uma vez na junção da dupla Cláudio Assis e Walter Carvalho as cenas são ‘sujas’ mas as imagens são belas. Meu Deus! Esse Walter Carvalho é pior do que tudo de mal que o ‘neon-realismo’ fez ao cinema brasileiro! E vale dizer, tremenda decepção esse Lady Vingança, faz exatamente o caminho que apontei acima.

Bom, deixando o desabafo de lado contra um tipo de cinema que desprezo solenemente, eu pensei em listar os filmes que mais gostei nesse primeiro semestre, e vou fazê-lo, mas o destaque maior fica para as peças de teatro, minha nova paixão. Importante: não existe uma ordem, salvo a preferência entre os filmes por Vermelho como o Céu, e entre as peças por Isadora.

Filmes:

Vermelho como o Céu – direção de Cristiano Bortone. O melhor filme do ano até agora! Nem tudo se resume a imagem, mas tudo pode ser imaginação! Mas claro, o filme foi dirigido por um canceriano e isso explica tudo – rsrs -.

A Última Cartada – direção de Joe Carnahan. Vai entender a crítica, estamos diante do maior talento do novo cinema americano em um filme muito além das bobagens de um Guy Ritchie e que faz frente aos caras da Ásia, tipo Johnny To, e que mesmo assim foi praticamente ignorado por aqui.

Proibido Proibir – direção de Jorge Duran. Lição de cinema! Lição de sensibilidade! Caio Blat, o novo Nelson Xavier!

Calvaire – direção de Fabrice Du Welz. Filme belga com uma das cenas mais sensacionais do cinema mundial recente que mostra alguns caipiras numa dança totalmente ‘non-sense’. Provoca, incomoda e não é inócuo.

Vênus – direção de Roger Mitchell. O talento de Mitchell (de “Changing Lanes”, filme com Ben Afleck) numa ‘co-direção’ com a genial atuação de O’Toole apostando todas as cartas que é preciso manter o frescor e o prazer pela arte de viver.

Batismo de Sangue – direção de Helvécio Ratton. O melhor retrato dos anos de chumbo feito pelo cinema nacional. Tem problemas? Muitos. E daí?

Deja Vu – direção de Tony Scott. Melhor filme de Tony! Pouco? Não! Muito!

O Tigre e a Neve – direção de Roberto Benigni. Melhor filme de Benigni! Idem acima!

Pro Dia Nascer Feliz – direção de João Jardim. Impactante! Mas não o estado de coisas da educação brasileira, e sim, a capacidade de ouvir de João Jardim. Uma lição aos professores: saber ouvir!

E é claro, convém esclarecer, o filme de Loach não está na lista por que eu o assisti no ano passado e por conseqüência o inclui na lista daquele ano.

Peças de teatro:

Isadora – Monólogo sobre a grande dançarina Isadora Duncan. Em cena, uma atuação arrebatadora de Isabela Pimentel, e uma direção de tirar o fôlego de Fernanda Levy que também é responsável pelo texto.

Uma ode a liberdade de criação, de viver, de amar! De ser! E é bom dizer, eu vi o filme de Karel Reisz que é extraordinário e fui assistir a peça a partir desse referencial que colocou minhas exigências lá em cima, mas a peça tem caminho e luz próprios e rapidamente eu estava imerso no que via sem me lembrar do filme.

A Casa – Texto e direção de Rudifran Pompeu com o grupo Redimunho de Investigação Teatral. O universo mineiro credor de Guimarães Rosa encontra uma narrativa que sem abdicar do estilo ‘difícil’ de Guimarães consegue chegar ao público pela emoção, pelos sentidos. Com uma direção de arte e figurinos precisos, uma luz que mostra que simplicidade ainda traz beleza sem estetização e atuações que ratificam que enquanto o cinema brasileiro insiste em buscar atores na tv como se isso fosse trazer o público para os cinemas, os nossos melhores atores seguem no teatro, o que, aliás, nunca foi novidade. O destaque fica para a ótima utilização de uma casa enquanto espaço alternativo de exibição e possibilidade anti-linear de vagar pelas lembranças de alguém.

Educação Sentimental de Um Vampiro – direção do badalado Felipe Hirsch, e com aquele que talvez seja o maior ator brasileiro do momento: Guilherme Webber, e baseado em Dalton Trevisan, ou seja, era difícil dar errado, mas a crítica parece que pensa assim. Eu discordo! O clima expressionista trazendo um olhar cinematográfico pode de fato, parecer diluição de trabalhos similares, como os de Gerald Thomas em Carmen com Filtro, mas vai além disso e há muita pertinência. Duas cenas sobressaem, o rapaz que não consegue consumar a noite de núpcias, numa clara alusão a O Belo Antônio, com o diferencial de ser extremamente divertida, e a cena de um estupro contada sob diversos pontos de vista.

Elas Cantam Eles – direção de Alex Olobardi. Confesso, fui assistir a peça por conta da amiga/atriz Anália Martins, mas não tinha muitas expectativas, no entanto, fui surpreendido pela capacidade de gerar poesia do diretor Alex, uma poesia além dos poemas escolhidos. Poesia feita de contrastes, de mulheres/atrizes inspiradas, de cantoras apaixonadas como Elaine Eco cantando a clássica Atrás da Porta de Chico Buarque e Francis Hime.

Beckett in White – a Comédia – direção Mauricio Lencastree. Beckett é sensacional! Nessa peça em que tive o meu primeiro contato com o autor, ousadia é a tônica, provocação é a tônica, e no entanto, permanece sempre um canal direto com os olhos e os sentidos do espectador. Direção precisa, atores mágicos!

Mas aqui, cabe um parêntese, quando trabalhei com Carol Angrisani em Lourdes, um conto gótico de terror, eu sabia que estava diante de uma grande atriz, mas só me dei conta do poder de fogo dessa mulher na sala de edição, quando junto com o editor, decidimos mudar a estrutura do curta porque a atuação de Carol assim exigia! Mas depois de vê-la em cena em Beckett in White – a Comédia, é difícil encontrar palavras, confesso que fiquei tenso esperando-a sair do camarim, queria conseguir exprimir o que estava sentindo, me esforcei, mas não sei se consegui, o fato é que cai de quatro! Eu acreditava que sabia do talento dessa atriz, mas longe disso, ela vai muito mais além do que meus olhos supunham ver. Ela é talento puro! Ela é MAGIA!

Carol, quanta honra em ter te dirigido. Quanta honra!

Inverno Outono – direção de Eduardo Tolentino. O diretor do grupo Tapa trabalhando com Denise Weinberg (fabulosa) e outros atores geniais, em especial, uma atriz que seria um sonho um dia eu poder dirigi-la: Suely Franco. O texto fala de uma família que mantêm jantares pontuais, onde invariavelmente se lava a roupa suja. Diálogos afiados, uma bela ‘mise’en’scène’ de uma simplicidade aparente que valoriza as atuações e o texto.

A Mãe – direção de Sergio Audi. Aqui, pude mais uma vez confirmar o talento multi-facetado de Tânia Paez, atuando como atriz, cantora e pianista. O diretor parte do olhar de Brecht sobre a obra de Gorki e incrementa a lógica do distanciamento através de intervenções performáticas que flertam com o pop evitando que aquilo que foi moderno um dia pareça velho em tempos atuais.

Toda Nudez Será Castigada – direção de Paulo de Moraes com o grupo Armazém Cia de Teatro. A atriz central é a mesma de Um Sol Alaranjado de Eduardo Valente: Patrícia Selonk. E que atriz! Aqui, talvez o espetáculo que ao meu ver melhor equilibrou os aspectos visuais com a dramaturgia. Plasticamente impecável sem nunca descambar para o fetiche da estética, até mesmo em soluções que parecem gratuitas como os personagens que vestem uma batina ou um jaleco que através de velcro se abrem mostrando que os mesmos estão nus. Intenso, belo, poético, ousado e inacreditavelmente atual.

Pra fechar, uma reflexão de Claude Lelouch e um pouco de pretensão em um breve poema:

Por que você quis fazer um filme policial?
Porque é o gênero que mais se aproxima da vida, visto que estamos todos condenados à sermos assassinados de um jeito ou de outro (risos). Eu acho que Deus é o maior serial-killer de todos os tempos. Ele inventou o crime perfeito antes de todo o mundo. A vida é um filme policial porque a gente não sabe a data da nossa morte, o filme é construído em cima deste mesmo suspense.

Tirado da entrevista de Claude Lelouch falando sobre seu último filme que acessei no ótimo blog da canceriana Mara Liz : http://parisagogo.blogspot.com/


No MEIO de mim!

Passei PARTE da minha vida ouvindo falar em MEIA idade...
MEIA verdade?
Há idade INTEIRA? Vida INTEIRA?

Perdido de mim, METADE de mim...
Em MEIO ao MEIO do caminho.
MEIO do FIM ou do INÍCIO?

Recomeçar...
Mas em qual PARTE?
Buscar um novo MEIO sem medo de mim!




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