html> Revista Zingu! - arquivo. Novo endereço: www.revistazingu.net
Carta ao leitor.

Prezados amigos colaboradores e leitores da Zingu!,

Há um ano, venho juntamente com vocês fazendo esta publicação mensal dedicada ao cinema paulista. A idéia era falar de Bocas do Lixo, Beco da Fome e de pessoas recusadas pela intelectualidade. Uma certa idolatria de pessoas ditas “pornográficas” ou “taradas” como Tony Viera, David Cardoso e mais atualmente Sady Baby.

A linguagem da revista é a falada nos ônibus municipais e intermunicipais, na banca da dona Antônia, no sebo do Souza, nos discos do Nelson Gonçalves, Cláudio Fontana, Orlando Dias e nos livros do Stanislaw Ponte Preta. É a mesma linguagem usada nos filmes de Ody Fraga, Élio Vieira de Araújo, Cláudio Cunha e Alfredo Sternheim. Também (graças a Deus) é a mesma língua falada na Praça da Bíblia, nos lugares onde se vende salgadinho Fofura e Torcida, nas tardes de tubaína do Cuca Ideal, no restaurante Ita do Largo do Boticário, na Rua do Triunfo e principalmente nos programas esportivos de rádio AM (Milton Neves, Flávio Prado, entre outros). Portanto, esta é uma publicação sempre se recusou a títulos acadêmicos, partidos ou pensadores “bonitões” de esquerda festiva, intelectuais babacoides, Chico Buarque, Jards Macalé, Milton Nascimento, ECA, FFLCH, entre outros.

O que me levou a fazer a Zingu! e a que me faz fazer até hoje é a paixão pelo cinema paulista. Nunca quis como objetivo principal de minha paixão pelo cinema brasileiro ganhar dinheiro, mulheres, Dodge Pollara, Puma GTS conversível e tudo mais. Alguns riem e continuam rindo porque realmente eu, editor-chefe não li tudo todo André Bazin ou porque não tenho saco pro Eric Rohmer.

Mas é curioso: esses que riem, e desfilam com discursos intelectualoides, não fazem muito pela nossa cultura. Estão mais preocupados com os franceses, os ingleses, os gregos e tudo mais. E eu, jogado de reacionário e deixado aos fiéis amigos e leitores dessa estimada publicação.

Amigos, a Zingu! não mudou a minha vida e não é algo que realmente tenha me marcado pra sempre. Mas é algo especial e que me orgulho profundamente. O que mudou minha vida foi conhecer pessoas formadas pela Universidade da Boca do Lixo. Isso sim, me marcou (e marca) profundamente, pra sempre de modo definitivo. Conhecer, admirar e criar amizade com pessoas simples, de enorme talento, pouquíssimo reconhecimento e formadas pela universidade da vida, é o que me marcou. Aprendi coisas que não estão nos livros do André Bazin, nos filmes franceses que não dizem nada. Aprendi sobre cinema, mas principalmente sobre a vida. Devo muito a eles.

Se há algo que eu queira que fique de mim é isso: o amor e a dedicação (nem sempre correta, mas bem intencionada) ao cinema de São Paulo e ter ousado em conhecer essas pessoas e dar voz a elas. De boa fé: troco todos esses semestres de faculdade de jornalismo e de livros que muitas vezes não dizem nada por uma tarde com um técnico da Boca do Lixo. Ajudou muito mais na minha formação como pesquisador, cinéfilo e principalmente como homem.

Nossa publicação pode não ser a melhor para as pessoas cinéfilas e nem foi sua intenção sê-la. Eu nunca quis isso. Eu quis sim: ousar e fazer algo que pode ter diversos defeitos (como diz o alfaiate e filósofo capixaba Paulo Sérgio em “Minhas Qualidades, Meus Defeitos”) mas pelo menos fazer algo pelo nosso cinema. Essa foi nossa vertente. O dossiê do Rubem Biáfora pode não ser o melhor que se poderia fazer para um personagem de tal grandeza, mas pelo menos fizemos algo.

Adelino Moreira, disse certa vez em uma antológica canção popular: “A minha história é vulgar, mas algo fica provado”. A Zingu!, pode ser vulgar mas algo fica provado.

Com a Zingu!, o cinema paulista volta ao lampião da nossa rua.

Matheus Trunk
Editor-chefe da revista Zingu!



<< Capa