Clássicos absolutos das HQs, de todas as épocas e estilos.
Por Daniel Salomão Roque
Dos seus 66 anos de vida, mais de 40 foram dedicados à criação de histórias em quadrinhos: nestas quatro décadas, consolidou-se facilmente como um dos grandes desenhistas do nosso país, sendo que nunca faltou quem o considerasse o maior de todos. Assim como a esmagadora maioria dos mestres de sua geração, Colin teve sua carreira associada principalmente ao terror, gênero no qual explorou com maestria as crendices, superstições, folclore, lendas e sincretismos religiosos que sempre marcaram o Brasil, mas nunca deixou de se aventurar por outros caminhos: começou nos gibis educativos e policiais, adaptou para as HQs seriados como O Vigilante Rodoviário, mergulhou em trabalhos de temática histórica e também passeou pelo erotismo, sendo a cultura nacional um elemento onipresente nestas obras de temas aparentemente tão díspares. A inegável genialidade presente em "Vizunga" não é o único motivo pelo qual a tira se destaca no meio de tanta coisa boa: o fato da mesma fugir à qualquer classificação de gênero e ter sido produzida num período de transição na trajetória de seu criador também pesam bastante.
Se a premissa de “Vizunga” é dinâmica por natureza, Colin torna a experiência ainda mais intensa, graças a um brilhante uso de contrastes e ao seu estilo deveras original de tecer a narrativa. As praias cariocas (seriam elas tão lindas assim?) transcendem a categoria de cenário para ocupar o status de personagem, tamanha a pompa com que são retratadas; as águas que vão e voltam na areia, gaivotas voando em direção ao Sol, os enormes e luxuosos edifícios de Copacabana em contraponto às belezas da natureza, a pequenez do homem em relação a isso tudo – todos esses elementos estão presentes de forma serena, cinematográfica, quase meditativa, não devendo em nada aos momentos mais inspirados de Hugo Pratt. Porém, quando o protagonista relembra de seus “causos”, somos testemunhas de uma mudança radical, tanto em traço quanto em palavra: os desenhos, antes detalhados, levemente acadêmicos, bem documentados e realistas dão espaço a traços limpos, primitivos, exagerados, caricatos, bidimensionais, de cunho humorístico e sem nenhum compromisso com a realidade. O texto acompanha essa guinada e adquire uma característica paradoxal: seu vocabulário torna-se mais complexo, com referência a muitos animais exóticos, termos técnicos de caça e pesca, palavras indígenas e metáforas de todo o tipo, e com isso a trama, por incrível que pareça, torna-se ainda mais ágil. Cada quadro das tiras, cada linha de texto demonstram profundos conhecimentos em geografia, história, antropologia: Colin sempre foi conhecido por incorporar pesquisas rigorosas ao seu processo criativo.
Durante um bom tempo, “Vizunga” foi considerado o canto de cisne da obra de Colin nos quadrinhos. Desiludido com o fracasso comercial da obra, o artista deixou as HQs de lado para dedicar-se apenas à publicidade, só retornando à nona arte no final dos anos 70, publicando nas revistas eróticas da Grafipar e na Spektro da editora RGE, esta última um dos mais antológicos gibis de horror que o país já teve. Na década de 80, prosseguiu com o gênero fantástico, sendo figura constante nas revistas Calafrio e Mestres do Terror, ambas editadas pela D-Arte de Rodolfo Zalla. Tanto nos 90's quanto nos últimos momentos de sua vida, direcionou sua obra para graphic novels e pequenas produções independentes, dentre as quais se destaca “Fawcett”, cujo roteirista, o fanzineiro André Diniz, chegou a afirmar que, com sua relativa inexperiência, ter um roteiro desenhado por Colin era o equivalente a ser um dramaturgo e ter sua primeira peça estrelada por Paulo Autran e Fernanda Montenegro.