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Clássicos de Prestígio

Por Gabriel Carneiro

O Último Chá do General Yen
Direção: Frank Capra
The Bitter Tea of General Yen, EUA, 1933.

Frank Capra é um dos mais célebres diretores do cinema clássico americano. Celebrado principalmente por suas obras contextualizadas na Depressão. Filmes que mostram um mundo justo, e que transpiram esperança, sentimento mais necessário naqueles difíceis momentos. Seus títulos mais conhecidos estão nessa fase: O Galante Mr. Deeds, Do Mundo Nada se Leva, A Mulher Faz o Homem, A Felicidade Não se Compra... Porém, antes de virar um fenômeno com Aconteceu Naquela Noite, em 1934, Capra realizou significantes películas.

O Último Chá do General Yen
é talvez a mais expressiva. Mais, até, que algumas de suas consagradas obras. Nessa história de amores clandestinos, Capra utiliza o refinamento estético contemplativo dentro do classicismo, ou seja, por mais que seja convencional na maneira de filmar – já que dentro dessa lógica, isso era um meio -, ele não ignora o tempo tão significativo no cinema moderno. Há o tempo de transcendentalizar pelo apuro visual, pelo olhar de uma beleza inerente ao contexto. É uma mera contemplação, e para isso necessita-se um tempo, que não chega a ser considerado morto, mas é um tempo inanimado. Tal aspecto aguça-se com o decorrer da história. É ritmado com a paixão a se distinguir.

A sincronia entre o vislumbramento e as múltiplas sensações de afeto caracteriza o lado romântico de seu cinema, tão atípico. Por mais que viria a fazer dramas, a comédia sempre lhe seria um fator integrante, agregador e imprescindível. São poucos os seus filmes que mantêm o drama e o romance como focos. Ao fazê-lo, mostra-se eclético, pois mesmo que o autor esteja em formação, as qualidades são naturais. Faz com apreço.

O filme conta a história de uma missionária que vai à China, durante diversos conflitos, para se casar. Problemas ocorrem na trajetória, e ela se vê raptada pelo bronco General Yen. A princípio, fê-lo com objetivo de atingir o grupo de missionários, mas por ela se encantou, e prolongou a situação.

Por mais que o conteúdo sofra influências de um clássico romantismo, em que primeiro vem o conflito odioso para depois vir a comunhão, a história soa verdadeira para os parâmetros atuais, e isso independente da habilidade de transportar-nos para dentro dele. Antes de tudo, percebe-se uma admiração mútua, porém enrustida – e assim fica até o derradeiro final. Porém os atos contradirão as palavras, e o desprezo proferido por ela torna-se tolo ao ver que passam mais tempo juntos, sempre buscado por ela. É quando o tempo da contemplação torna-se intrínseco a O Último Chá do General Yen. É parte da personagem. A câmera olha para o general sem apontar de quem é a visão subjetiva, mas não há necessidade. A atmosfera criada torna óbvio tal movimento.

Nesse filme de momentos sublimes busca-se o olhar do exótico, sem torná-lo caricato, mas sempre tentando entendê-lo, e ver o belo. A história paralela da servente é uma adaptação disso para relação hierárquica. Os desgostos artificiais entre o general e a missionária tornam-se superficiais, quando ele finalmente se prova um homem de honra, e que sua personalidade é parte de um cultural diferente da ocidental. O último chá do título refere-se a uma última decisão, a mais difícil. O chá representa a essência do general, o tradicionalismo. A conturbação causada por uma estranha e bela personalidade funde elementos, especialmente os sensoriais. A contemplação da câmera exerce a transformação dos sentidos. Torna-se tão forte, que nos é quase físico. É uma realidade imposta e desconcertante, de caráter lúdico, que perpassa a existência: torna-se espiritual.

Em O Último Chá do General Yen, Capra assiste a tragédia do homem e o nascimento da paixão através da observação. E no sentir ele vislumbra um mundo novo, assim como seus personagens. Independente do que ocorra, o que existiu está marcado. O que fazer: olhar e olhar.




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