html> Revista Zingu! - arquivo. Novo endereço: www.revistazingu.net
Musas Eternas...
PORQUE O QUE É BOM, É ETERNO...

Isabelle Huppert

Por Sergio Andrade

Baixinha (1,60m), sardenta, ruiva (ou morena, loira, castanha), Isabelle Huppert já tem seu lugar garantido como uma das maiores atrizes do cinema em todos os tempos.

Ela nasceu no dia 16 de março de 1953, em Paris, mas passou a infância em Ville d’Avray. Filha de um empresário e de uma professora de inglês, é a caçula de 5 irmãos, sendo que duas de suas irmãs, Caroline e Elizabeth, também seguiram a carreira artística (a primeira é diretora e a segunda atriz e diretora).

Isabelle estudou no Conservatoire d'Art Dramatique, em Paris, mas também é graduada em russo pela Faculdade de Clichy.

Sua estréia no cinema se dá em 1971, um pequeno papel no filme “Uma Lágrima, Um Amor”, de Nina Companeez. No ano seguinte seria dirigida por um dos grandes do cinema francês, Claude Sautet, em “César e Rosalie”, onde era a irmã mais nova de Romy Schneider.

Seguem-se várias produções para a TV, mas ela só chamaria atenção pela primeira vez no anárquico “Os Corações Loucos”, de Bertrand Blier, em 1974.

Logo depois trabalharia em seu primeiro filme em inglês, “Setembro Negro”, do mestre Otto Preminger, onde era uma das 5 filhas de milionários seqüestradas por um grupo terrorista palestino. No entanto o filme foi um fracasso tão grande em toda a parte que muita gente nem lembra, ou nem sabe, que ela participou dele.

Com “Aloise” recebe sua primeira indicação, de um total de 14, ao César, o Oscar francês.

Em “Docteur Françoise Gailland” é a filha de Annie Girardot, de quem voltaria a ser filha, 25 anos depois, em “A Professora de Piano”.

Com “Um Amor tão Frágil” vem, finalmente, a consagração. Essa obra-prima do suíço Claude Goretta, sobre uma cabeleireira que durante uma viagem se apaixona por um tímido universitário, mas logo as diferenças culturais e sociais irão se mostrar um terrível obstáculo nesse romance, fez um enorme sucesso na França, tornando o nome de Isabelle Huppert conhecido do grande público. Por “La Dentellière” ela recebeu os prêmios BAFTA e David Di Donatello.

E em 1978 tem início uma das maiores parcerias entre um diretor e uma atriz na história do cinema: Claude Chabrol/Huppert.

Baseado num caso real acontecido nos anos 30, “Violette Nozière” conta a história dessa garota de 18 anos que é presa pela polícia sob a acusação de ter envenenado seus pais. Aos 25 anos, Isabelle ganha sua primeira Palma de Ouro em Cannes.

“Les Soeurs Brönte”, de André Téchine, vale pelo show de interpretação de suas três atrizes, cada uma com seu estilo próprio de representar: as duas Isabelles, Huppert e Adjani, mais Marie France Pisier.

A partir de então se tornaria uma espécie de preferida dos grandes diretores: Maurice Pialat (Loulou); Jean-Luc Godard (Salve-se quem Puder: A Vida); Mauro Bolognini (o maravilhoso “A Dama das Camélias”); Godard de novo, em um de seus filmes mais belos visualmente (Passion); Bertrand Tavernier (A Lei de quem Tem o Poder); Michel Deville (o neo-noir “A Vítima por Testemunha”, baseado em Patricia Highsmith); Joseph Losey (La Truite); Marco Ferreri (A História de Piera); Diane Kurys (Coup de Foudre); Bertrand Blier (La Femme de Mon Pote); Andrzej Wajda (Os Possessos).

Mas seu filme mais lembrado da época foi um fracasso monumental: “O Portal do Paraíso”, produção milionária de Michael Cimino que levou a United Artists à falência. A surpresa é constatar que a personagem de Isabelle, Ella Watson, tem grande importância na trama, que trata do conflito entre criadores de gado e imigrantes europeus no Wyoming do final do século 19. Ela própria considera sua interpretação em “Heaven’s Gate” (na versão original de 219 min.) uma das melhores de sua carreira.

Isabelle é uma mulher bem ligada à família. Já foi dirigida pela irmã Caroline (Signe Charlotte) e pelo marido Ronald Chammah (Milan Noir), com quem está casada desde 1982 e tem três filhos (Lolita, Lorenzo e Ângelo).

Trabalhou também diversas vezes com a filha, que seguiu a carreira da mãe. E a primeira vez que isso aconteceu foi no reencontro, 10 anos depois de “Violette Nozière”, com Chabrol. O resultado foi puro dinamite! De novo baseado num fato real, “Um Assunto de Mulheres” traz Isabelle como Marie Latour, que na França ocupada pelos nazistas faz abortos clandestinos, prosperando no “negócio”. Quando arruma um amante é denunciada pelo próprio marido, sendo julgada e condenada à morte na guilhotina. Sua reza final, uma versão bem particular da “Ave, Maria”, causou escândalo entre os católicos de carteirinha. Isabelle ganhou a Copa Volpi no Festival de Veneza.

“Malina” é um filme inclassificável. Dirigido pelo alemão Werner Schroeter, adaptação do romance de uma autora então pouquíssimo conhecida, Elfriede Jelinek, é um brilhante exercício em esquizofrenia, no qual Isabelle, talvez pela primeira vez na carreira, abandona seu característico “distanciamento” da personagem, se jogando no papel com grande intensidade, como se tivesse decidido dar um salto mortal triplo, de olhos vendados e sem rede de segurança, saindo-se maravilhosamente bem!

Em seguida outro Chabrol: “Madame Bovary”, exemplar adaptação da obra de Flaubert que lhe deu o prêmio de interpretação no Festival de Moscou.

Seguem-se mais quatro grandes interpretações em: “Depois do Amor”, de Diane Kurys; “Amateur”, de Hal Hartley e “A Separação", de Christian Vincent, culminando com “Mulheres Diabólicas” de (quem mais?) Chabrol, claro, com o qual ela ganhou sua segunda Copa Volpi e o primeiro (e até o momento único) César.

Após trabalhar com os Irmãos Taviani (Afinidades Eletivas) e novamente Chabrol (Negócios à Parte), filmes que podem ser considerados menores na carreira desses grandes diretores, segue-se uma fase de altos e baixos, na qual muitos títulos ficaram inéditos no Brasil.

Filma três vezes seguidas com Benoit Jacquot, mas a julgar pelos dois primeiros ele é um diretor muito frio e impessoal. Mas “A Escola da Carne” tem pelo menos um atrativo: é um dos filmes onde ela está mais linda e sensual.

“Saint-Cyr”, de Patricia Mazuy, é um belo filme histórico, no qual Isabelle é Mme. De Maintenon, última esposa de Luis XIV e criadora dessa instituição para meninas de fino trato.

“Os Destinos Sentimentais” apesar de visualmente deslumbrante é por demais acadêmico, e Isabelle aparece pouco.

Outro grande Chabrol, “A Teia de Chocolate”, com um final antológico (as lágrimas descendo pelo rosto dela).

Depois de ingressar no estranho universo do chileno radicado na França Raoul Ruiz, “A Comédia da Inocência”, surge outro momento de consagração.

Como Erika Kohut, uma austera professora de música do Conservatório de Viena, na faixa dos 40 anos e que mora com a mãe possessiva (Annie Girardot), com quem tem uma relação conturbada, e acaba tendo um relacionamento sado-masoquista com um aluno bem mais jovem, Isabelle ganhou sua segunda Palma de Ouro em Cannes. Merecidamente, pois seu papel em “A Professora de Piano” é dos mais complexos e difíceis, que poderia ter caido na caricatura nas mãos de outra atriz.

Pode-se dizer que seja caricatural a composição de sua personagem em “Oito Mulheres”, mas é condizente com o tom assumidamente camp definido pelo diretor François Ozon. E o elenco é uma constelação de estrelas francesas: Isabelle, Catherine Deneuve, Emmanuelle Béart, Fanny Ardant, Danielle Darrieux, Virginie Ledoyen, Ludivine Sagnier, Firmine Richard.

Já seu segundo filme com o diretor Michael Haneke, “Le Temps du Loup”, não foi tão bem sucedido. Um drama metafórico, enigmático, mas insatisfatório, sobre um grupo de pessoas, num espaço/tempo indefinido, que aguardam a chegada de um trem que as levará não se sabe para onde.

“Ma Mère”, do novo queridinho da crítica, Christophe Honoré, é baseado no livro póstumo e autobiográfico de Georges Bataille. Feito com o intuito de chocar, tem várias cenas escatológicas características da obra do autor de “O Ânus Solar”, mas sem alcançar sua poesia. Pura perfumaria.

“I Love Huckabees” é uma deliciosa comédia, na qual David O. Russell trata de seu tema preferido: as neuróticas relações humanas. E Isabelle participa de uma cena de sexo na lama digna daquela entre Paulo César Pereio e Maria Lucia Dahl em “O Bom Marido”, de Antonio Calmon.

“Gabrielle”, adaptação de “The Return”, de Joseph Conrad, tem toda a suntuosidade que se espera de uma obra de Patrice Chéreau, e um grande duelo de interpretação entre Isabelle e Pascal Greggory, mas é árido e muito verborrágico.

Em 2007 os “Huppertmaníacos” tiveram a felicidade de ver 2 filmes da musa na tela grande. O primeiro, “A Comédia do Poder”, sua sétima colaboração com Chabrol, trata de um tema comum para nós brasileiros: a corrupção nas altas esferas do poder. Para a lista de melhores lançamentos do ano.

O outro é o drama belga “Propriedade Privada”, de Joachim Lafosse. Um filme denso, mas pouco envolvente.

E ela já está com cinco novos filmes prontos para estrear ou em fase de produção, entre os quais uma adaptação de “Barragem Contra o Pacífico”, de Marguerite Duras, dirigida por Rithy Pahn. Seus fãs brasileiros imploram para que nossas distribuidoras lancem esses filmes nos cinemas.

Filmografia:

UMA LÁGRIMA, UM AMOR (FAUSTINE OU LE BEL ÉTÉ). Dir.: Nina Companeez. 1971
CÉSAR E ROSALIE (CÉSAR ET ROSALIE). Dir.: Claude Sautet. 1972
LE BAL DE LA FOURCHE. Dir.: Alain Levent. 1972
OS CORAÇÕES LOUCOS (LES VALSEUSES) Dir.: Bertrand Blier. 1973
L'AMPÉLOPÈDE. Dir.: Rachel Weinberg. 1973
GLISSEMENTS PROGRESSIFS DU PLAISIR. Dir.: Alain Robbe-Grillet. 1973
SETEMBRO NEGRO (ROSEBUD). Dir.: Otto Preminger. 1974
ALOISE. Dir.: Liliane de Kermadec. 1975
LE GRAND DELIRE. Dir.: Dennis Berry. 1975
SERIEUX COMME LE PLAISIR. Dir.: Robert Benayoun. 1975
O CASO DA MENINA VIOLENTADA (DUPONT LAJOIE) Dir.: Yves Boisset. 1975
DOCTEUR FRANÇOISE GAILLAND. Dir.: Jean-Louis Bertuccelli. 1975
JE SUIS PIERRE RIVIERE Dir.: Christine Lipinska. 1975
LE PETIT MARCEL Dir.: Jacques Fansten. 1975
LE JUGE ET L'ASSASSIN. Dir.: Bertrand Tavernier. 1975
UM AMOR TÃO FRÁGIL (LA DENTELLIÈRE). Dir.: Claude Goretta. 1976
LES INDIENS SONT ENCORE LOIN. Dir.: Patricia Moraz. 1977
DES ENFANTS GATES Dir.: Bertrand Tavernier. 1977
VIOLETTE NOZIÈRE Dir.: Claude Chabrol. 1978
RETOUR A LA BIEN AIMEE Dir.: Jean-François Adam. 1978
LES SOEURS BRONTE Dir.: André Téchiné. 1978
LOULOU Dir.: Maurice Pialat. 1979
O PORTAL DO PARAÍSO (HEAVEN’S GATE). Dir.: Michael Cimino. 1980
SALVE-SE QUEM PUDER – A VIDA (SAUVE QUI PEUT LA VIE) Dir.: Jean-Luc Godard. 1980
ORÖKSEG. Dir.: Marta Meszaros. 1980
A DAMA DAS CAMÉLIAS (LA STORIA VERA DELLA SIGNORA DALLE CAMELIE). Dir.: Mauro Bolognini. 1980
LES AILES DE LA COLOMBE. Benoit Jacquot. 1980
PASSION. Jean-Luc Godard. 1981
A LEI DE QUEM TEM O PODER (COUP DE TORCHON). Dir.: Bertrand Tavernier. 1981
A VÍTIMA POR TESTEMUNHA (EAUX PROFONDES). Dir.: Michel Deville. 1981
LA TRUITE. Joseph Losey. 1982
A HISTÓRIA DE PIERA (LA STORIA DE PIERA). Dir.: Marco Ferrerri. 1983
COUP DE FOUDRE. Diane Kurys. 1983
LA GARCE. Christine Pascal. 1983
LA FEMME DE MON POTE. Bertrand Blier. 1983
SIGNE CHARLOTTE. Caroline Huppert. 1984
SAC DE NOEUDS. Josiane Balasko. 1984
CACTUS. Paul Cox. 1985
UMA JANELA SUSPEITA (THE BEDROOM WINDOW). Dir.: Curtis Hanson. 1986
OS POSSESSOS (LES POSSEDES). Dir.: Andrezej Wajda. 1987
MILAN NOIR. Ronald Chammah. 1987
SEOBE. Alexander Petrovic. 1987
UM ASSUNTO DE MULHERES (UNE AFFAIRE DE FEMMES). Dir.: Claude Chabrol. 1988
A VINGANÇA DE UMA MULHER (LA VENGEANCE D'UNE FEMME). Dir.: Jacques Doillon. 1989
MALINA. Dir.: Werner Schroeter. 1990
MADAME BOVARY. Dir.: Claude Chabrol. 1990
DEPOIS DO AMOR (APRES L'AMOUR) Dir.: Diane Kurys. 1992
NAVODNENIYE. Igor Minaev. 1993
AMATEUR. Dir.: Hal Hartley. 1993
A SEPARAÇÃO (LA SEPARATION). Dir.: Christian Vincent. 1994
MULHERES DIABÓLICAS (LA CEREMONIE). Dir.: Claude Chabrol. 1995
AFINIDADES ELETIVAS (LE AFFINITÀ ELLETIVE). Dir.: Paolo e Vittorio Taviani. 1996
LES PALMES DE MONSIEUR SCHULTZ. Dir.: Claude Pinoteau 1997
NEGÓCIOS À PARTE (RIEN NE VA PLUS). Dir.: Claude Chabrol 1997
ABFALLPRODUKTE DER LIEBE. Dir.: Werner Schroeter. 1997
A ESCOLA DA CARNE (L'ECOLE DE LA CHAIR). Dir.: Benoit Jacquot. 1998
PAS DE SCANDALE. Dir.: Benoit Jacquot. 1998
LA FAUSSE SUIVANTE. Dir.: Benoit Jacquot. 1999
LA VIE MODERNE. Dir.: Ferreira Barbosa. 1999
SAINT-CYR. Dir.: Patrícia Mazuy. 2000
OS DESTINOS SENTIMENTAIS (LES DESTINEES SENTIMENTALES). Dir.: Olivier Assayas. 2000
A TEIA DE CHOCOLATE (MERCI POUR LE CHOCOLAT). Dir.: Claude Chabrol. 2000
A COMÉDIA DA INOCÊNCIA. (LA COMEDIE DE L'INNOCENCE) Dir.: Raoul Ruiz. 2001
A PROFESSORA DE PIANO (LA PIANISTE) Dir.: Michael Haneke. 2001
OITO MULHERES (HUIT FEMMES) Dir.: François Ozon. 2002
LA VIE PROMISE Dir.: Olivier Dahan. 2002
DEUX. Dir.: Werner Schroeter. 2002
LE TEMPS DU LOUP. Dir.: Michael Haneke. 2003
MA MÈRE. Dir.: Christophe Honoré. 2004
LES SOEURS FÂCHÉES. Dir.: Alexandra Leclère. 2004
A VIDA É UMA COMÉDIA (I HEART HUCKABEES). Dir.: David O. Russell. 2005
GABRIELLE. Dir.: Patrice Chéreau. 2005
A COMÉDIA DO PODER (L’IVRESSE DU POUVOIR). Dir.: Claude Chabrol. 2006
PROPRIEDADE PRIVADA (NUE PROPRIÉTÉ). Dir.: Joachim Lafosse. 2006




<< Capa