Musas Eternas...
PORQUE O QUE É BOM, É ETERNO...
Zezé Macedo – A mais bela face do cinema nacional
Que o cinema brasileiro tá assiiimmm de musas, todo mundo já sabe. Eu, que de bobo não tenho nada, até edito um site que, pretensiosamente, quer reunir todas elas. Quem me conhece um pouco mais sabe também que minha atriz brasileira predileta é a Isabel Ribeiro, essa estupenda atriz que o Brasil ainda não deu o devido reconhecimento. Mas hoje vou pedir licença à Isabel para homenagear outra do coração aqui na Zingu!, essa revista que gosto tanto e da qual me sinto honrado em participar. Seu nome: Maria José de Macedo; a nossa inesquecível Zezé Macedo.
Muito se fala em Oscarito e Grande Otelo – e é bom mesmo que falem, são gênios, mas nem sempre se fala nesse acontecimento cinematográfico que é Zezé Macedo. E esse, pelo menos para mim, é o grande trio cômico das chanchadas, mesmo que não formassem um – sem deixar de reverenciar, claro, todos os outros gigantes, como Zé Trindade, Ankito, Dercy, Golias, Renata Fronzi, Sônia Mamede, Costinha, Violeta Ferraz, Consuelo Leandro, Heloísa Helena, Nancy Wanderley, Nádia Maria, Vera Regina, e tantos mais.
Em delicioso verbete na Enciclopédia do Cinema Brasileiro, organizada pelos pesquisadores essenciais Fernão Ramos e Luiz Felipe Miranda, Afrânio Mendes Catani conta como esses gênios e mais o imprescindível cineasta Ivan Cardoso chamavam a atriz. Para Oscarito, Zezé era “a maior comediante do cinema brasileiro”. Para Grande Otelo, ela era o “Carlitos de saia”. Já Ivan Cardoso chamou-a de “Primeira Dama do Cinema Brasileiro”.
Com Oscarito, Zezé fez vários filmes, e, dentre eles, uma das chanchadas mais importantes e um clássico absoluto do cinema brasileiro: “O Homem do Sputnik” (1958), do mestre Carlos Manga. Quem não se lembra dos caipiras Anastácio e Cleci, cujo Sputnik cai em cima do galinheiro do casal? Ainda com Oscarito e Manga, tem outra atuação deliciosa como Madame Fru Fru em “De Vento em Popa” (1957).
Zezé Macedo nasceu em Silva Jardim, Rio de Janeiro, em 1916 – mas nunca gostou de revelar a idade. Apaixonada pela carreira artística desde criança, escrevia e lia poemas – na década de 1950 publica, com sucesso, livro de poesias, “Coração Profano” (1954). O começo da carreira foi no rádio lendo poemas e como rádio-atriz, primeiro na Rádio Tamoyo e depois na Rádio Tupi. Antes disso, havia se casado aos quinze anos, perde um filho aos 17, e separa-se do primeiro marido. Do rádio vai para TV e daí para o cinema, além dos trabalhos no teatro com Walter Pinto.
Zezé Macedo estréia no cinema em “O Petróleo é Nosso”, em 1954, dirigido por outro mestre, Watson Macedo. A partir daí não parou mais, atuando em dezenas de filmes e dirigida por nomes de diversas tendências como Lulu de Barros, Victor Lima, Roberto Farias, Darcy Evangelista, Eurípes Ramos, Joaquim Pedro de Andrade, Elyseu Visconti, Pedro Carlos Róvai, J.B. Tanko, Mozael Silveira, Victor di Mello, Bruno Barreto, Alberto Pieralisi, Alcino Diniz, Paulo César Saraceni, e muitos outros, além dos citados Watson Macedo, Carlos Manga e Ivan Cardoso – com esse último, nos deliciosos “As Sete Vampiras” e “O Escorpião Escarlate”.
Zezé Macedo ficou sempre associada como “a empregadinha do Brasil”, e, realmente, nenhuma atriz encarnou domésticas com tanta graça e malícia como ela. Mas Zezé fez muito mais que isso, foi patroa, foi cantora de ópera, foi solteirona, foi sogra, e muitas outras. Ainda nas chanchadas, sua presença nos filmes de Dercy Gonçalves também são deliciosas: como a Fifina em “A Grande Vedete” (1957), de Watson Macedo, como a Pancrácia em “Cala a Boca Etelvina” (1958), e como a Tia Melita em “Minervina Vem Aí” (1959), ambos de Hélio Barroso e Eurídes Ramos.
Só que Zezé Macedo não ficou apenas nas chanchadas. Como poucas atrizes do cinema brasileiro, ela marcou presença em quase todos os momentos do cinema brasileiro: Chanchada, Cinema Novo, Cinema Marginal, Pornochanchada, Cinema Popular, filmes dos Trapalhões, Cinema dos anos 80. E pode mostrar seu talento tanto em personagens com pitadas de malícia, com a ponta inesquecível em “Macunaíma” (1969), de Joaquim Pedro de Andrade, em que paquera o Macunaíma branco de Paulo José; como em papéis dramáticos, como a vizinha e amiga de Dina Sfat no delicado “Tati, A Garota” (1972), de Bruno Barreto.
Em sua filmografia, tem, inclusive, um filme que sou louco para ver: “Etéia, A Extraterrestre em Sua Aventura no Rio” (1983), de Roberto Mauro, em que faz a protagonista.
Eu jamais vou me esquecer do impacto que foi vê-la no curta-metragem “Jaguadarte” (1994), de André Klotzel, declamando versos de Lewis Carrol. Obra-prima absoluta do cinema nacional, um dos melhores curtas que nosso cinema já produziu – para mim está lado a lado com “Ilha das Flores” (1989), de Jorge Furtado; e “A Voz da Felicidade” (1987), de Nelson Nadotti, com a musa Isabel Ribeiro.
Para muitos também Zezé Macedo é sinônimo de mulher feia, horrível, uma prova declarada de olhos ignorantes. Eu a acho deslumbrante. Cinematograficamente deslumbrante. Adorava vê-la como Dona Bela e seu famoso bordão “só pensa naquilo” na “Escolinha do Professor Raimundo”, de Chico Anysio, com quem celebrizou também a personagem Biscoito. Como Dona Bela muitos também achavam que eram aparições esdrúxulas, de fim de carreira. Eu nunca achei. Adorava vê-la revirando os olhos e caída no chão de pernas para cima. Escracho total e maliciosa até o fim. Assistia ao programa só para vê-la.
Um dos meus sonhos é fazer uma exposição sobre Zezé Macedo, nos moldes daqueles retratos-ícones de Andy Warhol, com mil faces coloridas da atriz. Quero-a assim, olhando de frente para a cara desse país que muitas vezes quis fazer dela apenas uma caricatura, sem reconhecer a grande comediante e atriz que foi e é, pois eternizada nas telas, na telinha e no nosso imaginário. Outro sonho é escrever um livro sobre ela. Ainda hei de conseguir realizá-los.