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Musas Eternas...
PORQUE O QUE É BOM, É ETERNO...

Isabelle Adjani

Por Filipe Chamy

Isabelle Adjani tem un quoi.

Não são apenas seus luminosos olhos azuis, pois muitas mulheres esquecíveis têm olhos tão claros quanto. Não é apenas a sua boca, ainda que possuidora de indefinível perfeição e detentora de uma voz suave e bem-definida, que sopra sílabas com a paixão intensa de quem sussurra juras de amor ingênuo. Não é apenas o seu corpo esbelto e feminino. Não são apenas os seus cabelos sedosos e esvoaçantes. Não, nada disso explica o encanto de Isabelle Adjani. Uma definição simplista consagraria justamente o conjunto, o total de suas características, como explicador de sua magia. Mas tudo isso ainda é muito pouco, pois Isabelle Adjani é mais que a soma de seus atributos.

Isabelle nasceu em 27 de junho de 1955, em Paris. Sua beleza fulminante talvez venha da mistura pouco usual de um pai argelino muçulmano e uma mãe alemã protestante. Desde pequena se interessou por arte e virou atriz ainda antes dos dez anos, não profissionalmente, via teatro amador. Daí foi para a prestigiosa Comédie Française, relutante em seguir carreira cinematográfica. Sua estréia na tela se deu aos quatorze anos, em Le petit bougnat. Assim como Faustine et le bel été, vindo à luz dois anos mais tarde, não consegue muita repercussão. Então se volta para a televisão, aparecendo no esplendor de sua juventude em L’avare, L’école des femmes, Le secret des flamands e Ondine. Por essa altura Isabelle já era um rosto conhecido na França e vinha gozando de crescente atenção do público e da crítica.

Mas sem dúvidas seu grande pontapé inicial estava ainda por vir: O tapa, de Claude Pinoteau, produção que chama a atenção de ninguém menos que François Truffaut, que, encantado com a espontaneidade e graça de Isabelle, rapidamente a pede para participar de seu novo filme, A história de Adèle H., papel outrora prometido a Catherine Deneuve. Isabelle julga-se muito jovem para a tarefa (tinha dezenove anos) e receia abandonar suas origens artísticas. Após insistente convite, aceita. A escolha mostrou-se acertadíssima, pois Isabelle interpreta magnificamente um papel já difícil e muito complexo, uma atormentada filha de Victor Hugo, criação densa e provavelmente muito incômoda para uma jovem mulher, que viu sua beleza enclausurada numa roupagem de obsessão e tristeza. Personagem complicada até para veteranas, a Adèle Hugo de Isabelle é um retrato poderoso e preciso, marcante, nada caricatural e até doce em seu sereno desequilíbrio. O filme valeu uma inesperada indicação de Isabelle ao Oscar de melhor atriz, pouco após completar vinte anos de vida. Isabelle não ganhou, mas é reconhecida nos Estados Unidos e na Europa como uma atriz muito promissora.

O filme seguinte seria outra obra-prima insuperável, O inquilino, o melhor de Roman Polanski. Completamente metamorfoseada, Isabelle vive Stella, garota de aparência desleixada e comportamento mais bizarro ainda. Brilhante thriller psicológico, o filme foi mais uma etapa de solidificação de Isabelle rumo à consagração, ou pelo menos ao estrelato. Em seguida, Barroco, de André Téchiné. O filme não é brilhante como os dois anteriores, mas é sem dúvidas muito interessante e bem realizado, um intrincado romance semi-metafísico, e a primeira vez que Isabelle contracenou com o habitual Gérard Depardieu. Os próximos filmes seriam os pouco comentados Ensina-me a roubar e Caçador de morte, movimentado trabalho de Walter Hill em que Isabelle divide a cena com Ryan O’Neill.

O próximo passo de Isabelle será sempre lembrado pelos seus admiradores como um de seus ápices artísticos, Nosferatu – O vampiro da noite, excepcional remake de Werner Herzog vindo da não menos maravilhosa obra do grande F. W. Murnau. Isabelle brilha como Lucy Harker, pálida e frágil mulher, criação que beira o etéreo e que não atiçou a libido apenas do Drácula vivido por Klaus Kinski. Isabelle fala em alemão no filme, língua que domina totalmente.

Isabelle voltaria a dar uma performance sob a batuta de André Téchiné, fazendo uma d'As irmãs Brontë ao lado de Marie-France Pisier (que já havia encontrado em Barroco) e Isabelle Huppert. Tanto Barroco como As irmãs Brontë foram fotografados por Bruno Nuytten, com quem Isabelle se envolveria, apaixonaria e teria um filho, Barnabé, nascido nesse movimentado ano de 1979 e que hoje é músico profissional.

Em 1981, gravaria quatro filmes. Clara et les chics types, pouco conhecido e visto, é o primeiro. O segundo é o clássico Possessão, de Andrzej Zulawski, filme que lhe valeu o primeiro de seus quatro César (Isabelle é a única atriz a ganhar quatro troféus do prêmio) e que foi novamente fotografado por Nuytten. Marco do drama moderno de horror, Possessão conta com magnética e assombrosa interpretação de Isabelle, em um papel duplo e extremo, num filme não recomendável a pessoas com estômagos mais sensíveis. Mas altamente indicado a todos de bom gosto que queiram ver beleza na tela (cinematográfica e feminina). Depois Isabelle apareceu em Quarteto, filme dirigido por James Ivory que também lhe rendeu, juntamente com Possessão, o troféu de melhor atriz no Festival de Cannes. Por fim, L’année prochaine... si tout va bien é o quase anônimo entre os grandes momentos de Isabelle nesse ano.

No ano seguinte Isabelle faz dois filmes, sendo um deles Antonieta, do aclamado diretor espanhol Carlos Saura. Isabelle foi dublada e contracena com Hanna Schygulla, fazendo a mexicana do título, trágica figura que se suicida em meio à conturbada cena política da primeira metade do século XX. O outro trabalho que fez em 1982 foi Tout feu, tout flamme, primeira parceria de Isabelle com Jean-Paul Rappeneau, obra repleta de nomes famosos, que aparentemente não fez muito sucesso.

Os próximos filmes confirmariam Isabelle não apenas como uma grande estrela de apelo, mas uma importante musa do cinema internacional. Ronda mortal, de Claude Miller, é uma espécie de pastiche neo noir, co-estrelado por Michel Serrault. Verão assassino é o clímax de sua sensualidade; o filme assinado por Jean Becker configuraria Isabelle em praticamente apenas dois modelitos: trajes sumários e provocantes (e extremamente vulgares), e absolutamente nada. Sim, Isabelle passa boa parte do filme totalmente ao natural, em espetacular forma física, um furacão de proporção mignone mas incontestavelmente deslumbrante. Ganha seu segundo César, nesse imenso sucesso de bilheteria (e alvo de críticas de Jean-Luc Godard).

Versátil, Isabelle não é apenas uma excelente e lindíssima atriz, mas uma verdadeira artista multimídia: em 1983, grava um disco com composições suas e de Serge Gainsbourg, Pull marine. O álbum foi um hit de vendas, e Isabelle gravou clipes e participações em shows e programas de TV, alcançando popularidade extraordinária. Talvez devido à sua requisitada agenda, fica sem filmar no ano seguinte. Reaparece em 1985, no decepcionante Subway, obra menor que vale acima de tudo pela beleza de Isabelle, já que o filme em si é outra mediocridade advinda dos sempre duvidosos gostos de Luc Besson, seu realizador.

Em 1987, após aparecer no ano anterior em Você tem belas escadarias, sabia?, curta de Agnès Varda que retoma uma cena de Adèle H., Isabelle atua no mega fracasso holywoodiano Ishtar, de Elaine May (vencedora do Framboesa de Ouro pelo desempenho), em que aparece ao lado de Dustin Hoffman e Warren Beatty. Apesar de não ser tão pavoroso e grotesco como costumam defini-lo, é de fato uma fita fraca, aquém dos dotes de Isabelle. Curiosamente ela emenda um projeto que seria elogiadíssimo no mundo inteiro, Camille Claudel. Com direção de Bruno Nuytten e novamente atuando com Depardieu. Baseado em fatos reais, o filme conta a triste saga de degradação amorosa da personagem-título, vivida com intensidade louvável por Isabelle. O filme lembra A história de Adèle H. em alguns pontos. Urso de Prata de melhor atriz em Berlin, terceiro César de Isabelle e segunda indicação ao Oscar. Isabelle, aliás, é a única intérprete de língua francesa a ser indicada mais de uma vez ao Oscar. O belo trabalho de Nuytten também foi indicado à estátua de filme estrangeiro. Novo boom de popularidade para a francesinha, que é capa de inúmeras revistas mundo afora e agora também é bastante solicitada para eventos como modelo. Um fenômeno.

Depois de tantos filmes sensacionais, Isabelle Adjani entra em um período de estagnação, iniciado com Toxic affair e que dura até os dias atuais. De todos os filmes que fez desde então, os únicos realmente dignos de nota são A rainha Margot, êxito de Patrice Chéreau (o quarto e último César de Isabelle), bem cotada reconstituição de época, e Viagem do coração, seu segundo filme com Jean-Paul Rappeneau e terceiro com Gérard Depardieu. Também fez Diabolique (malfadado remake de Clouzot, com Sharon Stone, amiga pessoal de Isabelle), La repentie, Adolphe e uma participação especial em Uma amizade sem fronteiras. Seu último trabalho foi Figaro, telefilme produzido em 2008 e ainda inédito por estas bandas.

Atualmente Isabelle dedica-se mais ao teatro e à sua vida privada, passando bom tempo com seus dois filhos, Barnabé e Gabriel. Gabriel Kane Day-Lewis é fruto de um conturbado relacionamento com o ator inglês Daniel Day-Lewis, num dos mais rumorosos e explorados casos de sua intimidade; os boatos são incontáveis, incluindo o suposto rompimento de Day-Lewis, notificando pelo telefone uma transtornada Isabelle que não queria mais nada com ela. Ela concebeu a criança após a separação e aparentemente tem uma relação fria e cordial com seu ex-companheiro. Foi um período difícil e depressivo em sua vida, superado à custa de uma tremenda força de vontade e amor pela profissão e pela vida.

François Truffaut dizia a Isabelle: “nossa vida é um muro, cada filme é uma pedra”. Isabelle respondia: “não é verdade, cada filme é o muro”. Pois Isabelle Adjani possui a inteligência necessária para entender que os obstáculos não são intransponíveis, basta ter a sensatez de não querer ultrapassá-los, mas simplesmente contorná-los.

DESTAQUES DE ISABELLE ADJANI NO YOUTUBE:

Pull marine – O clipe da música-tema do álbum musical gravado por Isabelle; dirigido por Luc Besson
http://www.youtube.com/watch?v=c48PLBNzUGw

• Isabelle, irritada e ao vivo, desmentindo na televisão francesa boatos de que havia morrido de AIDS; sua opção por uma vida pessoal fora dos holofotes sempre lhe rendeu a especulação da imprensa sensacionalista
http://www.youtube.com/watch?v=BZ2d_EyNc2g

• Comercial do sabonete Lux estrelando Isabelle; o vídeo está apenas disponível em versão dublada em italiano
http://www.youtube.com/watch?v=YQErdxPDqf8

• Curtíssima propaganda anunciando um produto de marca Woolite
http://www.youtube.com/watch?v=uug5JlGEXdM&feature=related

• Isabelle na cerimônia do Oscar em 1990; ela concorria por Camille Claudel
http://www.youtube.com/watch?v=KFCn1G8epPE

• Campanha beneficente apoiada por Isabelle
http://www.youtube.com/watch?v=DGmeTuCOa7s&feature=related

• Isabelle aos 19 anos, atuando e cantando uma música escrita para ela por Serge Gainsbourg
http://www.youtube.com/watch?v=_i78R9I9t_o

• Também disponível no YouTube: clipes de todas as demais músicas de Pull marine e trailers e cenas dos principais filmes de Isabelle Adjani

FILMOGRAFIA DE ISABELLE ADJANI:

2008 – Figaro (TV)
2003 – Viagem do coração (Bon voyage)
2003 – Uma amizade sem fronteiras (Monsieur Ibrahim et les fleurs du Coran)
2002 – Adolphe
2002 – La repentie
1996 – Diabolique
1994 – A rainha Margot (La reine Margot)
1993 – Toxic affair
1988 – Camille Claudel
1987 – Ishtar
1986 – Você tem belas escadarias, sabia? (T’as de beaux escaliers tu sais)
1985 – Subway
1983 – Verão assassino (L'été meurtrier)
1983 – Ronda mortal (Mortelle randonnée)
1982 – Antonieta
1981 – Tout feu, tout flamme
1981 – L’année prochaine... si tout va bien
1981 – Quarteto (Quartet)
1981 – Possessão (Possession)
1980 – Clara et les chics types
1979 – As irmãs Brontë (Les soeurs Brontë)
1979 – Nosferatu, o vampiro da noite (Nosferatu: phantom der nacht)
1978 – Caçador de morte (The driver)
1976 – Ensina-me a roubar (Violette et François)
1976 – Barroco (Barocco)
1976 – O inquilino (Le locataire)
1975 – A história de Adèle H. (L'histoire d'Adèle H.)
1975 – Ondine (TV)
1974 – O golpe (La gifle)
1974 – Le secret des flamands (TV)
1973 – L'école des femmes (TV)
1973 – L’avare (TV)
1971 – Faustine et le bel été
1969 – Le petit bougnat




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