Fragmentos Literários
Por Stefanie Gaspar
Moralidade é estética
Alguns livros nos deliciam pela sensibilidade e criatividade do autor, mesmo que sua linguagem ou sua técnica literária não nos impressione – caso de Milan Kundera, que reúne em A Insustentável Leveza do Ser passagens belíssimas por sua sensibilidade, embora nada em sua literatura, em termos de personagens ou narrativas, seja memorável. Outros livros podem nos cativar pela união perfeita entre forma e conteúdo – Borges, com sua imensa erudição que, entretanto, não o sufoca, consegue resumir em pequenas frases e contos um conteúdo riquíssimo em uma forma exemplar. E outros escritos nos atingem, principalmente, por sua peculiaridade que, em ironia infinita, desafiam seus leitores a suspenderem seus preconceitos e entrar na ética da amoralidade artística. Entre esses, Oscar Wilde não encontra rivais.
Contrariando a moralidade vitoriana e criando um novo ideal artístico, o movimento dos “estetas” defendia a arte pela arte, sem qualquer conotação moral ou política que pudesse consistir em um obstáculo para a expressão. Se Oscar Wilde foi o maior expoente desse movimento, o foi mais por confluência de idéias do que por engajamento – suas obras, principalmente peças como Lady Windermere’s Fan e The Importance Of Being Earnest, trazem personagens marcados por falas que, dentro do universo do autor, são jocosas e divertidas ao extremo, e que mostram em si uma irreverência marcada pela ironia, em vez do engajamento estético a uma causa específica.
A linguagem dos estetas era marcada pelos exageros, que retratavam um mundo imperfeito e “impuro”, totalmente deformado pelo caráter naturalmente corrupto do ser humano. Nas obras de Oscar Wilde, esses exageros, mais do que características de um mundo tragicamente marcado pela perdição, há um divertimento próprio – a futilidade das personalidades de Gwendolen e Cecily em The Importance Of Being Earnest é mais curiosa e irreverente do que trágica, e os excessos melodramáticos dessa peça nos trazem a certeza de que, mais do que nós, quem se diverte é Wilde, criando personagens aparentemente tão absurdos e situações tão insólitas. Por outro lado, outros momentos de excesso levam o leitor aos extremos da obra do escritor irlandês: a estética carregada de sexualidade e exageros simbólicos de Salomé e a decadência trágica de O Retrato de Dorian Gray (curiosamente, quanto mais o protagonista de Wilde aproxima-se de seu fim, mais a escrita do livro torna-se maravilhosa).
Como dândi e poeta, Oscar Wilde criou, mais que um mito, uma obra singular. Na introdução de O Retrato de Dorian Gray, Wilde diz que o objetivo da arte é revelar a si mesma e esconder o artista. Talvez por sua vida atribulada (sendo preso por homossexualismo e arruinado por seu amante, Lord Alfred Douglas), a obra de Wilde fique à sombra do mito de sua personalidade, escondendo o que talvez seja seu maior atributo: não apenas uma arte pela arte, mas uma arte livre de seu peso moral e didático. Uma arte que brinca, que ironiza, que experimenta (no conteúdo, não na forma, bastante simples em quase todos seus escritos), que ousa, que se diverte consigo mesma. E nem por isso deixa de ser profunda e inteligente: em Lady Windermere’s Fan, Wilde termina a peça fazendo com que o espectador, onisciente, possua todas as informações e conheça todas as personagens, enquanto que estes possuem apenas informações fragmentadas sobre as próprias vidas. A Woman Of No Importance termina com uma ironia triunfal: a mulher, abandonada pelo amante, pode finalmente reverter seu destino e falar que ele, na verdade, é um “homem de nenhuma importância”. Estas e outras características inesquecíveis mostram uma arte engajada apenas pelo desejo de ser, em um mundo com milhares de outras obras, sentenças e palavras, uma perfeição em si mesma. De trazer, com sua harmonia, um prazer atemporal. Como diz Borges em Outras Inquisições: “Wilde é daqueles felizardos que podem prescindir da aprovação da crítica e mesmo, às vezes, da aprovação do leitor, pois o prazer que nos proporciona o trato com ele é irresistível e constante”.
Contrariando a moralidade vitoriana e criando um novo ideal artístico, o movimento dos “estetas” defendia a arte pela arte, sem qualquer conotação moral ou política que pudesse consistir em um obstáculo para a expressão. Se Oscar Wilde foi o maior expoente desse movimento, o foi mais por confluência de idéias do que por engajamento – suas obras, principalmente peças como Lady Windermere’s Fan e The Importance Of Being Earnest, trazem personagens marcados por falas que, dentro do universo do autor, são jocosas e divertidas ao extremo, e que mostram em si uma irreverência marcada pela ironia, em vez do engajamento estético a uma causa específica.
A linguagem dos estetas era marcada pelos exageros, que retratavam um mundo imperfeito e “impuro”, totalmente deformado pelo caráter naturalmente corrupto do ser humano. Nas obras de Oscar Wilde, esses exageros, mais do que características de um mundo tragicamente marcado pela perdição, há um divertimento próprio – a futilidade das personalidades de Gwendolen e Cecily em The Importance Of Being Earnest é mais curiosa e irreverente do que trágica, e os excessos melodramáticos dessa peça nos trazem a certeza de que, mais do que nós, quem se diverte é Wilde, criando personagens aparentemente tão absurdos e situações tão insólitas. Por outro lado, outros momentos de excesso levam o leitor aos extremos da obra do escritor irlandês: a estética carregada de sexualidade e exageros simbólicos de Salomé e a decadência trágica de O Retrato de Dorian Gray (curiosamente, quanto mais o protagonista de Wilde aproxima-se de seu fim, mais a escrita do livro torna-se maravilhosa).
Como dândi e poeta, Oscar Wilde criou, mais que um mito, uma obra singular. Na introdução de O Retrato de Dorian Gray, Wilde diz que o objetivo da arte é revelar a si mesma e esconder o artista. Talvez por sua vida atribulada (sendo preso por homossexualismo e arruinado por seu amante, Lord Alfred Douglas), a obra de Wilde fique à sombra do mito de sua personalidade, escondendo o que talvez seja seu maior atributo: não apenas uma arte pela arte, mas uma arte livre de seu peso moral e didático. Uma arte que brinca, que ironiza, que experimenta (no conteúdo, não na forma, bastante simples em quase todos seus escritos), que ousa, que se diverte consigo mesma. E nem por isso deixa de ser profunda e inteligente: em Lady Windermere’s Fan, Wilde termina a peça fazendo com que o espectador, onisciente, possua todas as informações e conheça todas as personagens, enquanto que estes possuem apenas informações fragmentadas sobre as próprias vidas. A Woman Of No Importance termina com uma ironia triunfal: a mulher, abandonada pelo amante, pode finalmente reverter seu destino e falar que ele, na verdade, é um “homem de nenhuma importância”. Estas e outras características inesquecíveis mostram uma arte engajada apenas pelo desejo de ser, em um mundo com milhares de outras obras, sentenças e palavras, uma perfeição em si mesma. De trazer, com sua harmonia, um prazer atemporal. Como diz Borges em Outras Inquisições: “Wilde é daqueles felizardos que podem prescindir da aprovação da crítica e mesmo, às vezes, da aprovação do leitor, pois o prazer que nos proporciona o trato com ele é irresistível e constante”.