Coluna do Biáfora
Por Rubem Biáfora, artigo selecionado por Sergio Andrade
E A VACA FOI PRO BREJO
Por Rubem Biáfora, artigo selecionado por Sergio Andrade
“Em 1974/75, quando estava no auge o fenômeno Mazzaroppi, ao que cremos o único no mundo (fora os casos não tão totalizantes de Luis Sandrini na Argentina ou o posterior de Cantinflas, no México. Nem Greta Garbo, Marlene Dietrich, Katharine Hepburn ou Bette Davis, Michele Morgan, Anna Magnani ou Brigite Helm tiveram os apoios tão irrestritos de programação, açambarcamento e alijamento de outras tendências, com os maiores circuitos à disposição, garantias prévias de lançamento, data fixa e permanência pré-marcada e antecipada, em seus países de mitologia, força ou origem, por mais de um quarto de século), afora a tentativa, logo interrompida de Ary Fernandes com seu Chico Fumaça, houve quem pensasse em lançar novo tipo de sertanejo para conquistar algum potencial desse tipo de público ou preferência. E com “O Ladrão de Galinhas”, surgiu o personagem de Chico Raposa, interpretado por Wilson Roncatti. E este revelou-se dotado de muitas qualidades de naturalidade, simpatia e tipo para o mister. Agora, o diretor-produtor José Adalto Cardoso retoma Roncatti, rebatizado como Polêncio (o folclore da “Boca” espalha que é porque o ator adora polenta com frango ao molho) e vivendo mais uma dessas aventuras, na qual um malandro da cidade (Diogo Angélica) tenta envolver o simplório matuto num “golpe” que pretende dar na região. No final, tudo se esclarece: o diretor Adalto declara que procurou dar também um toque de boa vizinhança e integração japonesa na história e elenco, porque tem muita simpatia pela colônia. Ótimo. Agora, apesar de o circuito e a campanha publicitária terem sido insuficientes, esperemos que a iniciativa vingue. E que Polêncio – Adalto aqui consiga o que Mazzaroppi nunca pensou em tentar, o que os filmes sertanejos de Tonico & Tinoco, do incrível Teixeirinha, de Galante & Palácios com Nhá Barbina e Florentino Llorente nunca lograram, o que nem mesmo contrariando nossas simpáticas expectativas conseguiu Nelson Pereira dos Santos, com “Estrada da Vida”, filmes sobre o sertão, que lembrem a pintura de nossos ingênuos artistas acadêmicos, que mostrem o real folclore, as festas de São João e São Pedro, as quermesses, as assombrações, as rivalidades de comadres e de beatas em tornos de segredos de culinária caipira e medicina caseira, os moralismos e as superstições, o perdoável pendant dos matutos para a conversinha de boteco e de botica, as ingenuidades em torno dos “senhores doutores” e politiqueiros, as caçadas, as pescarias, os sonhos e o receio de celibato das meninas recatadas e casadouras, toda uma humanidade que nosso cinema (salvo momentos e figuras esporádicos) jamais registrou. E aqui estamos para servi-los desinteressada e prazeirosamente, em tudo que quiserem e for necessário.”
*Publicado originalmente no “O Estado de S. Paulo” de 13 de dezembro de 1981.
*Publicado originalmente no “O Estado de S. Paulo” de 13 de dezembro de 1981.