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Dossiê John Wayne

Hatari!
Direção: Howard Hawks
Idem, EUA, 1962.

Por Ailton Monteiro, especialmente para a Zingu!

É impossível não ficar em estado de êxtase depois de uma sessão desse que eu considero um dos melhores filmes do mundo, a maior aventura já filmada. HATARI! conquista o espectador das mais variadas maneiras, seja nos momentos de humor, de ternura, de medo, ou de romance. Fico impressionado com o fato de o filme ter uma duração de 157 minutos e não cansar em momento algum. Ao contrário, quando termina, dá até uma pontinha de tristeza porque já acabou.

A primeira seqüência de HATARI! é de deixar qualquer pessoa de queixo caído. Nela, o grupo liderado por John Wayne caça um rinoceronte. Quando vi o animal atacando ferozmente os jipes do grupo, tive um sobressalto. Essa cena é fantástica. Se fosse feita nos dias de hoje, teríamos que nos contentar com efeitos de computação gráfica, resultando em perda de realismo. Imagina-se de início que o tom geral do filme será de tragédia, já que um dos personagens fere-se gravemente com o ataque do rinoceronte logo no começo do filme. Mas logo a alegria toma conta dos personagens e do espectador e nos vemos diante de um autêntico Hawks. As interações entre os personagens são entrecortadas pelas sempre empolgantes cenas de capturas dos animais. Destaque para os filhotes de elefante que Dallas (a personagem de Anna Maria D'Allessandro) insiste em cuidar, apesar dos protestos de Sean (John Wayne), que dizia que daria muito trabalho alimentar os bichos, além de custar muito caro. Sempre que os elefantes aparecem, ouvimos uma agradável música de Henry Mancini.

Quanto a Anna Maria D'Allesandro, interessante notar a habilidade de Hawks em fazer com que atrizes pouco conhecidas ganhem grande visibilidade, tornando-se ainda mais belas e atraentes. Recentemente, tive a chance de ver algo parecido na performance graciosa de Paula Prentiss, outra atriz pouco conhecida, em O ESPORTE FAVORITO DOS HOMENS (1964). A personagem Dallas, interpretada pela bela D'Allesandro, é uma autêntica mulher hawksiana e HATARI! é um dos filmes mais arquetípicos do cineasta. Há o distanciamento ou ausência da família, os apelidos como forma de se desvincular das raízes familiares, o forte elo de amizade entre os homens, as mulheres deliciosamente atiradas etc. A diferença é que Hawks parece estar muito mais à vontade para expressar suas emoções. Em vários momentos do filme - principalmente na cena final, muitas vezes repetida em várias comédias românticas, tendo se tornado até um clichê - essa emoção é exacerbada. Pode-se ao mesmo tempo rir e chorar, por exemplo, no momento em que Sean vai atrás de Dallas.

Curioso que Hawks nem gostava tanto assim do filme, como pude ver na entrevista do livro "Afinal, Quem Faz os Filmes", de Peter Bogdanovich. Ele lamentava o fato de a Paramount não ter permitido um segundo protagonista por razões financeiras - ele queria Clark Gable. Hawks dizia que Wayne sempre tinha melhores performances quando trabalhava com outro grande astro, como havia acontecido com RIO VERMELHO (1948), quando ele atuou ao lado de Montgomery Clift, e em RIO BRAVO (1959), ao lado de Dean Martin. Obviamente, com dois protagonistas, o filme ficaria bem diferente. Outra curiosidade é que as cenas de captura dos animais estavam sujeitas às reações dos bichos. Nas palavras do próprio Hawks: "não se pode ficar sentado num escritório e escrever o que um rinoceronte vai fazer." Eis um homem sábio.

Ailton Monteiro é cinéfilo de carteirinha e editor do blog Diário de Um Cinéfilo, premiado com o Quepe do Comodoro de melhor blog em 2004.



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