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Coluna do Biáfora


A BATALHA DOS GUARARAPES

Por Rubem Biáfora, artigo selecionado por Sergio Andrade


“Claro que o intenso preconizar do filme patriótico, do “espetáculo histórico” ou “adaptação literária de autor morto” de maior custo e para o qual naturalmente seriam carreados e doados maiores dividendos e proventos oficiais e oficiosos, surgindo há uns oito anos num ambiente tão apregoadamente “polêmico” (entre aspas mesmo) como o tipo de cinema brasileiro que já então ditava a moda e as cartas no antigo INC e adjacências é um enigma não muito enigmático, uma espécie de brincadeira ou maquiavelismo, cunho nitidamente franquista, à qual (será mesmo que sem perceber?) logo foram aderindo os “mariposas” na realidade pouco convictas da carioca geração Paissandu ou da paulistana “Boca do Lixo”. Desse mal, entretanto, não se pode acusar Paulo Thiago, que sempre em suas obras demonstrou um gosto pessoal pelos épicos (embora não fosse bem esse o caso de “Os Senhores da Terra”, seu filme de estréia) ou pelas adaptações literárias ou semi-históricas como “Sagarana, o Duelo”, de Guimarães Rosa ou o aqui ainda inédito “Soledade”, baseado na “Bagaceira”, de José Lins do Rego. Pois o desvelo nacionalista de Thiago encontrou sua recompensa: um financiamento de 2 milhões de dólares (porque não preferir dizer 35 milhões de cruzeiros?) para este episódio decisivo da derrota da ocupação holandesa no Brasil que é “A Batalha dos Guararapes”. Certo, já tivemos outros precedentes em matéria de cinema “superpúblico” de cinema grandes gastos. E não foi só a formação peculiar de Oswaldo Massaini com seu inefável “Independência ou Morte” o único exemplo. Já a veteraníssima Carmen Santos havia labutado dez anos com o que veio a ser uma frustrante “Inconfidência Mineira” em 1948, mais ou menos. Ao fenômeno também não ficaram infensos os que mais o deveriam: os expoentes do “cinema novo”, sem falar no carro-chefe Luiz Carlos Barreto, que pelo visto só esperava o momento para relegar a nobre pobreza da “idéia na cabeça e câmera na mão”. “Guararapes” porém, é investimento e crença de particulares. E todos os cinemas do mundo a tem praticado. Só que muito raramente dessa ambição ao acachapante, ao previamente garantido consegue da Sétima Arte uma proeza essencialmente cinemática e artística, além de verdadeiramente contestadora, como por exemplo o “Faraó” polonês de Jerzy Kawalerowicz. Entretanto, confiando nos recursos de roteiro, fotografia etc., entre os quais encontramos o experiente Armando Costa, o Gustavo Dahl de “O Bravo Guerreiro”, os sempre potenciais Renato Neuman e Miguel Borges, o bem intencionado Marcos Farias, o técnico italiano Batistelli, o convicto Thiago além da sensibilidade de Renée de Vielmond e da forma, como Nassau, Jardel Filho poderá ter repetido seu acerto como o gigante italiano de “Macunaíma” e da propriedade que o teuto-brasileiro Nildo Parente, ótimo em “O Seminarista” poderá ter dado ao seu General Von Schikop esperemos que “A Batalha dos Guararapes” seja um “super-espetáculo” bem sucedido.”

*Publicado originalmente no “O Estado de S. Paulo” de 24/09/78.



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