Cantinho do Aguilar...
Por Eduardo Aguilar
Por Eduardo Aguilar
Uma Criança por Testemunha
Direção: Eric Red
Cohen and Tate, EUA, 1989.
Com Roy Scheider e Adam Baldwin
O grande amigo Thomaz (blog Cine Elétrico) costuma me dizer que sonha em refilmar o clássico Cães Raivosos de Mario Bava, eu, se tivesse que escolher um único filme para refilmar, ele seria Uma Criança Por Testemunha.
O filme começa com um letreiro indicando que um garoto, testemunha da morte de um gangster, está sob proteção de agentes federais juntamente com sua família em uma casa isolada, enquanto isso, uma dupla de assassinos é enviada para seqüestrar o menino e entregá-lo ao chefão da máfia local, eliminando assim as eventuais testemunhas.
As primeiras imagens são estimulantes, elas instalam o “medo” junto ao espectador, a princípio vemos a casa isolada, em seguida um dos agentes e mais adiante notamos a postura estranha do segundo agente. O espectador pressupõe que algo irá acontecer, mas não consegue prever como e quem será o alvo atingido, até que repentinamente o garoto sai da casa atrás de seu cachorro, levando-nos a crer que está sob risco imediato, porém – com soluções sempre muito inteligentes, Eric Red nos surpreende, “esquecendo” o menino e nos conduzindo aos dois matadores que invadem a casa executando os pais e os agentes. Nesse instante surge a presença carismática de Roy Scheider, que é a essência da cena, vivendo um personagem com a necessária rigidez e aspereza de quem lida com assassinatos corriqueiramente, contudo, já se pode ver além disso, um olhar traduzindo insatisfação e niilismo, algo aparentemente impenetrável, mas ao mesmo tempo tão presente.
A seguir, já com o garoto em poder, os matadores empreenderão viagem para levá-lo ao chefão da máfia. O roteiro nunca deixa clara a importância que os gangsteres dão ao testemunho do garoto, a única ordem é para que o menino chegue vivo.
Como se trata de uma viagem longa, é a partir desse ponto que a trama começa de fato. É um filme de estrada, uma viagem noturna na alma daqueles dois matadores tão opostos em personalidade: Scheider é o experiente e intelectual Mister Cohen, que se incomoda muito com a figura do jovem precipitado e alienado Tate, interpretado por Adam Baldwin. Esse confronto é acentuado, à medida que o garoto se dá conta da fragilidade existente na relação dos assassinos e inicia um ‘jogo’ de provocações, desestabilizando a relação da dupla.
Muito silêncio; um tempo que parece ser despendido, mas preciso; cenas raras de interpretações intensas e uma dose ponderada de ação, fica praticamente impossível desgrudar os olhos da tela. Destaque para a cena em que Mister Cohen suspeita das intenções duvidosas de seu parceiro, e reluta contra o sono ao volante sob às ameaças de Tate, até o momento em que fazem uma parada para troca do pneu e Tate desaparece com o garoto seqüestrado, uma cena extremamente tensa. Difícil não pensar no clássico de Mario Bava: Cães Raivosos, se naquele o cinismo de Bava apontava para um niilismo impressionante diante da vida, nesse, ainda que em contexto muito diferente, o sentimento é inacreditavelmente igual. Sem contar a cena final, uma das mais impactantes que vi em minha vida cinéfila, não por sua capacidade de chocar visualmente, mas pela ousadia da encenação e da aproximação entre vida e morte em personagens extremos obrigados a aceitar e/ou rejeitar o que o outro representa, a saber: a vivacidade de um garoto e um homem na meia idade cansado de viver buscando a morte.
Não posso encerrar o texto, sem mencionar a cena em que Mister Cohen pára em frente uma caixa de correios no meio da estrada, contempla uma foto e anexa um pertence, encaminhado a um misterioso destino. Um acontecimento ao mesmo tempo enigmático, por velar a consideração daqueles objetos, sinaliza evidentemente um único destino para estes.
*texto revisado e publicado anteriormente no “falecido” site Erotikill
Direção: Eric Red
Cohen and Tate, EUA, 1989.
Com Roy Scheider e Adam Baldwin
O grande amigo Thomaz (blog Cine Elétrico) costuma me dizer que sonha em refilmar o clássico Cães Raivosos de Mario Bava, eu, se tivesse que escolher um único filme para refilmar, ele seria Uma Criança Por Testemunha.
O filme começa com um letreiro indicando que um garoto, testemunha da morte de um gangster, está sob proteção de agentes federais juntamente com sua família em uma casa isolada, enquanto isso, uma dupla de assassinos é enviada para seqüestrar o menino e entregá-lo ao chefão da máfia local, eliminando assim as eventuais testemunhas.
As primeiras imagens são estimulantes, elas instalam o “medo” junto ao espectador, a princípio vemos a casa isolada, em seguida um dos agentes e mais adiante notamos a postura estranha do segundo agente. O espectador pressupõe que algo irá acontecer, mas não consegue prever como e quem será o alvo atingido, até que repentinamente o garoto sai da casa atrás de seu cachorro, levando-nos a crer que está sob risco imediato, porém – com soluções sempre muito inteligentes, Eric Red nos surpreende, “esquecendo” o menino e nos conduzindo aos dois matadores que invadem a casa executando os pais e os agentes. Nesse instante surge a presença carismática de Roy Scheider, que é a essência da cena, vivendo um personagem com a necessária rigidez e aspereza de quem lida com assassinatos corriqueiramente, contudo, já se pode ver além disso, um olhar traduzindo insatisfação e niilismo, algo aparentemente impenetrável, mas ao mesmo tempo tão presente.
A seguir, já com o garoto em poder, os matadores empreenderão viagem para levá-lo ao chefão da máfia. O roteiro nunca deixa clara a importância que os gangsteres dão ao testemunho do garoto, a única ordem é para que o menino chegue vivo.
Como se trata de uma viagem longa, é a partir desse ponto que a trama começa de fato. É um filme de estrada, uma viagem noturna na alma daqueles dois matadores tão opostos em personalidade: Scheider é o experiente e intelectual Mister Cohen, que se incomoda muito com a figura do jovem precipitado e alienado Tate, interpretado por Adam Baldwin. Esse confronto é acentuado, à medida que o garoto se dá conta da fragilidade existente na relação dos assassinos e inicia um ‘jogo’ de provocações, desestabilizando a relação da dupla.
Muito silêncio; um tempo que parece ser despendido, mas preciso; cenas raras de interpretações intensas e uma dose ponderada de ação, fica praticamente impossível desgrudar os olhos da tela. Destaque para a cena em que Mister Cohen suspeita das intenções duvidosas de seu parceiro, e reluta contra o sono ao volante sob às ameaças de Tate, até o momento em que fazem uma parada para troca do pneu e Tate desaparece com o garoto seqüestrado, uma cena extremamente tensa. Difícil não pensar no clássico de Mario Bava: Cães Raivosos, se naquele o cinismo de Bava apontava para um niilismo impressionante diante da vida, nesse, ainda que em contexto muito diferente, o sentimento é inacreditavelmente igual. Sem contar a cena final, uma das mais impactantes que vi em minha vida cinéfila, não por sua capacidade de chocar visualmente, mas pela ousadia da encenação e da aproximação entre vida e morte em personagens extremos obrigados a aceitar e/ou rejeitar o que o outro representa, a saber: a vivacidade de um garoto e um homem na meia idade cansado de viver buscando a morte.
Não posso encerrar o texto, sem mencionar a cena em que Mister Cohen pára em frente uma caixa de correios no meio da estrada, contempla uma foto e anexa um pertence, encaminhado a um misterioso destino. Um acontecimento ao mesmo tempo enigmático, por velar a consideração daqueles objetos, sinaliza evidentemente um único destino para estes.
*texto revisado e publicado anteriormente no “falecido” site Erotikill