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Especial Cine Marabá

Sete Cineastas Falam Sobre o Cine Marabá

Por Matheus Trunk

Para conhecer melhor a evolução e a importância do Cine Marabá para a cultura paulistana, Zingu! mandou três perguntas sobre a sala para sete realizadores de várias gerações do cinema de São Paulo.

1. André Sturm, diretor de “Sonhos Tropicais” e “Bodas de Papel”.

Qual foi o primeiro filme que você viu no Marabá?
Corra que a Polícia Vem Aí.

Qual a importância dele para a cidade de São Paulo?

É um dos cinemas com maior tela e dos velhos tempos.

O que você acha do Marabá tornar-se multiplex?
Acho que é a situação atual. Mas lamento porque era um dos últimos cinemas tradicionais, de tela grande.

2. Guilherme de Almeida Prado, diretor de “A Dama do Cine Shangai”, “Perfume de Gardênia”, “Onde Andará Dulce Veiga?”, entre outros.

Qual foi o primeiro filme que você viu no Marabá?
Não consigo lembrar qual foi o primeiro. Não foi algo que me marcou. Me lembro sim, com uma certa tristeza, do último. Foi na estréia de um filme dirigido e estrelado por David Cardoso, acho que chamava O Dia do Gato, último roteiro escrito por Ody Fraga (que nos créditos saiu como Odir Fraga, deprimente...). Foi algo muito triste. O cinema já estava decadente e foi a última tentativa do David de fazer um filme nos moldes antigos e sem pornografia explícita. Claro que foi um fracasso. Nunca fui um freqüentador assíduo do Marabá, que sempre exibiu filmes populares demais pro meu gosto, mas me lembro com muita alegria de quando filmei uma seqüência do Perfume de Gardênia na frente do cinema, com o José Mayer saindo debaixo das pernas de uma enorme Christiane Torloni de compensado.

Qual a importância dele para a cidade de São Paulo?
Foi um cinema importantíssimo para o cinema brasileiro e a principal catedral da pornochanchada. Tinha a maior renda média da América Latina e, que eu me lembre, foi o único cinema que cumpria muito mais do que a cota de tela do cinema brasileiro, sem que fosse preciso nenhuma lei para isso. Um filme que estourasse no Marabá, estourava no Brasil inteiro.

O que você acha do Marabá reabrir como multiplex?
Uma pena, mas melhor isso que outra igreja ou estacionamento. Eu sempre digo que os exibidores não estão percebendo que suas telas estão ficando cada vez menores e as telas de nossos home theaters cada vez maiores. Se aproxima o dia que serão iguais e aí não vai mais haver a necessidade de sair de casa e estacionar no shopping e comprar o ingresso para se assistir um filme. A exibição tradicional será uma coisa totalmente obsoleta. Cinema para mim é espetáculo e eu sinto falta do espetáculo de tocar o gongo, abrir a cortina, a sala escurecer e o filme ser apresentado como um show de rock hoje em dia. Ir ao cinema tinha algo de religioso, de admirar, de adorar a grande tela de prata, de apreciar o espetáculo. Tudo isso foi esquecido e o público não tem nenhum motivo especial para ir ao cinema. Os cinemas fast-food dos shoppings acreditam que as pessoas iam ao cinema apenas pelo filme e por isso estão indo cada vez menos. Se não reverterem o processo, ir ao cinema logo será como ir à ópera, coisa que fazemos uma vez cada cinco anos e muitos não vão nunca.

3. João Batista de Andrade, diretor de “Doramundo”, “O Homem Que Virou Suco”, “A Próxima Vítima”, entre outros.

Qual foi o primeiro filme que você viu no Marabá?
Sinceramente, eu não me lembro.

Qual a importância dele para a cidade de São Paulo?
O Marabá era o objeto de desejo de qualquer cineasta ao lançar um filme. Na verdade, era um cinema que era para todo mundo da área cinematográfica uma verdadeira referência. Tinha um público enorme e popular.

O que você acha do Marabá reabrir como multiplex?
Acho muito bom. São medidas que funcionam como um esforço para revitalizar o centro da cidade. Faltam cinemas assim, de rua, onde as pessoas para assistir um filme não precisam se perder no laboratório consumista dos shopping centers.

4. Joel Pizzini, diretor de “O Evangelho Segundo Jece Valadão” e “Anabasys”.

Qual o primeiro filme que você viu no Marabá?

O primeiro filme que vi no Marabá foi O Iluminado de Stanley Kubrick.

Qual a importância dele para a cidade de São Paulo?
Antes de tudo, salvar o Marabá já é um presente de ano novo, pois é sem dúvida um patrimônio da cidade.

O que você acha do Marabá reabrir como multiplex?
Transformá-lo em multiplex, desde que preservada as características básicas e uma qualidade equilibrada na programação é um up-grade dos cinemas de rua. Essas salas infelizmente estão desaparecendo no Brasil. É bom lembrar que um dos maiores sucessos do Marabá foi O Bandido da Luz Vermelha, de Rogério Sganzerla o que prova que a massa gosta de biscoito fino. Torço pra que o Marabá se torne um cinema popular de boa qualidade pra recuperarmos a velha vocação da sala.

5. José Adalto Cardoso, diretor “O Império das Taras”, “...E A Vaca Foi Pro Brejo” e “Massagem For Men”.

Qual foi o primeiro filme que você viu no Marabá?
Nossa...eu realmente não me lembro. Sei que lá passavam a grande maioria dos filmes brasileiros, e por isso freqüentei ele durante muitos anos. Dos filmes que dirigi, eu lancei o Massagem For Men lá.

Qual a importância do Marabá para a cidade de São Paulo?
Ele marcou muito pela arquitetura . Como os demais, ele tinha mais de 1 000 lugares. A gente conseguia lotar tranquilamente uma sala daquelas com 800 pessoas. Era um ambiente respeitável. Para algumas pessoas daquela época, ir ao cinema era como ir a igreja. Algo completamente diferente de hoje, em que os cinemas estão concentrados nos shoppings centers. Com a chegada do cinema pornô, ele decaiu bastante. A evolução era algo natural. Hoje em dia, não dá mais para você ter um cinema como aquele.

O que você acha do Marabá tornar-se multiplex?
Acho muito legal. Por um lado, se perde o romantismo. Eu sou de uma geração em que muitos namoros começavam no escurinho do cinema. Atualmente, as pessoas se preocupam mais com outras coisas da sala, como a segurança e por isso vão nos shoppings. Se virar algo como Cine Olido, acho completamente válido. Também acredito que o mesmo deveria ocorrer com o Ipiranga. É importante termos multiplex fora dos shoppings, para continuar existindo o cinema de rua. Ainda mais com salas de grande tecnologia e qualidade. O cinema como espetáculo ainda atraí muita gente e tenho certeza que será um empreendimento interessante.

6. Luiz Gonzaga dos Santos, diretor de “Patty, a Mulher Proibida” e “Anúncio de Jornal”.

Qual foi o primeiro filme que você viu no Marabá?
Isso faz muito tempo...eu estou em São Paulo desde 1955. Meu primeiro emprego aqui foi na editora Globo, como office-boy na rua Sete de Abril. A sede da editora era bem encostadinha no Marabá. Então, como era muito perto, eu fui muitas vezes em todas aquelas salas do centro da cidade. Nessa época, eu era um rato de cinema, via toda a espécie de filmes. Nossa, foram tantos que eu vi no Marabá...fitas americanas e brasileiras. Era a maior renda de São Paulo. Todo mundo disputava a bilheteria dele. Ter seu filme passado lá era um privilégio para qualquer realizador que quisesse ganhar nome.

Qual a importância do Marabá para a cidade de São Paulo?
Virou uma instituição incorporada a cidade. Essas grandes salas do centro, juntavam multidões de pessoas. Quantas pessoas não passaram a vida assistindo filmes naquelas salas? Hoje as salas não existem mais como ponto de referência e de cultura cinematográfica. É importante a gente reavivar as salas de rua, que estão na calçada. Isso fazia com que os cinemas vivessem cheio de pessoas, porque o público via as fotos e os desenhos da película que estava passando. Dessa maneira, eles conseguiam se programar pra ir ver os filmes. Essas salas eram verdadeiros centros de atividades culturais.

O que você acha do Marabá tornar-se multiplex?
É muito bom. Só acho uma pena que a maioria dos filmes que são exibidos em cinemas multiplex são produções estrangeiras e não brasileiras. O produto estrangeiro é um invasor e nós continuamos abrindo as portas pras coisas de fora entrar livremente. Na minha opinião, isso não tem sentido e é algo revoltante. Os cineastas brasileiros deveriam se mobilizar sobre isso.

7. Rubens Rewald, diretor de “Corpo”.

Qual foi o primeiro filme que você viu no Marabá?
Realmente não me recordo qual foi o primeiro filme que vi no Marabá. Quando pequeno, eu ia muito no cinema no centro da cidade com os meus pais. Por isso, não me lembro qual filme era em qual cinema. Mas me lembro do último que vi: The Killer do John Woo.

Qual a importância do Marabá para a cidade de São Paulo?
A importância é imensa. É como um templo do cinema ligado a uma época, das grandes salas e do centro como irradiador da cultura da cidade. Tudo rolava no centro.

O que você acha do Marabá tornar-se multiplex?
Não vejo problema algum em se tornar um multiplex, contando que a arquitetura do edifício seja mantida. Não é mais possível manter uma única sala para quinhentas, mil pessoas. O mundo mudou (que bom!!!).



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