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A ficção científica B dos anos 50
parte 1 de 4

Por Gabriel Carneiro

A influência da Guerra Fria na ficção científica B

O conceito e origem do filme B

O conceito cinema B (ou filme B) surgiu na década de 30 em Hollywood. Mesmo hoje tendo uma conotação de filmes toscos, mal produzidos e de baixo orçamento, o nome B foi concebido para designar as produções de baixo orçamento em programas duplos.

Dominado por cinco grandes majors (MGM, Paramount, Warner Bros., Fox e RKO), as grandes produções rondavam basicamente suas salas de exibição – nessa época, era comum para as grandes empresas controlarem o processo inteiro, desde a produção até a exibição. Os lançamentos, diferentemente de hoje, eram passados nas principais salas, para depois irem se espalhando nos exibidores independentes. Isso lhes trazia prejuízos. Então, com o intuito de burlar esse sistema e atrair os espectadores – a maioria já fora ver os filmes nas grandes salas -, começaram a dar diversos benefícios ao público, que culminaria nos programas duplos. Com o Crack da Bolsa, em 1929, e os subseqüentes efeitos da Depressão, o cinema hollywoodiano se viu em apuros e os programas duplos se popularizaram, pois era uma forma de trazer audiência. Em 1935, até as majors haviam aderido à prática de mostrar dois filmes seguidos pelo preço de um ingresso – excetuando-se pelos locais de maior erudição.

Para compensar os custos, nesses programas exibiam uma produção de alto orçamento (as produções A) e uma de baixo orçamento (as produções B). O conceito, portanto, nasce de uma oposição, meramente designatória. Com o tempo, esse conceito iria se expandir. Certos gêneros fílmicos seriam praticamente exclusivos dessas produções, como os filmes de terror e as ficções científicas. Produções voltadas para um público mais jovem, com o objetivo de entreter, com efeitos especiais mais primários e atores desconhecidos no elenco.

Uma nova ordem mundial

Em 1945, dois eventos importantes para história do século XX ocorreram:

- De 4 a 11 de fevereiro, mesmo com a Segunda Guerra Mundial inacabada, houve a Conferência de Ialta (Criméia), onde os representantes dos três Estados soberanos na guerra, Franklin Roosevelt (EUA), Winston Churchill (RU) e Josef Stalin (URSS), reuniram-se para discutir, entre os temas, a repartição das zonas de influência entre o Leste e o Oeste; ou seja, uma repartição planetária entre o mundo capitalista e o mundo socialista.

- Nos dias 6 e 9 de agosto, os EUA lançaram sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki bombas atômicas, até então o maior poderio militar existente, destruindo-as completamente, com severos efeitos colaterais.

Ao fim da guerra, a ameaça nazi-fascista havia acabado, porém uma nova era se estabeleceria. Não foi despropositadamente que o governo americano exibiu seu poderio nuclear num país já praticamente derrotado. Era uma forma de mostrar ao governo Stalin o que estaria por vir.

Em 1947, a Guerra Fria – guerra ideológica entre o capitalismo e o socialismo, sem conflitos armados direto – se oficializou. A Doutrina Truman falava em erradicar a ameaça vermelha, alusão à URSS.

Começava uma nova era. O mundo fora dividido em dois, um lado polarizado pelo capitalismo americano e o outro pelo socialismo soviético. A corrida armamentista e espacial foram dois aspectos constantes nos anos por vir desse conflito. A produção industrial deu um salto, e novas tecnologias – na maioria das vezes mortíferas – eram descobertas e realizadas. Veio então a era da corrida armamentista e especial...

A ameaça veio do espaço?

A década de 50 começou com incertezas pairando sobre os céus. Não se sabia o destino da humanidade, pois a chance de uma guerra nuclear era muito palpável. O mundo poderia se aniquilar, e nem tempo para respirar a população teria. Medo e paranóia eram sentimentos constantes para os norte-americanos. Uma catástrofe tão derradeira, e ainda assim, tão incerta, incutiu na mente dos cidadãos esse desejo extremo pela queda do oposto, e mais, na destruição do desconhecido.

A grande verdade era essa, a grande massa não sabia quase nada da URSS. A ameaça vermelha era uma célula estranha. O medo do desconhecido sempre provocou duas reações: combate e destruição, e isolamento.

“Em agosto de 1945, caíram as bombas em Hiroshima e Nagasaki e o mundo entrou em nova era; um ano depois outra bomba ainda mais potente, com a efígie da pin-up favorita dos fuzileiros, Rita Hayworth, despencou sobre o recife de Biquíni, associando simbolicamente a ciência atômica e o cinema.” (MATTOS, 2003, p. 49/50)

O cinema B refletiu as angústias da população através de ficções científicas, metaforizando o inimigo. O medo do socialismo e das novas tecnologias de destruição em massa foi encarnado por diversos filmes que surgiram com títulos absurdos e amedrontadores. Não era objetivo fazer desse tema as grandes produções, a ficção científica era um gênero – e ainda o é – mal visto pela sociedade intelectualizada. Os filmes eram feitos para serem exibidos em drive-ins e proporcionarem uma agradável diversão familiar. Muitos desses filmes são hoje considerados cults - ou seja, com fãs ardorosos -, porém, na época, eram poucas as produções que se enveredavam para o maior orçamento, tal qual a produção da Dinsey Vinte Mil Léguas Submarinas, de Richard Fleischer.

Cada qual com suas particularidades, as ficções B se opuseram durante toda década de 50 à estética épica dos filmes de orçamentos milionários. Os filmes utilizavam os mesmos temas, porém de maneiras diferentes. Temas como invasão alienígena, radiação, confronto com raças não-humanas e pré-históricas (leia-se não civilizadas de acordo com a concepção vigente) eram comuns e muito explorados:

“Com a guerra e a ameaça de um holocausto nuclear veio o reconhecimento de que a ciência e a tecnologia podiam afetar o destino de toda a raça humana, e logo nasceu o filme de ficção científica moderno com sua ênfase na catástrofe global e nas viagens especiais. (...) Os vilões clássicos que metiam medo – vampiros, lobisomens, múmias e zumbis – foram substituídos por novos monstros inspirados pelas terríveis conseqüências da radiação atômica, aparecendo na tela gigantescas formigas, aranhas, caranguejos, escorpiões e até colossais monstros pré-históricos, despertados de seu sono secular. A Guerra Fria e a corrida armamentista também ajudaram a criar o clima que gerou o interesse pela ficção científica. (...) A idéia de seres ou organismos alienígenas perambulando tão perto da terra passou a fazer parte do temor e da cultura populares.” (MATTOS, 20003, p. 50)

A radiação da bomba atômica e a corrida espacial forma fatores que influenciaram muito esse cinema. Muito mais que heroísmo, o sentimento desses americanos médios era o medo. Ninguém sabia direito o efeito da radiação, só sabiam que a bomba nuclear era uma arma de destruição em massa. E se americanos e soviéticos estavam tão avançados quanto exploração espacial, se nós, humanos, conseguíamos sair da órbita terrestre, porque seres de outros planetas não conseguiriam entrar em nossa órbita? Eram incertezas como essas que conceberam a ficção científica B.

Cronologicamente, a primeira produção de destaque seria Destination Moon, de 1950, filme que retrata um cientista que, após ter perdido investimento estatal para seu foguete atômico, procura o privado, objetivando vencer os soviéticos no espaço. Certamente uma produção atípica, pois trata de um confronto direto. Aliás, as produções de George Pal nesse período – exceto por Guerra dos Mundos -, tratavam de assuntos periféricos e se diferenciavam da temática vigente.

Porém, o primeiro filme que realmente influenciaria e daria o ponto de partida às ficções científicas B é O Dia em que a Terra Parou, produção B da Fox, com elenco famoso. O diretor Robert Wise criou uma fábula interplanetária de mensagem pacifista, ao colocar Klaatu, um alienígena que vem à Terra com uma missão e um robô. A visita desse estranho ser objetiva acabar com as hostilidades terráqueas entre si, e caso isso não ocorresse, o planeta seria destruído.

A Era de Ouro dos filmes B (RICHARDS, 1984, p. 13) mal começara. A década de 50 seria muito produtiva para esse gênero, e teria prestígio até o começo da década de 60. Os filmes que tratavam de ameaças alienígenas ainda trariam diversos e distintos representantes.

Filmografia citada:
Destination Moon (1950, Dir.: Irving Pichel)
Dia em que a Terra Parou, O (The Day the Earth stood still, 1951, Dir.: Robert Wise)
Guerra dos Mundos (War of the Worlds, 1953, Dir.: Byron Haskin)
Vinte Mil Léguas Submarinas (20000 Leagues Under the Sea, 1954, Dir.: Richard Fleischer)

Bibliografia citada:
MATTOS, A.C. Gomes de. A Outra face de Hollywood: Filme B. Rio de Janeiro: Rocco, 2003.
RICHARDS, Gregory B. Science Fiction Movies. Nova Iorque: Gallery Books, 1984.




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