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Dossiê Cláudio Cunha

O Dia em que o Santo Pecou
Direção: Cláudio Cunha
Brasil, 1976

Por Fernando Pereira
Seleção e transcrição: Matheus Trunk

Apesar do que o título sugere, o filme não é uma pornochanchada. É, antes, uma história puxando do maravilhoso ao mítico, que se informa estar profundamente entranhada na alma e no comportamento social da população do litoral paulista, onde foi filmada, que guarda ainda um casario colonial muito convincente a reconstituição de época que o argumento propõe.

Os personagens centrais são um homem rude e solitário (João Baleia/Maurício do Valle), capaz de aceitar os reclamos da violência, com um passado meio obscuro, e sua companheira muda que a população local tem como feiticeira. Quando a companheira é brutalmente violentada por homens primitivos, certamente identificados com o passado do qual João Baleia se ilhou, o gigante taciturno e solitário se faz fera e parte em busca da própria vingança.

Esta vingança atingirá toda a pequena sociedade local, que sempre o marginalizou mais do que temeu. E para escândalo e desafio final, João Baleia obriga o padre da cidade a ministrar o casamento entre ele e a mulher por todos tida como feiticeira. Em sua ira, enquanto mata os responsáveis pelo assalto a mulher e acaba mutilando o olho de um jovem soldado, cuja mãe, beata cumpridora de seus deveres religiosos, convoca a vingança de São Sebastião, padroeiro da cidade, o mesmo santo que já saíra do altar para defender a cidade contra piratas estrangeiros. Ao provocar o santo diante da igreja, João Baleia convoca a fúria dos elementos e aparece morto, no dia seguinte, ferido de lança na porta da igreja.

Asseguram os produtores que o fato é verídico. E que o santo-protetor-vingador foi levado a julgamento e encerrado numa cela contra os protestos da população.

Curioso, o argumento é, no entanto, também vulnerável ao lugar comum e à pieguice. O tratamento que deu ao filme o diretor Cláudio Cunha pretendeu-se bem humorado e marcado de vinhetas que serviram a uma critica de costumes. O diretor desejou, ainda, certamente que seu filme fosse popular (ou não lhe teria dado o título que deu) e criou cenas de ação e luta, entre as quais a luta do gigante Baleia com o capoeirista é a mais bem sucedida. Entretanto, predominou o lugar comum e a sensaboria, agravados por uma desastrada direção de intérpretes. No final, a idéia que fica é a de que um bom assunto comercial foi mais uma vez perdido.

*Publicado originalmente no O Globo em 10 de setembro de 1976



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