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Dossiê Cinema de Bordas

Mistério na Colônia
Direção: Felipe M. Guerra
Brasil, 2003/2008.

Por Sergio Andrade

(Contém spoilers)

Aos que tiverem interesse em se aventurar pelo curta-metragem Mistério na Colônia, recomendo que o façam em três etapas.

Primeiro assistam à versão original, de 2003. Nela, vemos um médico, que é a cara e o nariz do Luciano Huck (ei, espera ai, esse É o Luciano Huck!!!), andando pela rua de uma cidade do interior. Ele é acolhido na casa de uma família local (pai, filho e avó). Durante o almoço, o rapaz procura alertar o médico sobre um terrível segredo que a cidade esconde, mas é brutalmente interrompido pelo patriarca. Instala-se um mal-estar geral.

O médico sai da casa para fotografar pássaros, passeando por um cenário bucólico, quando o rapaz surge novamente para lhe dizer que todo visitante que chega à cidade acaba desaparecendo misteriosamente. Nesse momento, eles são atacados por um cara vestido como se fosse o assassino da série Pânico e portando uma serra elétrica. O rapaz é morto de forma violenta, tendo a mão cortada e o peito aberto pela serra. O assassino corre então atrás do médico, que se defende com a valise e, na luta corporal que se segue, acaba matando o cara. No caminho de volta para a cidade é cercado pelos colonos, que revelam que são canibais e o médico será o prato principal da noite. Huck faz uma piadinha e diz que o filme acabou. Fim.

Se ao final dos 10 minutos de duração vocês estiverem se perguntando, como eu, o que é aquela tosqueira toda, então assistam ao programa Caldeirão do Huck, de 27/09/03.

A produção descobriu numa pequena cidade gaúcha, Carlos Barbosa, de apenas 20.000 habitantes, um rapaz que dirigia filmes ao custo de R$150,00, no máximo. Seu nome: Felipe M.Guerra, então com 23 anos, que através de sua produtora, Necrófilos Produções Artísticas, havia realizado alguns curtas e longas em VHS, entre os quais Entrei em pânico ao saber o que vocês fizeram na sexta-feira 13 do verão passado. Felipe é jornalista, e é bastante conhecido na blogosfera como colaborador do excelente site Boca do Inferno. Por ai já dá pra ter uma idéia do gênero preferido dele.

Luciano Huck propôs que o Felipe realizasse um curta em apenas 24 horas, ao custo de R$100,00, tendo o próprio Luciano como ator principal. Proposta aceita, acompanhamos o processo de realização do filme. Usando como cenário sua própria casa, como atores gente da família e amigos da cidade (seu irmão Rodrigo, um parente, a avó Oldina do Monte, que trabalhou no filme O Quatrilho, um professor que iria se juntar a equipe depois do horário das aulas...), gravando tudo de primeira, Felipe demonstra o mesmo entusiasmo de uma criança diante de um brinquedo novo. Moço de 7 (ou quinze!) instrumentos, ele faz de (quase) tudo, da direção e roteiro aos criativos efeitos especiais, até maquiagem e transporte.

Finalizado o curta, ele foi exibido no Festival de Gramado, mas não no Palácio dos Festivais, e sim num cinema improvisado no gramado em frente da igreja.

Agora que vocês sabem de tudo sobre a produção de Mistério na Colônia, podem partir para a terceira e última etapa.

Em 2008, o Felipe reeditou o curta. Trabalhando basicamente sobre o mesmo material, ele gravou algumas cenas adicionais para tornar a trama mais coerente, trocou a trilha sonora anterior, de músicas clássicas, por uma mais condizente com o gênero suspense, retrabalhou algumas cenas conseguindo até atenuar a canastrice do Huck e mudou completamente o final, de uma forma que o Huck nunca poderia imaginar.

Enfim, essa nova versão é uma grata surpresa, quase outro filme. Felipe M. Guerra mostra que tem talento para emular seu gênero e seus filmes preferidos como O Massacre da Serra Elétrica e principalmente O Homem de Palha. Aguardamos agora que ele não fique restrito ao cinema de gênero, mas parta para um tipo de filme mais autoral.




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