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Dossiê Cinema de Bordas

O Monstro Legume do Espaço
Direção: Petter Baiestorf
Brasil, 1995.

O Monstro Legume do Espaço 2
Direção: Petter Baiestorf
Brasil, 2006.

Por Carlos Thomaz Albornoz, especialmente para a Zingu!*

Uau, mais um pouco e O Monstro Legume do Espaço vai fazer 15 anos. Parece que foi ontem que eu vi o cartaz, na loja Planeta Proibido, e fiquei um bom tempo procurando qual era o nome original daquele filme da Troma - com aquele diretor de nome germânico, que eu nunca ia imaginar de que se tratava de um filme brasileiro. E, que curioso, esses rostos são familiares, aonde foi mesmo que eu já os vi?

Para quem conhece a obra da Canibal Filmes, segundo maior motivo de vergonha da cidade de Palmitos/SC, segundo seus habitantes - só atrás de um bordel -, O Monstro Legume do Espaço marca o início e o fim de muitas eras. É o início da colaboração com a ‘turma’ de Porto Alegre, ligada a César ‘Coffin’ Souza, que ia dar origem a tantas obras que depois seriam lembradas com carinho pelos fãs (Blerghhh, Eles comem sua carne). Também é o último filme da Canibal Filmes ‘original’, sem as influências trazidas do Sul, sem a auto-ironia que iria dominar dali por diante. Guarda ‘resíduos’ do início do grupo, em que eles queriam ser uma espécie de Monty Python de Santa Catarina.

É uma amostra também do imenso progresso que Petter Baiestorf estava passando como diretor e roteirista. O filme pode ser tosco para olhos não acostumados, mas nem parece ser obra de quem, apenas um ano e meio antes, estava fazendo Criaturas Hediondas (1993). Criaturas Hediondas 2 (1994) já era um progresso imenso, um filme querido por todos os fãs da fase inicial da Canibal Filmes, mas a obra que todos iam lembrar seria O Monstro Legume do Espaço mesmo. Diálogos, personagens (O Monstro, Caquinha...), atores (Jorjão Timm, Marcelo Severo), tudo conspirava para os fãs de horror da época se apaixonarem pelo filme.

(por anos achei que esse aperfeiçoamento entre os filmes fosse obra da influência de Coffin Souza, mas uma entrevista/papo de bar com um ator que trabalhou no filme me convenceu que o roteiro era obra apenas de Baiestorf, que nessa fase Souza, que estava chegando, resolveu não se meter, por não conhecer ninguém direito ainda).

Um pequeno adendo: se a obra de horror brasileira hoje é pequena, imagine há 14 anos atrás. Mojica não filmava a sério havia 17 anos (o que a gente não sabia é que ele ainda levaria mais 13 para completar sua trilogia), Ivan Cardoso estava brigando para ter seu O Escorpião Escarlate lançado nos cinemas (em Porto Alegre passou uma semana, escondido), já fazia um bom tempo que ninguém da Boca do Lixo não lançava nenhum filme de horror ‘disfarçado’ de erótico ou melodrama... ou seja, quando os amigos gringos perguntavam ‘quem fazia horror por aqui’ só tínhamos veteranos para contar a história. Imagina a alegria quando descobrimos que tinha um louco que filmava no meio do mato, em Santa Catarina, com referências que a gente conhecia e entendia ... maravilha!

Mais importante que o próprio filme é a influência dele, e sua atitude. A bitola que ele foi rodado, VHS, não era levada a sério pelos fãs. Até então o mínimo aceito para distribuição era 16mm, ou pelo menos Betacam (para pornô). Não nos esqueçamos, 1995 era quase meia década antes de A Bruxa de Blair, e a ‘turma’ ainda levaria algum tempo para ouvir falar do Dogma 95, que, por sinal, era num suporte mais amigável, vídeo digital. Com Baiestorf, essa bitola teve que ser levada a sério, e a partir daí quem quis falar de cinema independente brasileiro teve que ‘sujar as mãos’ com os VHSs vindos de Santa Catarina.

Quanto à segunda parte, rodada em 2006, soa como uma piada, muitas vezes sem graça, de Baiestorf àqueles que pediam uma seqüência para uma obra tão querida. Até não é de todo mal, tem momentos engraçados (como o destino do cobrador de impostos), mas parece ter sido feita com o único intuito de cessar a pergunta ‘quando vocês vão fazer uma continuação?’, ao invés de se ter algo muito útil para dizer.

Num país de primeiro mundo, Baiestorf teria se profissionalizado, assim como sua equipe. Os atores começariam a achar trabalho fora de sua esfera, assim como os técnicos (nos EUA, o roteirista Jamie Gunn partiu de Tromeo e Julieta para Scooby Doo e Madrugada dos Mortos). Monstrinhos Legume estariam à venda nas lojas de brinquedo, e os filmes seriam facilmente encontráveis nas Americanas da vida. Mas estamos no terceiro mundo: Baiestorf continua no underground, nenhuma das revelações dele saiu de seu círculo. Como bem me chama atenção um amigo, que estava vendo o especial de 10 anos de Hermes e Renato e reparando que no início eles não eram assim tão diferentes de Baiestorf e cia, esse cavalo podia ter passado encilhado para eles. Mas não passou. Uma pena, para todos nós.

- Os filmes podem ser adquiridos diretamente com Petter Baiestorf, por R$ 15,00, pelo email baiestorf@yahoo.com.br.

*Carlos Thomaz Albornoz é jornalista formado pela PUC-RS, fã de cinema, especialista em cinema de horror europeu e asiático. Entre outros lugares, já escreveu para Cine Monstro, Contracampo, Carcasse.com e Teorema.




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