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Inventário Grandes Musas da Boca
Agora, todo mês, uma dama do cinema paulista

Silvana Lopes

Por Adilson Marcelino

A Boca do Lixo sempre reservou espaço para o talento e a beleza madura de musas, como Elisabeth Hartmann e Arlete Montenegro. A carioca Silvana Lopes com certeza é uma delas.

Silvana Lopes nasceu no dia 21 de agosto de 1931, em Niterói/RJ. Artista completa, atuou no rádio, na televisão, no teatro e no cinema. O início da carreira artística foi como rádio-atriz – atuando na Rádio Tamandaré e na Rádio Jornal do Comércio, em Recife, e por fim na Tupi, época em que também faz televisão no Rio de Janeiro.

O primeiro trabalho na TV é como garota-propaganda na Tupi, época de reinado de Neide Aparecida, também atuando em teleteatros. Já em novelas, as primeiras são O Caminho das Estrelas, de Dulce Santucci, e Ninguém Crê em Mim, de Lauro César Muniz, ambas exibidas na TV Excelsior, respectivamente, em 1965 e 1966. É na mesma emissora que atua em um grande sucesso da época, Almas de Pedra, da mestre Ivani Ribeiro, exibida em 1966. A atriz trabalha em várias novelas da Excelsior, sobretudo em tramas de Ivani, como As Minas de Prata (1966/67), A Muralha (1968) e A Menina do Veleiro Azul (1969). Na TV Tupi, atua em Toninho on the Rocks (1970) - veículo para o cantor e compositor Antonio Marcos – e em A Selvagem (1971); e na Record em O Leopardo, em 1972, de Ivani Ribeiro.

Nesse mesmo período é descoberta pelos palcos, tornando-se vedete do Teatro de Revista e trabalhando com o mítico Walter Pinto em produções no Rio e em São Paulo. Nos anos 70, Silvana Lopes vai se encontrar com um dos maiores gênios da Boca do Lixo, o cineasta Ody Fraga, mas ainda em uma novela.

Isso mesmo! Ody Fraga escreveu Vendaval, uma adaptação do romance O Morro dos Ventos Uivantes, de Emily Brontë, protagonizada por Hélio Souto e Joana Fomm. Fraga escreveu algumas novelas na década de 70, como O Preço de Um Homem (1971-72) e Bel- Ami (1972), ambas na Tupi – antes de se dedicar exclusivamente ao cinema.

Silvana Lopes estréia no cinema em São Paulo, onde se tornaria uma das musas da Boca do Lixo. Em 1973, é lançado Macho e Fêmea, de Ody Fraga, filme protagonizado pela deusa Vera Fischer, o lado feminino do outro protagonista, o personagem Juliano, de Mário Benevenutti.

O grande cineasta Clery Cunha é o assistente de direção de Macho e Fêmea, e é com ele que ela vai atuar em dois filmes, Pensionato de Mulheres, lançado em 1974, e Eu Faço... Elas Sentem, lançado em 1975. Pensionato de Mulheres tem argumento de Clery Cunha e de Joana Fomm, atriz que ele dirigiu em Os Desclassificados (1972). O filme cruza histórias de várias moradoras do pensionato de dona Ismênia, vivida por Silvana Lopes. A primeira cena do filme apresenta as personagens, e a fala de Silvana Lopes é deliciosa “Anemia, é? Pois fique sabendo que aqui não é hospital”. Amante do dinheiro, ela chega a salivar quando põe a mão nas notas que recebe de suas inquilinas, interpretadas por outras musas da Boca – Magrit Siebert, Helena Ramos, Cinira Camargo e Lisa Vieira.

A Ismênia de Silvana Lopes trata suas meninas com mão de ferro na hora de cobrar e vive repetindo que, lá no pensionato, homem não entra. Mas quando chega a noite, as coisas não são bem assim. Auxiliado pela empregada, a grande Liana Duval, presença inesquecível em dezenas de filmes da Boca, um marmanjo de programa entra sorrateiramente para proporcionar momentos de prazer para a locatária em troca dos tais cruzeiros (seria essa a moeda), que ela ama tanto. E depois do gozo rápido do amante, ela implora, inutilmente, para que ele fique um pouco mais.

Pensionato de Mulheres é um belo filme e a personagem Ismênia é sob medida para a beleza e o porte altivo de Silvana Lopes. Já em Eu Faço... Elas Sentem, ela é a vedete - interessante relação com seus trabalhos nos palcos do Teatro de Revista, em que mostra o seu corpão-violão. O filme é sobre um homem, Luiz, interpretado por Antônio Fagundes – de sucessos da época na TV Tupi, como as novelas Mulheres de Areia (1973/74), de Ivani Ribeiro, e depois O Machão (1974/1975), de Sérgio Jockyman. É curioso o contraponto, pois se nas novelas ele era um machão de primeira, no filme ele vive complicações, pois apresenta comportamentos estranhos como falar fino e saltitar feito bailarina, para escândalo de sua noiva Magrit Siebert - já que sempre protagoniza uma crise na hora das fracassadas cerimônias de casamento. Em Eu Faço... Elas Sentem, Silvana Lopes é a temperamental vedete, estrela de uma revista em que a personagem Célia, de Lucia Capanema, vai parar, e que também protagoniza comportamentos estranhos, como os do personagem de Fagundes.

Em 1974, é lançado o surpreendente O Trote dos Sádicos, filme dirigido pelo artista plástico Aldir Mendes, e produzido pela Servicine, dos míticos Alfredo Palácios e Antonio Pólo Galante. Silvana Lopes faz uma participação como a mãe da caloura patricinha que se interessa pelo pobretão, mas que depois bandeia para o lado dos vilões para ser ver livre dos trotes. O filme focaliza os tradicionais trotes sofridos pelos calouros em uma faculdade de medicina, que ficam cada vez mais macabros e perigosos pelas mãos dos temidos veteranos. A personagem de Silvana é pequena, mas uma vez mais seu porte altivo faz com que não passe desapercebida.

Ainda em 1974, faz A Gata Devassa, de Raffaele Rossi, cineasta que anos depois iria escandalizar e faturar com Coisas Eróticas, o filme de sexo explícito que levaria multidões aos cinemas e mudaria a história da Boca. No filme, Silvana Lopes é Condessa, a chefe de uma organização criminosa e que vive um triângulo amoroso e perigoso com a comparsa vivida por Suely Fernandes e o desejo de ambas, Ângelo, personagem de Perry Salles.

Em 1975, a atriz atua na comédia Quando Elas Querem... E Eles Não, de Ary Fernandes, em que hóspedes de um balneário vivem uma situação complicada – os homens impotentes e as mulheres excitadas no limite. Nos filmes seguintes, Silvana Lopes será dirigida por dois nomes míticos do cinema da Boca: Jean Garret e Tony Vieira.

Com o mestre Jean Garret, Silvana Lopes atua em Amadas e Violentadas (1976), belo filme produzido e protagonizado por David Cardoso. Na trama, ele é um escritor de best-sellers e psicopata traumatizado pelo assassinato da mãe adúltera pelo pai, que se suicida após o ato. Silvana Lopes faz essa mãe, lembrada por Leandro (Cardoso), como uma mulher vulgar que arruinou a vida do seu pai e de sua família. É uma pequena participação, vista em flash-back pela mente doentia de Leandro, mas a atriz está perfeita e tem atuação marcante. O filme reúne outras deusas da Boca, como Arlete Moreira, a primeira vítima, Zélia Diniz, Aldine Muller, Sonia Garcia, e a beleza juvenil de Fernanda de Jesus.

Com Tony Vieira, Silvana Lopes atua em dois filmes: O policial O Dia das Profissionais (1976), produzido por Vieira e dirigido por Rajá de Aragão; e a aventura Traídas Pelo Desejo (1976), produzido e dirigido por Tony Vieira, e protagonizado por ele e sua musa Claudette Joubert.

Ainda em 76, Silvana Lopes volta a se encontrar com Raffaele Rossi em Pura Como Um Anjo, Será Virgem?. E nos anos seguintes, já fora da Boca, atua em As Borboletas Também Amam (1979), de J. B. Tanko, no Rio de Janeiro, e no aplaudido Os Noivos (1979), de Afrânio Vital, também no Rio de Janeiro – Prêmio de Melhor Roteiro pela Associação Paulista dos Críticos de Arte.

De volta a São Paulo, Silvana Lopes atua em Eva, O Princípio do Sexo (1981), em que integra uma moralista família mineira; e por fim em Amor de Perversão, com outro mítico cineasta da Boca do Lixo: o grande Alfredo Sternheim.

Com essa trajetória de uma dúzia de filmes da Boca, Silvana Lopes se tornou uma de suas amadas e inesquecíveis musas.

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Pitaco do diretor

Faço votos que essa nova geração do teatro, cinema e televisão, se atente mais aos valores, ainda vivos, que representam uma dinastia incontestável de uma vida dedicada à preservação no nosso meio artístico, como é o caso dessa grande estrela Silvana Lopes. Os jovens têm que saber da importância dessa mulher! Uma das rainhas do teatro, principalmente do saudoso Teatro de Revista. Uma atriz que superou, condignamente, muitas barreiras e conseguiu com sua personalidade marcante, seu senso de responsabilidade, contagiar as novas propostas e um tempo de uma nova era. Uma mulher de caráter, uma guerreira, uma das maiores profissionais em sua trajetória! Eu, Clery Cunha, sempre fui um admirador, fã desse talento brasileiro.

Pensionato de Mulheres e Eu Faço e Elas Sentem, os filmes que ela fez comigo, me deixaram completamente orgulhoso diante dessa figura maravilhosa como ser humano e como profissional.

Foi um prazer imenso!
Se Deus quiser, estaremos juntos no próximo trabalho!

Clery Cunha, que dirigiu Silvana Lopes em Pensionato de Mulheres e Eu Faço e Elas Sentem.

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Filmografia

Macho e Fêmea (1973), de Ody Fraga;
O Trote dos Sádicos (1974), de Aldir Mendes;
A Gata Devassa (1974), de Raffaele Rossi;
Pensionato de Mulheres (1974), de Clery Cunha;
Eu Faço... Elas Sentem (1975), de Clery Cunha;
Quando Elas Querem... E Eles Não (1975), de Ary Fernandes;
Amadas e Violentadas (1976), de Jean Garret;
O Dia das Profissionais (1976), de Rajá de Aragão;
Traídas Pelo Desejo (1976), de Tony Vieira;
Pura Como Anjo, Será Virgem? (1976), de Raffaele Rossi;
As Borboletas Também Amam (1979), de J.B. Tanko;
Os Noivos (1979), de Afrânio Vital;
Eva, O Princípio do Sexo (1981), de José Carlos Barbosa;
Amor de Perversão (1982), de Alfredo Sternheim.

Fontes:
Livros: Dicionário de Filmes Brasileiros (Antonio Leão da Silva Neto); Astros e Estrelas do Cinema Brasileiro (Antonio Leão da Silva Neto); e Cinema da Boca - Dicionário de Diretores (Alfredo Sternheim)
Revista: Cinema em Close-Up
Sites: Mulheres do Cinema Brasileiro, Estranho Encontro e IMDb.




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