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SUBGÊNEROS OBSCUROS...

Sexploitation


Por Marcelo Carrard

A representação do sexo no cinema sempre teve um lugar de destaque por seu fascínio eterno: o desejo incontrolável do espectador em olhar pelo “buraco da fechadura”. Focando sempre o corpo despido das mulheres, observa-se, desde os registros pictóricos da Renascença e do Barroco, passando pela fotografia e pelos registros já no cinema mudo, um longo caminho que sempre teve como objetivo final representar a nudez e a encenação do ato sexual. Reprimido e, ironicamente, polêmico até hoje, o sexo e a nudez sempre estiveram condenados a um limbo marginal, mesmo quando recebe uma estilização publicitária. Em países ditos desenvolvidos como os EUA e o Reino Unido, muitas vezes a representação da violência mais extrema é mais aceita, mais tolerada que o sexo.

Dentro do que chamamos de cinema exploitation, existem muitas subdivisões: WIP, Nun, Gore, Black, mas o elemento estrutural mais forte sempre foi o sexo. Como Hollywood vivia sob uma rígida censura, as produções exploitation que usaram a sexualidade como seu tema principal eram produzidas em um esquema marginal/underground. Dos destaques desse universo de produções toscas, temos o conhecido Russ Meyer e suas pérolas em celulóide, com suas musas ultra-peitudas em filmes já comentados por aqui como Mondo Topless e Beneath the Valley of the Ultravixens, e o lendário Ed Wood, que em 1965 cometeu uma atrocidade cinematográfica intitulada Orgy of the Dead, em que um sujeito, após sofrer um acidente, acaba em uma espécie de umbral onde uma dupla de seres fantasmagóricos lhe mostra uma série de performances eróticas de mulheres, simplesmente inacreditável.

A Europa sempre foi um terreno mais livre, onde a nudez e o sexo sempre tiveram maior tolerância e onde surgiu uma série de filmes, a partir dos anos 60, com uma ousadia inédita para a época. A Suécia, um país culturalmente mais liberal, lançou diversos filmes com a personagem Inga, que tiveram, inclusive, distribuição internacional de estúdios americanos, como a MGM. As garotas suecas passaram a ser musas tão cultuadas como as francesas e italianas. Em 1973, o diretor sueco Bo Ame Vibenius lançou o bizarro cult movie Thriller – A Cruel Picture, uma trama sobre vingança, protagonizada pela musa eterna Christina Lindberg. Para tentar tornar seu filme mais comercial, o diretor inseriu cenas de sexo explícito e de nudez da atriz principal, na montagem final. Além de explorar a sexualidade de maneira despudorada, o filme tem as mais toscas cenas de perseguição de carros da história do cinema, ruins até a medula, mas obrigatório para os fãs de cinema extremo/obscuro. Da Suécia vem também o famigerado diretor Joe Sarno, que nos brindou com o filme de vampiras taradas por velas fálicas, Vampyre Eckstasy, um clássico Sexploitation absoluto. A atriz Christina Lindberg também colaborou com o mestre japonês Norifumi Suzuki, no filme Sex and Fury, no qual protagoniza delirantes cenas de lesbianismo com uma japonesa belíssima, além de participar de outros clássicos sacanas suecos como o inesquecível Anita, de Torgny Wickman, de 1972.

Claro que não poderia deixar de falar dos poetas Jesus Franco e Jean Rollin. Tanto o espanhol quanto o francês criaram uma galeria de musas que protagonizaram imagens inesquecíveis dentro da representação audiovisual da sexualidade. Filmes como Venus In Furs, Vampyros Lesbos, Macumba Sexual, Doriana Grey, Cartas de Amor de uma Freira Portuguesa, Phantasmes, Fascination, Night of the Hunted, entre outros, apenas confirmam o talento visionário desses dois mestres que infelizmente ainda habitam um gueto marginal dentro da história oficial do cinema.

A Itália não poderia ficar de fora, claro. As comédias eróticas italianas dos anos 60 foram a grande fonte de inspiração de nossas populares pornochanchadas e toda a posterior produção da Boca do Lixo, que acrescentou elementos mais sofisticados do cinema de gênero. Diretores lendários por seu trabalho dentro do horror cinematográfico italiano, como o mestre Lucio Fulci, também se aventuraram no Sexploitation, em filmes clássicos como La Pretora, de 1976. O filme tem como protagonista a musa Edwige Fenech, estrela dos filmes giallo, cujo grande número de cenas de nudez frontal foi destacado para a publicidade do filme.

A contribuição de Joe D’Amato dentro do sexploitation italiano é tão importante quanto para o cinema de horror extremo. O criador da Black Emanuelle Laura Gemser, apimentou ainda mais a notória série erótica francesa e criou filmes de rara beleza como L’Alcova e Eva Nera, sem esquecer nunca de seus extremos Emanuelle in America, Emanuelle and the Last Cannibals e o bizarro Papaya. Dentro dessa composição, em que a sexualidade se mescla com o gore, não foi somente D’Amato que soube trabalhar com essa estética que explorava uma sexualidade mórbida. Não podemos esquecer do genial Hershell Gordon Lewis e seus clássicos marginais Blood Feast e Gore Gore Girls, com sua atmosfera mundana e sórdida, com dançarinas de striptease e outras maravilhas exploitation.

Saindo da Europa e singrando mares até nossa vizinha Argentina, é obrigatório o destaque para a maior musa latina do Sexploitation, que recentemente foi destacada em um documentário sobre sua obra fascinante e pouco conhecida por aqui, Isabel Sarli, a mulher, o mito. Enfrentando uma ditadura tão feroz quanto à brasileira, Sarli, ao lado do marido e diretor Armando Bo, protagonizou clássicos como Carne, de 1968, La Tentación Desnuda, 1966, La Mujer de mi Padre, 1967, La Leona, 1964, La Diosa Inpura, 1963, entre outros, chegando a fazer filmes de horror e até trabalhar ao lado do ator brasileiro Jardel Filho. Em seus filmes, Sarli esbanjava sensualidade em cenas extremamente ousadas para a época, com destaque para uma em especial em que ela transa em meio a carnes penduradas de um frigorífico. Isabel Sarli é uma dessas lendas do cinema que merece ser descobertas, mesmo sendo tão difícil de achar seus filmes, mesmo na Argentina.




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