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Dossiê André Klotzel

Brevíssima História das Gentes de Santos
Direção: André Klotzel
Brasil, 1996.

Por Gabriel Carneiro

O curta-metragem Brevíssima História das Gentes de Santos é, muito provavelmente, o melhor filme de André Klotzel até o momento. É quando consegue conjugar perfeitamente o documentário e a ficção, com livre campo de criação. Diferentemente de outros documentários do cineasta, em que a ficção está apenas presente enquanto narrativa, em Brevíssima História das Gentes de Santos é a partir da ficção que surge o documentário.

Realizado sob encomenda do prefeito de Santos da época, David Capistrano, em comemoração dos 450 anos da cidade, com total liberdade criativa, Klotzel construiu uma historieta: o ator santista Ney Latorraca encarna um homem - com direito a boné do Santos Futebol Clube - prestes a ser pai, aguardando a esposa parir. O nascimento é usado como gancho para que o cineasta recupere a história da família, desde a chegada portuguesa à cidade litorânea.

Klotzel e seu parceiro de roteiro José Roberto Torero fizeram uma pequena pérola. Porque o documental no filme só existe enquanto ficção, e o tempo todo há essa discussão para quem o assiste: o que é real e o que não é? Remonta-se episódios da história, aspectos econômicos, sociais, características da cidade, sempre utilizando o formato documental. Mas há sempre a necessidade de criar em cima da realidade. Exemplo disso são as emulações de antigos vídeos amadores, como o de Pero Vaz de Caminha, que filma Paschoal Duarte escravizando índios, em 1546. É óbvio que são filmagens criadas pelo próprio cineasta, que não exclui o fake daquilo utilizando Latorraca como personagem. Assim como um suposto vídeo, daqueles que uma espécie de lição de casa, sobre a tortura durante o Regime Militar. Todos os recursos criados têm um único propósito, tirar a seriedade do que há de documental.

Há vídeos reais de arquivo, bem como uso de mapas e cenários locais, como pede um bom filme do gênero, mas, o curioso é que não há depoimentos reais, não-ficcionais. É nessa tênue linha que caminha o curta. Genial por isso, por criar uma obra afetiva sobre a cidade, sem deixar informar devidamente o espectador – sabemos desde o básico da história de Santos até as estatísticas da época -, e sabendo brincar com o formato. Sem a rigidez, o filme ganha ritmo e interesse.

É curioso perceber como o humor transforma tudo, especialmente nos filmes de André Klotzel. Não se busca o riso fácil, mas o sorriso constante, como se pela forma leve que o tema é tratado pudesse ganhar o espectador pelo encanto. Parece um cinema a se mudar uma pessoa, não através de uma mensagem óbvia e pafletária, empurrada garganta a baixo – nada dessa baboseira que prega um documentário como Uma Verdade Inconveniente -, mas pela simples mudança de humor do ser humano. Quase como o próprio Klotzel fecha seu filme: “E a história de todos estes é a história de Santos. Porque a história de uma cidade é feita por todos; e por cada um.”



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